Mais três co-autores querem retirar de publicação artigos sobre técnica de criação de células estaminais

Instituto japonês já publicou relatório preliminar sobre alegações de má conduta científica. Entretanto, surgiram novos problemas com publicações prévias da autora principal dos artigos.

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Altos responsáveis do centro onde trabalha a autora principal das pesquisas controversas pediram desculpas discovery. AFP/KAZUHIRO NOGI

Três dos co-autores de dois controversos artigos publicados em Janeiro pela revista Nature anunciaram sexta-feira por escrito, numa conferência de imprensa em Tóquio organizada pelo Centro RIKEN de Biologia do Desenvolvimento de Kobe (Japão), que estavam a ponderar retirá-los da publicação, noticiou a revista Science no seu site.

O comunicado – cujos signatários são Haruko Obokata, do RIKEN e primeira autora dos artigos; e dois co-autores japoneses, Hitoshi Niwa e Yoshiki Sasai – surge no mesmo dia que da divulgação de um relatório preliminar sobre a investigação de integridade científica aberto a Obokata pelo RIKEN

Recorde-se que, a 29 de Janeiro, uma equipa de cientistas norte-americanos e japoneses anunciava um espectacular avanço na área das células estaminais: a criação, graças a uma nova técnica, de células muito semelhantes às células estaminais embrionárias (que para serem produzidas exigem a clonagem de um embrião) a partir de células já diferenciadas de ratinhos. As novas células, que permitiam vislumbrar uma forma mais ética e segura de criar tecidos humanos à medida de cada doente, foram designadas por STAP, a sigla em inglês de “aquisição de pluripotência desencadeada por um estímulo”.

A técnica de reprogramação celular consistia em mergulhar as células do sangue dos ratinhos numa solução ligeiramente ácida durante cerca de meia hora para as incitar a regressarem “à infância”.

Rapidamente, porém, instalou-se a dúvida: algumas das imagens publicadas teriam sido manipuladas ou duplicadas e vários especialistas, contactados pela Nature, declararam não estar a conseguir gerar células STAP. O RIKEN, bem como a própria Nature, abriram então inquéritos.

Na segunda-feira passada, Teruhiko Wakayama, da Universidade Yamanashi (Japão) e igualmente co-autor dos dois artigos, já tinha anunciado que pedira aos seus co-autores para ambos os artigos serem retirados da publicação porque já não confiava nos resultados.

Esta sexta-feira, Ryoji Noyori, presidente do RIKEN, pediu “desculpas pelo grande problema e as preocupações causados a tantas pessoas na sociedade pela publicação dos artigos sobre as células STAP”, acrescentando que “se o comité de inquérito concluir que houve má conduta científica, tomaremos estritas medidas disciplinares, tal como estipulado pelo nosso próprio regulamento”. No fim da conferência de imprensa, Noyori e outros altos responsáveis daquela instituição pediram desculpa curvando-se perante a assistência.

No seu comunicado, os três co-autores também pediram desculpas pela confusão gerada e anunciaram que “já estavam a contactar os outros co-autores quanto à hipótese de retractar os artigos”.

Entretanto, o relatório preliminar do RIKEN conclui que “houve manipulação inapropriada dos dados de dois dos itens [imagens] investigados, mas que as circunstâncias [em que essa manipulação aconteceu] não foram consideradas como constituindo má conduta científica”. O documento salienta, contudo, que ainda há quatro itens sob escrutínio e que, para tirar as suas conclusões, o RIKEN está à espera de que "todos os factos sejam cuidadosamente avaliados".

Entretanto, surgiram outros problemas com publicações prévias de Obakata, lê-se ainda no site da revista Science. Nomeadamente, um capítulo inteiro da tese de doutoramento desta cientista parece ter sido copiado de um site dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA (a agência federal que financia a investigação médica); e algumas notas de rodapé de um outro capítulo não têm nada a ver com o texto daquele capítulo. Obokata, num email dirigido ao Wall Street Journal, defende-se argumentando que essa versão da sua tese é apenas um rascunho grosseiro e não o texto definitivo.

Contactada pela Science, a Nature respondeu por email que o seu inquérito ainda está em curso. Porém, especificou que para os artigos serem retractados, não é preciso que todos os co-autores concordem em fazê-lo.

 

 

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