Inquéritos no fisco “não estão relacionados” com qualquer lista VIP

Sindicato alega que a lista VIP “passou a existir sob outra forma”. Ministério das Finanças esclarece que processos a funcionários são abertos quando há suspeita de fugas de informação fiscal.

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A Autoridade Tributária e Aduaneira tem como directora-geral Helena Borges Enric Vives-Rubio

O Ministério das Finanças confirma que estão a decorrer processos de averiguação a funcionários da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), mas nega que os inquéritos tenham na origem qualquer lista de contribuintes VIP, como a que há um ano esteve na origem da polémica em torno do sistema de alerta que durante cinco meses permitiu saber quem consultava dados fiscais de quatro políticos.

A garantia foi dada pelo ministério em resposta a questões enviadas pelo PÚBLICO depois de o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI), Paulo Ralha, afirmar que há funcionários a serem chamados ao núcleo de auditoria interna a explicar o porquê de terem acedido aos perfis de alguns contribuintes. Em curso, segundo o STI, estão 29 processos de averiguação ou disciplinares, dos quais 15 foram abertos já este ano.

O ministério liderado por Mário Centeno esclarece, através do gabinete de imprensa, que se trata de averiguações a posteriori, quando há indícios de fuga de informações fiscais. “A AT, sempre que tem conhecimento de que pode ter havido divulgação ilegítima de dados pessoais sujeitos a sigilo fiscal, abre um inquérito para apuramento de eventuais responsabilidades, sendo que esta prática de sempre não está relacionada com qualquer lista previamente elaborada de contribuintes”, assegura.

Sem quantificar, as Finanças confirmam que “há funcionários a serem notificados no âmbito de processos disciplinares em curso” e vinca que “nenhum dos processos disciplinares ou de inquérito instaurados por consultas a dados pessoais/fiscais teve por base qualquer procedimento espoletado pela chamada ‘Lista VIP’”.

O próprio presidente do STI afirma, em declarações ao PÚBLICO, que não existe uma lista VIP como aquela que funcionou entre 29 de Setembro de 2014 e 10 de Março de 2015, em que era disparado um alerta para os serviços de informática sempre que um funcionário consultava os dados de quatro políticos: Pedro Passos Coelho, Paulo Portas, Cavaco Silva e Paulo Núncio, então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Segundo Paulo Ralha, a lista VIP “deixou de existir tal como tinha sido construída, mas passou a existir sob outra forma e foi alargada”, porque, diz, “há uma averiguação a posteriori a quem acedeu à base de dados de personalidades com projecção mediática ligada a negócios, à política, às finanças”.

Depois do polémico caso que, há um ano, levou à demissão de responsáveis de topo da AT e deu origem a um inquérito da Comissão Nacional de Protecção de Dados e a outro da Inspecção-Geral de Finanças, a nova directora-geral da AT, Helena Borges, traçou um plano interno para reforçar a protecção dos dados pessoais e a confidencialidade fiscal dos contribuintes.

Uma das medidas já em curso passou pela implementação de um “mecanismo informático para registo prévio”. Quando um funcionário acede ao cadastro fiscal de um contribuinte, tem de fundamentar a razão pela qual está a consultar essa informação fiscal – indicando, por exemplo, se tem uma ordem de atendimento ao público (ao balcão ou ao telefone), uma ordem no âmbito de algum serviço ou no âmbito de algum despacho, cujo número deve especificar.

Paulo Ralha diz que as averiguações surgem “ao sabor das notícias que aparecem nos órgãos de comunicação social”. “Foi criada uma série de regras internas de acesso à base de dados que, na prática, estão a funcionar como um filtro para os VIP do país”, descreve. Isto porque, diz, nada acontece quando se trata de um perfil de um cidadão comum, mas se um funcionário “fizer o acesso ao cadastro fiscal de um cidadão com projecção do ponto de vista mediático, vai ter de se justificar” junto dos serviços de auditoria.

Segundo o Ministério das Finanças, “nos processos que se encontram findos, até esta data, a pena aplicada foi, em regra, a de repreensão escrita, com suspensão na sua execução pelo período de seis meses”.

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