Juiz da Operação Fénix acusa DCIAP de "flagrante colisão" com princípio de boa-fé

Procurador que acompanhou julgamento concordou com absolvição de Pinto da Costa e Antero Henrique. Colegas que dirigiram investigação discordam e recorreram.

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Pinto da Costa à saída do julgamento LUSA/JOSÉ COELHO

O juiz que presidiu ao julgamento da Operação Fénix acusou os procuradores do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) que recorreram do acórdão de "flagrante colisão com os princípios da lealdade, boa-fé processual, confiança e colaboração".

Em causa está a absolvição dos arguidos acusados de terem recorrido a segurança ilegal, entre eles o presidente do FC Porto, Pinto da Costa, e o ex-vice-presidente do clube, Antero Henrique, que estavam pronunciados, respectivamente por sete e seis crimes de exercício ilícito da actividade de segurança privada. O procurador do Ministério Público (MP) que acompanhou o processo em julgamento defendeu a sua absolvição, mas os seus colegas do Departamento Central de Investigação e Acção Penal que investigaram o caso ainda na fase de inquérito discordam da absolvição e apresentaram recurso da decisão judicial.

O juiz do Tribunal de Guimarães, que proferiu a decisão em Novembro de 2017, recusou o recurso e os procuradores do DCIAP decidiram apresentar reclamação no Tribunal da Relação de Guimarães.

Perante esta posição, o juiz critica os magistrados do DCIAP, considerando que o MP "não tem interesse em agir", uma vez que a absolvição daqueles crimes foi defendida pelo próprio MP. No despacho ao qual a Lusa teve acesso esta quarta-feira, dirigido ao Tribunal da Relação de Guimarães, o juiz Miguel Vieira Teixeira acrescenta mesmo que é "evidente" a falta de interesse em agir do MP.

"Divergência de opinião"

No mesmo documento, em que envia os autos para a Relação, o juiz Miguel Vieira Teixeira diz parecer evidente que o MP "confunde interesse em agir com divergência de opinião" entre o magistrado do MP que participou no julgamento e os magistrados do DCIAP que subscreveram o requerimento de interposição de recurso.

"O MP procura agora impugnar uma decisão em relação à qual havia manifestado concordância. Daí que, por um lado, se nos afigure ser evidente a falta de interesse em agir e, por outro, flagrante a colisão com os princípios da lealdade, boa-fé processual, confiança e colaboração", lê-se no despacho, em que o juiz se opõe à reclamação apresentada pelos procuradores do DCIAP.

Com 54 arguidos, a Operação Fénix está relacionada com a utilização de seguranças privados em situação ilegal, tendo como epicentro a empresa SPDE, também arguida no processo. Segundo o despacho de pronúncia, os operacionais da SPDE fariam serviços de segurança pessoal, sem que a empresa dispusesse do alvará necessário para o efeito.

Em causa está o facto de terem, alegadamente, contratado ou beneficiado de segurança pessoal por parte da SPDE, quando saberiam que esta empresa não poderia prestar aquele tipo de serviço. O tribunal também deixou cair o crime de associação criminosa.

Para o advogado Nuno Cerejeira Namora, que defende um dos arguidos, a posição do juiz Miguel Vieira Teixeira pugna pela "coerência, isenção e coragem" e "vem explicar que não há dois Ministérios Públicos".

"O procurador de Guimarães acompanhou toda a produção da prova e, constatando que os arguidos eram inocentes, pediu consequentemente a sua absolvição. O MP de Lisboa [DCIAP), que conduziu uma fraca investigação e deduziu a paupérrima acusação, continua a teimar numa condenação sumária, pública e injusta", criticou o advogado.

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