Uma comissão mais política para avaliar a gestão da Caixa

A comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos toma posse nesta terça-feira. Principais partidos colocam deputados "mais políticos" na linha da frente, mas recusam politização do tema.

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Comissão `de inquérito parlamentar arranca com críticas entre partidos Enric Vives Rubio

A maior parte dos deputados que fazem parte da comissão de inquérito à gestão da Caixa Geral de Depósitos (CGD) são novos nas andanças dos inquéritos parlamentares. Mas não são novos na luta política no Parlamento. Nenhum esconde que, à partida, esta é uma comissão de inquérito nascida sob o signo evidente da política, mas dizem, apesar das trocas de acusações, que não é “politizada”.
A comissão de inquérito à CGD – que vai avaliar a gestão do banco desde 2000 – arancou com o pé esquerdo, no que toca a consensos. Desde que foi anunciada, tornou-se arma de arremesso político entre a esquerda e a direita e os partidos nem chegaram a consenso sobre a sua constituição: foi imposta pelo PSD e pelo CDS. Vai continuar a ser palco do combate político-partidário? A avaliar pelas respostas dos deputados que vão coordenar os representantes de cada bancada, não há grande dúvida de que continuará a sê-lo.

“Uma coisa é ser política, coisa diferente é ser politizada. Espero que não seja politizada, nem partidarizada. Não é esse o nosso objectivo. Não vamos com preconceitos nem com alvos direccionados, daí o horizonte temporal ser mais alargado”, responde o deputado Hugo Soares, o coordenador dos trabalhos do PSD. A verdade é que à esquerda ninguém queria um inquérito parlamentar. O BE não se opunha, mas acabou por se colocar fora do barco quando teve conhecimento dos objectivos dos dois partidos do anterior Governo. E o PSD já joga esse trunfo, antes ainda de as reuniões da comissão começarem: “Aparentemente, não me parece que haja uma vontade [de investigar] dos partidos à esquerda que seja firme, inequívoca e sem tibiezas. A esquerda mostrou-se muito adversa à comissão de inquérito. E ainda não percebi porquê. Julgo que esta será a principal dificuldade”, atira Hugo Soares.

PS e BE não escondem que só lá vão estar obrigados e para evitar que a comissão de inquérito se converta naquilo que, alegam, o PSD e CDS pretendem: “O BE sempre recusou que fosse uma comissão de inquérito à recapitalização. Parece-nos que esse objectivo é claramente um objectivo político, de uma agenda até à privatização da Caixa”, diz ao PÚBLICO o deputado do BE, Moisés Ferreira.

O PS afirma que vai lá estar para evitar danos maiores. “Uma comissão de inquérito a um banco que está em actividade não é favorável, o mais certo é contar que seja prejudicial”, afirma o deputado João Paulo Correia, que, neste xadrez político diz de caras quais os objectivos do PS: “Estranhamos que o PSD proponha um inquérito que recai na sua governação quando teve informação sobre a actividade da CGD e da entidade supervisora. É muito importante esclarecer por que razões o anterior Governo decidiu não agir. Porque a capitalização que foi feita em 2012 não resultou”. Ou seja, apesar de o objecto de inquérito imposto pelo PSD recuar até 2000, os socialistas fecham o foco aos últimos anos, argumentando que, se tudo estava bem quando o banco público foi recapitalizado em 2012 pelo anterior Governo, ou o anterior Governo fez alguma coisa para deteriorar desde então a situação da Caixa ou já não estava tudo bem aquando da recapitalização e esse Governo optou por não agir.

É neste contexto de críticas de parte a parte – cada um com os seus objectivos – que a comissão inicia os trabalhos. O deputado do CDS João Almeida vê, no entanto,  outra justificação para que se olhe para este inquérito com olhos mais políticos do que técnicos: “É sobre um banco em que o accionista é o Estado. A gestão tem sempre a decisão do accionista: como o Estado é accionista, tudo aquilo que tenha a ver com as decisões do accionista, que é político, é também objecto da CPI”, responde.

Esta é, também  por isso, uma comissão diferente das anteriores que foram criadas sobre bancos: não nasceu de um consenso e envolve responsabilidades políticas mais directas. A avaliar pelos jogadores convocados (ou seja, deputados), percebe-se que a preocupação dos principais partidos foi sobretudo ter poder de fogo político nas reuniões.

O PSD escolheu Hugo Sores para coordenar os deputados do partido na comissão. Jurista de profissão, Hugo Soares foi líder da JSD e tornou-se um dos homens próximos quer de Passos Coelho quer do líder parlamentar, Luís Montenegro. Chegou à vice-presidência do grupo parlamentar e é dos deputados sociais-democratas mais activos nas intervenções públicas. Está acompanhado de Costa Neves (jurista), Adão Silva (professor de Português-Francês), Margarida Mano (doutorada em Gestão, professora universitária, Emídio Guerreiro (psicólogo/gestor) e Margarida Balseiro (consultora fiscal).
Semelhante escolha foi a do CDS. Os centristas chamaram de novo João Almeida para liderar a equipa de dois juristas (com Cecília Meireles), tal como aconteceu na comissão de inquérito ao Banif. João Almeida é deputado da Comissão de Orçamento e Finanças (Cofma), uma das mais combativas politicamente. Onde, aliás, estão grande parte dos deputados escolhidos pelo PS.

Os socialistas escolheram deputados que combinam experiência política e conhecimento técnico. O coordenador é um deputado em ascensão desde a chegada de Costa à liderança do partido, João Paulo Correia, que é também coordenador na Cofma. Está acompanhado por João Galamba (economista), porta-voz do partido, Paulo Trigo Pereira (economista e professor catedrático), Carlos Pereira (economista), Sónia Fertuzinhos (relações internacionais económicas e políticas), Susana Amador (jurista) e Santinho Pacheco (professor). O PCP designou o deputado Manuel Tiago seu representante na CPI.

A primeira discussão desta comissão é sobre a marcação das primeiras audições já decididas: as do ministro das finanças, Mário Centeno, e do Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. 

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