Finanças públicas sob suspeita agravam juros da dívida do Estado

Foi mais um dia de emoções fortes no mercado da dívida pública e de notícias muito negativas para os países do Sul da Europa, incluindo Portugal. Na segunda-feira, a Standard & Poor"s já tinha anunciado a decisão de colocar as classificações de risco atribuídas às dívidas portuguesa e grega com uma tendência negativa. É desta forma que as agências de notação financeira fazem um pré-aviso de uma quase inevitável descida de rating futura. Na terça-feira, outra agência, a Fitch, baixou mesmo a classificação grega e ontem, de novo a Standard & Poor"s colocou também a Espanha sob tendência negativa.

Os avisos das agências são a consequência da deterioração das finanças públicas a que se tem assistido em toda a Europa por causa da crise, com especial incidência nestes países.

Os mercados obrigacionistas, onde os Estados garantem o seu financiamento, reagiram muito negativamente a estes desenvolvimentos. A diferença entre as taxas de juro das obrigações do tesouro gregas, espanholas e portuguesas subiu fortemente face aos títulos mais seguros da Europa, os alemães.

No caso português, a subida foi, até ao final da tarde de ontem, de cerca de 11 pontos base, mais do que os sete pontos da Espanha, mas bastante menos que os cerca de 30 pontos da Grécia. Portugal regista algo que já não acontecia há meses, uma taxa de juro nas suas obrigações a 10 anos superior à italiana, o que revela a desconfiança crescente dos investidores em relação ao risco que assumem quando emprestam dinheiro ao Estado português.

Esta subida das taxas de mercado significa que, neste momento, qualquer emissão de dívida realizada nos mercados internacionais pelo Estado português pode ter de ser realizada a um custo mais elevado. Para se ter uma ideia do tipo de despesa adicional, se assumirmos que o Estado, numa estimativa conservadora, vai em 2010 realizar emissões de obrigações no valor de 15.000 milhões de euros, e que a taxa de juro praticada vai sofrer este acréscimo de 10 pontos base, isso significa um pagamento anual de juro adicional de 15 milhões de euros, que se irá repetir pelo prazo das obrigações emitidas.

O custo de financiamento não sobe apenas para o Estado. Os ratings atribuídos aos bancos e às empresas nacionais e as taxas exigidas pelos mercados são fortemente influenciadas pelo que se passa com o Estado. Assim, é possível que bancos e empresas passem a pagar mais em juros para se financiarem, repercutindo esse custo para particulares e outras empresas.

No Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público (IGCP), a entidade responsável pela gestão da dívida pública portuguesa, mantém-se a confiança em relação à capacidade de o Estado português se financiar nos mercados sem dificuldades. O presidente, Alberto Soares, assinala que "estamos a assistir ao aumento generalizado dos spreads face à Alemanha, com particular incidência nos países periféricos" e garante que "Portugal não se encontra entre os países mais penalizados". Este responsável defende que "até ao momento não existe qualquer indicação que faça antever maiores dificuldades de financiamento". É de assinalar que os actuais níveis de taxas de juro ainda são, apesar das subidas dos últimos dias, bastante mais baixos do que os registados no auge da crise financeira internacional.

Do lado das agências de rating, cujas descidas na avaliação do risco estão a ter um papel decisivo no actual ambiente do mercado, o que se pede é que os governos controlem o défice. Em declarações ao PÚBLICO, Kai Stukenbrock, o responsável da Standard & Poor"s pelo rating português, diz que, para que a tendência negativa agora anunciada não se transforme numa efectiva descida do rating, é preciso que "o Governo não só consiga parar a subida do rácio da dívida, mas também apresentar perspectivas de vir conseguir a reduzi-lo".

Bolsas tremem

A turbulência no mercado de dívida está já a assustar os investidores, que começam a admitir a possibilidade de incumprimento por parte de vários Estados. Este receio gerou ontem uma violenta queda das bolsas do Sul da Europa - Portugal, Espanha e Grécia - e espalhou-se pelos mercados internacionais. Os sectores da banca e seguros foram os mais penalizados pela pressão vendedora dos investidores.

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