A ADSE está na moda

Partindo de dados de 2013, o aumento estimado para o SNS por encargos que este teria que suportar se a ADSE não existisse seria superior a 210 milhões de euros.

O subsistema de saúde dos trabalhadores em funções públicas e seus familiares, conhecido como ADSE, é um dos principais assuntos em análise no presente debate eleitoral sempre que se discute a saúde.

 A sua extinção chegou a ser defendida por Vital Moreira, há cerca de dez anos, e por Álvaro Beleza, enquanto secretário-geral adjunto de António Seguro. Já Pedro Pita Barros, por exemplo, afirma que, sobre a ADSE,  “...é simples ter opiniões extremadas...”, e que o leque de alternativas é variado, sendo que a extinção não merece a sua simpatia.

Exporei, de seguida, aqueles que creio serem os três principais mitos sobre a ADSE e, por fim, o que entendo poder vir a ser o seu futuro caminho.

Mitos:

1) O Serviço Nacional de Saúde (SNS) torna dispensável a ADSE, porque é universal, geral e tendencialmente gratuito no acto da prestação.

Como todos sabemos, o SNS não é universal, já que, neste momento e segundo contas que Passos Coelho não contestou no debate com António Costa, haverá mais de um milhão de portugueses sem médico de família, apesar da “importação”. Por isso a ADSE é necessária, tendo a vantagem de desonerar o SNS.

Eugénio Rosa, um economista insuspeito de simpatia pelas teses neoliberais, afirma que “...a ADSE liberta o SNS da prestação de muitos serviços médicos, tornando o SNS mais acessível aos outros portugueses”. Imagine-se o que seria se a ADSE desaparecesse e os cerca de 1,3 milhões de quotizados passassem, de um dia para o outro, a frequentar os serviços do SNS. Por certo se iriam agravar em muito as esperas nas urgências hospitalares que, em situações de pico, já chegaram a ultrapassar as 24 horas.

2) A ADSE é o grande financiador dos hospitais privados

Pedro Pita Barros, num post de Outubro de 2014 no seu blog, afirma que o principal financiador dos Hospitais privados é o “bolso dos cidadãos”, com uma quota de 35%, seguido do SNS com 31%. A totalidade dos subsistemas, dos quais a ADSE é o principal, só contribuirá com 21%.

Já Marina Marques, citando a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, afirma que os subsistemas serão os responsáveis por 30% do financiamento dos hospitais. Assim, mesmo assumindo os 30%, os subsistemas serão, no seu conjunto, apenas o terceiro financiador dos hospitais privados.

3) A ADSE não é sustentável, e só subsiste porque é devedora ao SNS

Já vimos atrás que, sem a ADSE, muito provavelmente seria o SNS a ser insustentável com o actual nível de financiamento.

Com base na premissa da não sustentabilidade, este Governo decidiu aumentar a taxa de contribuição dos quotizados para 3,5% do vencimento. Este aumento não decorreu de necessidades de tesouraria da ADSE, nem de melhores cuidados aos quotizados e não foi precedido de qualquer estudo, conforme afirma o Tribunal de Contas (TC) numa auditoria à ADSE. Apesar do aumento feito sem sustentação técnica, a ADSE deu, em 2014, cerca de 215 milhões de euros de lucro, pelo que o TC concluiu que, em 2015, uma contribuição de 2,25% seria suficiente para garantir a sustentabilidade, criando um excedente de cerca de 10%.

Os quotizados da ADSE pagam impostos como os restantes cidadãos, pelo que têm direito a usufruir de todos os serviços do SNS. Porém, os quotizados pagam, através das suas contribuições, serviços que deveriam ser da responsabilidade do SNS.

Segundo as contas do TC, partindo de dados de 2013, o aumento estimado para o SNS por encargos que este teria que suportar se a ADSE não existisse seria superior a 210 milhões de euros.

Quais devem ser por conseguinte, em meu entender, os caminhos para o futuro:

Em primeiro lugar, a evolução para um serviço de prestação alternativo ao SNS, aberto a todos os cidadãos que se queiram quotizar, bem como a todos os profissionais que se queiram convencionar, e em que haja um encontro de contas directo entre os dois prestadores (ADSE e SNS) em função dos serviços que cada um presta ao outro.

Depois a alteração da forma de governo da ADSE, de modo a permitir que os quotizados, enquanto parte interessada, participem na gestão e, consequentemente, na definição de objectivos estratégicos.

Finalmente, a existência de uma entidade auditora externa e de uma estrutura arbitral médica, tripartida, composta por elementos da ADSE, da Ordem dos Médicos e dos Prestadores Convencionados, para dirimir conflitos técnico-científicos, éticos e deontológicos que possam envolver ADSE, quotizados e  prestadores.

Estomatologista; Membro da Associação de Medicina de Proximidade

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