Santander imputou perdas de 200 milhões ao Fundo de Pensões dos trabalhadores

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O banco reconhece que o fundo teve rentabilidade negativa no primeiro semestre Rita Baleia

O prejuízo está relacionado com investimentos de risco (contratos de futuros) que apostavam na valorização dos índices dos mercados nova-iorquinos, o que não aconteceu.

O banco Santander Totta imputou um prejuízo de cerca de 200 milhões de euros ao Fundo de Pensões dos trabalhadores, de forma a não ter que o assumir nas contas do grupo. A perda, que está a gerar polémica interna, tem a ver com contratos de futuros celebrados ao longo do mês de Julho pela sociedade gestora de fundos do grupo espanhol.

Ao longo do mês de Julho, a sociedade gestora de activos do grupo espanhol - Santander Asset Management - assumiu um conjunto de investimentos de risco através de contratos de futuro (compromisso de compra/venda a executar em datas e preços pré-fixados) sobre os índices dos mercados nova-iorquinos. Estas operações complexas (de muito curto prazo), sustentadas em produtos derivados, tinham como pressuposto uma subida dos valores dos índices no momento do resgate, o que não se verificou.

De acordo com os dados produzidos internamente, e a que o PÚBLICO teve acesso, depois da execução dos contratos, no final de Julho, o banco apurou um prejuízo da ordem dos 200 milhões de euros, mas parqueou-o no fundo de pensões dos trabalhadores - movimento registado nas contas de Agosto, que ainda não são públicas. O FP era tutelado pelo presidente da gestora de activos do grupo, João Bouça Morais, que saiu entretanto do Santander, conforme prova a documentação interna.

Instado pelo PÚBLICO a comentar a situação, o Santander optou por não responder directamente à questão: "A gestão do FP é totalmente autónoma e independente da gestão do Santander Asset Management Portugal (até por imperativos legais) pelo que, como é óbvio, todas as operações que são iniciadas pelo Fundo de Pensões são alocadas ao mesmo, tal como o inverso. Neste domínio, não existe, nem pode existir, qualquer alocação de activos entre os vários instrumentos sob gestão".

O Santander reconhece que o FP "teve uma rentabilidade negativa" no último trimestre, situação que classifica de normal "face ao actual enquadramento". E nota que é "necessário aguardar pelo desfecho final do ano" para apurar a rendibilidade final "e situação patrimonial".

Num quadro de crise alargada da divida soberana, que se tem reflectido nos últimos dois anos em instabilidade financeira e volatilidade dos mercados, o Santander não previu a queda das cotações, o que tem gerado polémica e preocupação entre os colaboradores da filial portuguesa do grupo liderado pela família Botin.

O banco não respondeu quando questionado sobre o momento em que a administração foi informada do que se estava a passar e, em particular, o presidente, Nuno Amado.

Há uma semana, o Expresso levantou a ponta do véu sobre o que se estava a passar no Santander Asset Management (SAM), ao revelar que o banco se preparava para registar este ano um "rombo" de 26 milhões de euros (verba que soma aos 200 milhões), resultante de operações derivadas associadas, neste caso, ao fundo de investimento mobiliário Santander Acções Global.

De acordo com o semanário, neste caso, a gestão liderada por Nuno Amado atribuiu o problema a "um erro de imputação" que "não terá impacto negativo nos clientes". Pelo facto de o Santander Acções Global ser um fundo de mercado, as perdas teriam de ser cobertas imediatamente, o que já não acontece com os fundos de pensões dos trabalhadores. Por força das regras existentes, o banco não será obrigado a cobrir imediatamente os 200 milhões de euros, razão pela qual as más decisões de investimento não serão imediatamente repercutidas nos resultados.

Nuno Amado tem discutido com o ministro Vítor Gaspar a transferência do fundo de pensões para o sistema público de segurança social. As responsabilidades do FP no final do primeiro semestre ascendiam a 1,316 mil milhões de euros.

O PÚBLICO sabe que no final de Julho a administração ordenou a suspensão e liquidação dos contratos de futuros associados ao FP e ao SAG. E, a 18 de Agosto, João Bouça de Morais, presidente do SAM, e Ricardo Lourenço, responsável pela área de investimento, deixaram o banco.

Já o afastamento de Luís Cameiro, que tinha responsabilidades de auditoria, tem gerado controvérsia, dado que este alertou as chefias, em vários momentos, por email, nomeadamente para a violação dos rácios de investimento. O administrador com o pelouro da gestão de activos, Miguel Bragança, mantém-se em funções. Nos últimos dias chegaram ao banco duas equipas de auditoria enviadas por Madrid - uma para a inspecção anual e a outra centrada nas operações polémicas para apurar prejuízos e responsabilidades.

A Comissão de Trabalhadores afirmou não ter "conhecimento sobre uma perda tão avultada no Fundo de Pensões", mas reconheceu existirem "rumores" que a levaram já a solicitar "esclarecimentos" à administração, que a informou de que as oscilações registadas no fundo eram normais. A CT lembra que "a legislação actual lhe retirou o direito de integrar a Comissão de Acompanhamento dos Fundos de Pensões dos Trabalhadores" e que a fiscalização está agora a cargo dos sindicatos."

Entretanto, os colaboradores da área de investimentos mobiliários foram já informados de que a gestão do sector passará a ser feita directamente por Espanha.

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