Mais de 60% de alunos confirmam casos de bullying nas suas escolas

Empresários pela Inclusão ouviram 1963 alunos entre os 12 e os 15 anos. Metade dos alunos que já assistiram a bullying não se lembra de campanhas de prevenção.

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Ao contrário dos rapazes, as raparigas mostraram-se mais sensíveis ao bullying verbal do que ao físico Ricardo Brito
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EPIS quer que alunos deixem de considerar "normais" agressões verbais, empurrões ou roubos de lanche Enric Vives-Rubio

A pergunta era clara e directa: há bullying na tua escola? De uma amostra de 1963 alunos de nove concelhos, e com idades entre os 12 e os 15 anos, 1226, ou seja, 62%, responderam que sim. Porém, apenas metade dos alunos que reconheceram haver bullying na escola declarou recordar-se de campanhas de prevenção.

“Isto mostra que as acções desenvolvidas na grande maioria das escolas contra a violência entre alunos não atingem o alvo, os próprios alunos não identificam essas acções como campanhas antibullying”, adiantou ao PÚBLICO Andreia Ferreira, da Associação EPIS — Empresários pela Inclusão Social, uma instituição sem fins lucrativos de combate ao abandono e insucesso escolar que conduziu este inquérito escolas de nove concelhos (Amadora, Setúbal, Campo Maior, Évora, Paredes, Matosinhos, Estarreja, Oliveira do Bairro e Madalena, na ilha do Pico), entre Setembro e Dezembro de 2013.

Quanto aos 62% de alunos que declararam ter conhecimento de episódios de bullying na escola que frequentam, Andreia Ferreira admite que a percentagem poderia ser maior se todos os alunos soubessem identificar o problema. “Ainda há a tendência para os alunos identificarem como normais situações de violência, coisas como empurrar alguém na escola, roubar a mochila ou o lanche, chamar nomes”, defende, para sublinhar a pertinência do pacote de iniciativas que a EPIS está a desenvolver junto das 69 escolas abrangidas pelo programa, num universo de 3729 alunos. O objectivo destas acções — que visam alunos, mas também pais, professores e directores de escola — é informar sobre sinais de alerta e dar dicas de actuação perante os episódios de violência.

À questão sobre que tipo de bullying é mais frequente, as agressões verbais colheram 61% das respostas, seguidas das físicas (30%). Ao contrário dos rapazes, as raparigas mostraram-se mais sensíveis ao bullying verbal do que ao físico, ainda segundo a EPIS.

20% de vítimas
Quando perguntaram aos 1226 alunos que declararam existir bullying se alguma vez tinham estado envolvidos nalgum episódio daquele género, houve 1256 respostas positivas (alguns participaram em mais do que um episódio), sendo que 77% o fizeram na condição de espectadores e 20% enquanto vítimas.

Em matéria de violência escolar, o PCP promete fazer entrar na Assembleia da República uma iniciativa legislativa que recomenda a criação de gabinetes pedagógicos nas escolas. “Não é uma proposta fechada, as escolas poderiam alterar a composição destes gabinetes, mas a ideia era que fossem compostos por um psicólogo, um assistente social, um animador sociocultural e um representante dos professores e dos alunos”, adiantou ao PÚBLICO a deputada Rita Rato.

A filosofia subjacente a este projecto de lei é fazer incidir os esforços na prevenção, mais do que na punição dos alunos prevaricadores. “A abordagem não é apenas sancionatória, mas de prevenção e erradicação da violência, porque não acreditamos em respostas do tipo expulsar o aluno da escola”, enfatizou Rita Rato, demarcando-se de soluções como as previstas no estatuto do aluno que, desde Setembro de 2012, agravou o regime sancionatório para os alunos prevaricadores.

Garantindo que a iniciativa legislativa vai entrar “dentro de muito poucos dias” no Parlamento, a deputada do PCP avisa que esta implicará o reforço dos meios nas escolas. “Sabemos de realidades em que há apenas um psicólogo por cada 4500 alunos, quando os estudos recomendam pelo menos um psicólogo para 750 alunos. Portanto, o que temos hoje nas escolas é claramente insuficiente, aliás, o que temos actualmente não chega sequer para atender aos alunos com necessidades especiais, pelo que o que propomos obrigará ao reforço da contratação de meios humanos, também porque acreditamos que a violência em meio escolar não se resolve com medidas ‘chapa cinco’, iguais para todos.”

A proposta de lei apresentada pelo anterior Governo que previa a autonomização do crime de bullying e a concomitante adopção de uma moldura penal semelhante à dos crimes de violência doméstica, com penas de prisão de um a cinco anos para os maiores de 16 anos, e que podiam chegar aos dez anos de pena no caso de ofensa grave à integridade física ou morte, caducou com a nova legislatura.

A 31 de Março de 2011, a proposta desceu à Comissão de Assuntos Constitucionais, Liberdades e Garantias para discussão na especialidade, mas não chegou a avançar. Na altura, o agora secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário, João Grancho, presidia à Associação nacional de Professores e chegou a admitir que os instrumentos de prevenção não eram suficientes. Mais recentemente, no início deste ano, ao mesmo tempo que anunciava uma diminuição para menos de metade dos episódios de violência nas escolas, aquele secretário de Estado adiantava a possibilidade de as escolas com maior número de ocorrências daquele género serem dotadas de equipas multidisciplinares de acompanhamento das situações de violência, insucesso e abandono escolar. Uma solução que, ao contrário da proposta do PCP, não passaria obrigatoriamente pelo incremento de psicólogos ou de agentes de segurança nas escolas, mas pela adesão ao chamado “crédito horário”, ou seja, pela atribuição de horas a esses profissionais para as tarefas de prevenção e combate à violência.

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