Futura Galeria da Biodiversidade recebeu visita inesperada da trineta de Darwin

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A equipa responsável do projecto procura inspiração e ideias em outros espaços europeus Foto: Joana Bourgard

Pode ser um bom presságio para a Casa Andresen que, a partir de 2012, será a Galeria da Biodiversidade. O palacete cor de vinho e bosquetes à entrada no Jardim Botânico do Porto recebeu a visita inesperada da trineta da Charles Darwin, em férias na cidade.

A primeira fase da Galeria da Biodiversidade já está terminada. Depois de seis meses de restauro, o espaço acolhe de Fevereiro a Julho a exposição “A Evolução de Darwin”, projecto que aproveita para testar a casa enquanto espaço aberto ao público.

Camilla Whitworth-Jones é uma das visitantes que percorre as salas de paredes brancas e chão de madeira com a vida e obra do naturalista, ouvindo a explicação de um funcionário do museu. A inglesa de 69 anos tem um interesse especial no que está a ver e é com um sorriso aberto que confirma ser uma das trinetas de Charles Darwin. “Estou de férias no Porto e, assim que cheguei vi, por acaso, cartazes no aeroporto a anunciar a exposição. Tinha de cá vir”, explicou ao PÚBLICO no restaurante do palacete, com vista para o Jardim do Roseiral.

Camilla, antiga conselheira de arte, explicou que o seu trisavô sempre “foi uma presença forte na família, sem dúvida,” mas não influenciou a sua carreira. “Quando somos crianças não ligamos tanto às coisas importantes que temos pela frente”, justifica. Tanto mais que, acrescenta, “nos anos 40 e 50 Darwin não era tão famoso como é hoje”.

A descendente do naturalista, que quis tornar a sua visita à Casa Andresen o mais discreta possível e que pediu para não ser fotografada, contou que gostou tanto do que viu no Porto que decidiu doar um livro à exposição. “Achei-a fantástica, especialmente o facto de mostrar as coisas antes de Darwin e como continuaram depois da sua morte.”

Na Casa Andresen todos foram apanhados de surpresa com a visita. “Não fazia ideia que estava cá a trineta de Darwin”, admite surpreendido Nuno Ferrand Almeida, comissário da exposição, enquanto mostra as instalações da Rua do Campo Alegre que vão acolher a Galeria da Biodiversidade.

“O que vamos fazer será diferente do tradicional museu de História Natural, com um esqueleto de dinossauro ou baleia suspenso à entrada”, explica. Na verdade, depois de um período de decadência nos anos 50, estes museus começaram a renovar-se nos anos 80, adoptando novas fórmulas para passar a mensagem.

A Galeria “combinará elementos de uma forma inovadora”, pretendendo “relacionar a biodiversidade com todas as áreas do conhecimento”, desde a saúde, às artes, passando pela alimentação, genética, economia, consumo e crescimento populacional. “Queremos reconstruir as histórias destas relações, através da genética e da investigação com base nas colecções”, nomeadamente parte do espólio do Museu de História Natural da Universidade do Porto, acrescenta.

A inspiração que veio de Sophia

Os novos “contos” da Casa Andresen passarão pelo mistério em redor de um corno datado do século XIX que se acredita ser de palanca-negra-gigante e pela história do Rinoceronte de Albrecht Durer, desenho de 1515 que marcou a iconografia artística e científica. A extinção dos dinossauros e as extinções dos nossos dias e a importância de Lisboa nos séculos XVI e XVII no descobrimento e exibição pública de novas espécies não serão esquecidos.

A equipa responsável do projecto procura inspiração e ideias em outros espaços europeus. “Queremos chegar às pessoas, através de módulos interactivos, exposições permanentes e temporárias, ateliers, workshops e várias iniciativas”, conta Nuno Ferrand Almeida. Entre elas estará o Observatório da Biodiversidade, onde as pessoas poderão participar na construção de uma base de dados sobre as espécies do país e estrangeiro.

Mas, na génese, a inspiração veio de Sophia de Mello Breyner Andresen que, no conto Saga, fala do seu desejo de ver montado no átrio da casa o “esqueleto da baleia que há anos repousava, empacotado em numerosos volumes, nas caves da Faculdade de Ciências, por não haver lugar onde coubesse armado”. A partir de 2008, a casa ficou vazia, quando o Departamento de Botânica saiu daquele edifício para as novas instalações da Faculdade de Ciências. “Tudo aconteceu devido a uma série de coincidências”, resumiu Nuno Ferrand Almeida.

O projecto da Universidade do Porto, que conta com o apoio da câmara municipal e da Agência Nacional para a Cultura Científica e Tecnológica - Ciência Viva, prevê ainda a criação de um banco de tecidos e de DNA de todas as espécies que ocorrem em Portugal.

Os conteúdos da Galeria serão elaborados pela Universidade do Porto. “Vamos começar a preparar a candidatura para conceber o projecto e descrever todos os conteúdos”.

Mas há mais por fazer. Um passeio pelos jardins mostra duas estufas do final dos anos 50 do século passado já em fase final de restauro e, mais à frente, outras estufas ainda de vidros partidos, à espera de recuperação. “Vamos ter de fazer obras no piso térreo do edifício, onde serão instalados os laboratórios e os locais de armazenamento das colecções. Além disso, falta rebocar as fachadas do edifício e adaptar uma casa que albergará o e-learning café”.

O palacete esteve na família Andresen desde 1895 e foi cedido à Universidade do Porto em 1951, para ali instalar o Jardim Botânico de quatro hectares. A partir de 2012, o edifício voltará a ter uma vida nova.

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