Poeta oferece 40 cravos negros à Assembleia da República
O poeta-experimental António Barros vai fazer chegar no dia 25 de Abril ao Parlamento o objecto-livro Lástima, num gesto que pretende assinalar criticamente os 40 anos da revolução de Abril
Num jogo de repetições e variações cirúrgicas, uma palavra como “obediente” pode mostrar o seu lado mais “odiento”, ou “é conforme” transformar-se em “com fome”, ou a expressão “tudo como dantes” ser associada a “tudo comediantes”. E em cada um destes críticos cravos negros anda perdido um “p”, isolado das restantes letras, no qual o próprio autor sugere que se pode ler “pátria”, ou “pobre”, ou “Portugal”.
Este ramo de 40 cravos/poemas, de que aqui mostramos sete exemplares, pode ser visto/lido na íntegra no endereço http://po-ex.net/, um arquivo digital da poesia experimental portuguesa. Nascido em 1953, no Funchal, mas há muito radicado em Coimbra, pode dizer-se que António Barros é, com César Figueiredo, Fernando Aguiar ou Silvestre Pestana, um dos autores da segunda geração da poesia experimental portuguesa, que sucedeu à dos pioneiros E. M. Melo e Castro, António Aragão, Salette Tavares ou Ana Hatherly.
Ligado também ao movimento artístico internacional Fluxus, e próximo do situacionismo de Guy Debord, António Barros tem obras no Museu de Serralves e noutras colecções internacionais.
Numa breve biografia do autor redigida para o site PO.EX, o poeta e tradutor Manuel Portela observa que nos objectos-poemas de Barros “encontramos um sentido profundo da dimensão política das relações sociais e uma crítica irónica à reconstituição das estruturas de poder no Portugal pós-revolucionário”. Se se quisesse avançar um exemplo para ilustrar a descrição proposta por Portela, dificilmente se encontraria melhor do que este objecto-livro significativamente intitulado Lástima, que chegará amanhã, por via electrónica, à Assembleia da República.