Seis milhões de euros para transformar desperdícios dos lagares em combustível

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Pedro Centeno, responsável do projecto, escolheu uma zona com boas ligações rodoviárias Foto: Fernando Veludo/ NFactos

Afinal, os romanos não estavam assim tão loucos, ao utilizarem o azeite como combustível. Dois mil anos depois, há uma empresa que está apostada em aproveitar tudo o que a azeitona tem para dar, para além do azeite.

Afinal, os romanos não estavam assim tão loucos, ao utilizarem o azeite como combustível. Dois mil anos depois, há uma empresa que está apostada em aproveitar tudo o que a azeitona tem para dar, para além do azeite. Chama-se Tira-Chuva a empresa que está a acabar de construir uma fábrica que vai transformar os sobrantes dos lagares de azeite (bagaços da azeitona) em combustível para centrais termo-eléctricas internacionais. É em Variz, no concelho de Mogadouro.

"A localização, perto de Espanha, com vias rodoviárias importantes para o nosso objectivo, foi fundamental para o projecto", frisa Pedro Centeno, o responsável pela ideia. Com o IC5 e o IP2 em fase de conclusão, a Tira-Chuva vai poder instalar-se no centro de uma das mais dinâmicas regiões olivícolas do país e bem perto dos canais de exportação - o Porto de Leixões fica a cerca de duas horas e Madrid a umas três.

"Houve algumas tentativas anteriores que não foram realizadas na região, mas acabou por se conseguir realizar o projecto. Esta é a situação mais eficaz", frisa o responsável, que conseguiu avançar com uma candidatura ao Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) para comparticipar o projecto em 75%.

Experiência contou

A ideia desta nova fábrica foi de Pedro Centeno, que já trabalha na área há vários anos, com a Deflen, uma empresa dedicada à transformação de sobrantes de floresta. Por isso, aos seis milhões de euros previstos para a unidade de transformação dos bagaços de azeitona está associado um outro investimento que pode chegar aos 4,5 milhões de euros.

Trata-se de uma unidade de co-produção de energia, com recurso à biomassa, ou seja, aos desperdícios florestais. "Essa vertente do projecto teve um grande peso na decisão de nos instalarmos nesta região", assume. A central vai consumir as biomassas, ou seja, os sobrantes florestais que decorrem das limpezas das matas. "É uma biomassa com menor valor do ponto de vista económico e a operação teria uma rentabilidade menor se queimássemos os outros combustíveis", explicou ao PÚBLICO.

Para já, é a unidade de transformação dos bagaços de azeitona que vai entrar em produção já no segundo trimestre deste ano. Estima-se que possa vir a produzir 50 mil toneladas de combustível por ano e vai dar emprego a 16 pessoas (mais oito na unidade de co-produção). Um factor "estruturante para a região", segundo disse António Pimentel, vice-presidente da autarquia mogadourense, defendendo mesmo que um projecto destes deveria ter "comparticipação a 100% do QREN, porque vem resolver um problema ambiental".

É que aquilo que vai servir de matéria-prima a esta fábrica é uma grande dor de cabeça para os lagares, pois as chamadas águas-russas, que resultam do processo de fabricação do azeite, acabam "por contaminar os solos".

"O subproduto que vem dos lagares tem 75% de água e alguma gordura. É preciso fazer logo a desidratação e extracção dessa gordura, para que a biomassa sirva para o que se pretende. Na nova fábrica, a água-russa é tratada e acaba por se tornar num subproduto útil do ponto de vista comercial. É uma pasta que pode ter outros efeitos a nível de rações de animais, por exemplo", explica Pedro Centeno. "A água é evaporada de forma rápida. A parte sólida, depois de secada, fica disponível para ser colocada em paletes e enviada para os clientes."

Para isso, é preciso matéria-prima, algo que não falta na região transmontana. "A região tem quantidade suficiente para nos abastecermos e às outras empresas semelhantes que existem no país. E os lagares deixam de ter pretextos para cometerem crimes ambientais que sabemos que às vezes acontecem", adianta o mesmo responsável. Simultaneamente, os lagares vão poder ter ainda uma compensação por um produto que só dava dores de cabeça.

"Obviamente, estamos a falar de algo que não pode nunca ser a essência da facturação dos lagares. Há aqui uma tentativa de dar um valor aos subprodutos, o que também representa custos. Mas vamos trabalhar ao nível dos preços de mercado", garante.

O projecto estima chegar aos cinco milhões de euros anuais de facturação após os primeiros três anos de laboração.

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