Escritório de Júdice não recorre de condenação no processo da celulose Celtejo

Sociedade de Advogados de José Miguel Júdice perdeu prazo legal no processo em que herdeiros da fábrica pediam indemnização ao Estado.

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Nelson garrido

É o fim de um processo que vai ficar para a história. A sociedade de advogados PLMJ, cujo rosto mais visível é o do antigo bastonário José Miguel Júdice, desistiu de apresentar recurso no Supremo Tribunal de Justiça depois de ter sido condenada a pagar cerca de 113 mil euros à família do fundador da celulose Celtejo, por perder um prazo legal. Um atraso que impediu a apreciação judicial de um caso em que os herdeiros de João Martins reclamavam uma indemnização milionária ao Estado pela nacionalização da fábrica.

A decisão da PLMJ inviabilizou a estratégia do advogado da família do fundador da Celtejo, Nuno Godinho de Matos, que pretendia que todo o caso fosse discutido de novo, depois de o montante da indemnização ter sido reduzido substancialmente pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

“Ao terem desistido do recurso, conformaram-se com a condenação por negligência grosseira”, defende Nuno Godinho de Matos. Abstendo-se de recorrer, a sociedade de advogados que é uma das mais poderosas do país, impediu Godinho Matos de apresentar um recurso subordinado, como tinha anunciado.

“É lúcido fazer isto, em termos de gestão de risco, porque assim o caso não poderá ser rediscutido. Mas significa também que aceitam a condenação”, alega Godinho de Matos. “É verdade que desistimos do recurso. Mas isso aconteceu pura e simplesmente porque percebemos que os autores [da queixa] não tinham recorrido”, rebate uma fonte próxima da PLMJ, que não se quis identificar. “Este assunto está morto e agora a companhia de seguros vai pagar”, acrescenta.

Esta é uma história antiga e muito complicada. Em 2002, os herdeiros do fundador da Celtejo, João Martins, contrataram a PLMJ para a preparação de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo num processo que envolvia a nacionalização da fábrica, em Vila Velha de Ródão, que foi integrada na Portucel. No último dia do prazo, a 17 de Junho de 2002, o recurso foi enviado por fax para o tribunal às 23h58, mas apenas 50 dessas páginas foram recebidas dentro do prazo legal. Resultado? O tribunal entendeu que recebeu o apelo  após as 24h, portanto fora do prazo, apesar de a sociedade de advogados ter alegado que o atraso se ficou a dever a uma avaria técnica.

Na primeira instância, a PLMJ foi condenada a pagar uma indemnização histórica de 2,4 milhões de euros à família Martins, mas recorreu e o Tribunal da Relação decidiu reduzir o valor da indemnização para 112.743 euros, 45 mil dos quais por danos morais.

A sociedade de advogados contestou mesmo assim esta condenação e chegou a anunciar que ia recorrer dela, por pretender a absolvição. Godinho de Matos anunciou então que ia apresentar um recurso subordinado ao da PLMJ para tentar que todo o caso fosse de novo apreciado e voltasse a ser discutida a questão da "perda de chance". O advogado dos herdeiros da fábrica de celulose explica que esta é a designação técnica francesa para denominar prejuízo causado quando se perde a possibilidade de debater um caso em tribunal.

Os queixosos dizem que só à sociedade de advogados de José Miguel Júdice pagaram mais de 390 mil euros em honorários e em pareceres. E argumentam que a perda do prazo judicial os impediu de reclamar junto do Estado português uma indemnização de 10 milhões, o montante pedido na acção inicial. Os desembargadores da Relação deram como provado que houve negligência por parte do advogado que tratou do processo, mas decidiram que a família Martins deveria receber apenas o que gastou com honorários dos advogados.

A Celtejo foi nacionalizada, após a revolução do 25 de Abril de 1974. A viver no Brasil, a família Martins não desistiu de lutar pela sua posse e interpôs uma acção judicial onde reclamava do Estado português uma indemnização de 10 milhões de euros.

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