Vem aí um telescópio transcontinental que Portugal pode ajudar a pôr de pé

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As antenas e discos do telescópio SKA vão espalhar-se por milhares de quilómetros AFP

O Square Kilometre Array será um dos instrumentos científicos mais importantes do mundo. Esta sexta-feira decorre um workshop em Lisboa para pôr Portugal no mapa da construção de um projecto que quer transformar África.

Quando estiver terminado, o Square Kilometre Array (SKA) vai estar espalhado pela Austrália, Nova Zelândia, África do Sul e outros países africanos como Moçambique e talvez Angola. O consórcio internacional responsável por este projecto prevê que se gaste na construção 1500 milhões de euros até 2024. O SKA vai pôr milhares de antenas a perscrutar o universo para responder a questões fulcrais de física. O projecto quer ainda levar energia eléctrica e Internet a milhões de pessoas em África. Esta sexta-feira, em Lisboa, há um workshop sobre o SKA com grupos científicos e empresas portuguesas que já estão nesta aventura. Um dos objectivos é atrair o Governo português a entrar no consórcio.

“Portugal tem um ano para decidir se quer estar no SKA como um dos membros da organização”, diz Domingos Barbosa ao PÚBLICO, líder do grupo de radioastronomia do Instituto de Telecomunicações, que está ligado à Universidade de Aveiro. O cientista tem sido um organizador não oficial da estratégia portuguesa do SKA, fazendo a ponte entre as comunidades científicas, tecnológicas e industriais portuguesas e o projecto do radiotelescópio.

“Um dos objectivos é mostrar o que é o SKA aos decisores da política científica portuguesa e as oportunidades que surgem à ciência e à tecnologia de ponta”, explica Domingos Barbosa. Uma das palestras será dada por Miguel Seabra, presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Phil Diamond, director-geral da organização do SKA, e Daan du Toit, representante do Governo da África do Sul na União Europeia, também falarão do projecto.

O SKA começou a ser concebido em 1991 e tem como membros a África do Sul, Austrália, Canadá, China, Holanda, Itália, Nova zelândia, Reino Unido e Suécia. Em Maio passado, foi finalmente decidido onde será instalado o grande radiotelescópio, depois de um atraso de três anos. A África do Sul e a Austrália foram os dois países escolhidos para a sua instalação, e onde vai ficar a grande maioria dos instrumentos.

A ideia é instalar milhares de antenas e de discos, distribuídos ao longo de 3000 quilómetros de diâmetro, que vão captar ondas de rádio numa vasta gama de frequências. Com isso, espera-se mapear mil milhões de galáxias para tentar saber mais sobre, por exemplo, a energia escura, que estará a acelerar cada vez mais a expansão do universo. O telescópio vai ainda procurar vestígios de moléculas orgânicas, que poderão indiciar vida noutros planetas.

Para a localização da infra-estrutura tinha de se escolher uma região remota, para que a captação de ondas rádio vindas do espaço tivesse o mínimo de interferências. Mas isso exigirá um esforço brutal. Não só para construir estradas e transportar materiais mas também para providenciar energia eléctrica e Internet. Em África, as estruturas do projecto vão estender-se até países como Moçambique (que receberá 40 antenas), Quénia ou o Gana.

A ligação entre Portugal e África

Na África do Sul já estão a ser formados técnicos. Mas além da educação científica, Domingos Barbosa diz que o consórcio quer aproveitar a instalação de novas linhas eléctricas e da Internet para também fazer chegar estes bens a 1500 milhões de pessoas que vivem isoladas. “Pode aliviar a pobreza e a falta de energia eléctrica”, defende o cientista, acrescentando que este aspecto de desenvolvimento social também pode ter interesse para o Governo português. “Portugal tem excelentes ligações com África. Tem valências científicas e industriais nas áreas da energia, tecnologia de informação e do espaço”, refere ainda. Pode, por isso, dar formação nestes países e ser uma porta de entrada de África na Europa.

“A FCT está numa fase de avaliação do SKA com base em critérios científicos e estratégicos”, diz Ana Godinho, do gabinete de comunicação da FCT. “No início de 2013 serão tomadas algumas decisões.”

A Nokia Siemens Networks, a Martifer Solar e a Critical Software são três empresas em Portugal já ligadas ao SKA nas áreas da Internet, energia e espaço. Mas, segundo Domingos Barbosa, se Portugal se tornar membro do consórcio do SKA, poderá definir o seu papel no projecto desde o início e ter um retorno científico e empresarial muito maior.
 
Notícia corrigida às 17h50 de 3 de Dezembro de 2012: É a "energia escura" que será a responsável pela expansão do Universo e não a "matéria escura", como anteriormente estava escrito no texto.

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