Direitos humanos em Angola são "um descalabro", disse Luaty Beirão em Bruxelas

"Continua haver perseguições, detenções arbitrárias, execuções sumárias, pessoas desaparecidas ou que levam pancada por quererem exprimir uma opinião”, disse o activista no Parlamento Europeu.

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“A corrupção é o maior de todos os males existentes em Angola", disse Luaty Beirão Rui Gaudêncio/PÚBLICO/Arquivo

O activista luso-angolano Luaty Beirão alertou esta quinta-feira no Parlamento Europeu para a situação dos direitos humanos em Angola que classificou como “um descalabro”. Mostrou-se também totalmente descrente sobre as eleições gerais previstas para este ano, alertando ainda que a tensão vai crescer no país até esse momento.

Beirão esteve em Bruxelas para participar numa reunião da sub-comissão dos Direitos Humanos do Parlamento Europeu e depois numa audição pública sobre a situação dos direitos humanos em Angola, promovida pelas eurodeputadas Ana Gomes (PS) e Marisa Matias (BE).

O músico e activista esteve detido entre 2015 e 2016 por alegada conspiração para derrubar o regime - o jovem encontrava-se com outros activistas para debaterem leituras; todos foram presos (são conhecidos como os 15 + 2, 15 que estiveram em prisão preventiva antes da condenação mais duas activistas que aguardaram em liberdade) e entretanto libertados ao abrigo de uma amnistia que não aceitam. Luaty esteve 33 dias em greve de fome na prisão, o que o tornou o rosto deste combate e provocou muitas críticas a Luanda e manifestações em Lisboa e noutras capitais europeias.

"Em Angola continua haver perseguições, detenções arbitrárias, execuções sumárias, intolerância política, pessoas desaparecidas ou que levam pancada porque têm uma opinião e querem exprimi-la”, disse ao PÚBLICO. “Continua haver um problema gritante em relação aos direitos humanos.”

Beirão considerou ainda que “a corrupção é o maior de todos os males existentes em Angola”. Denunciou as perseguições de que são alvo os que ousam falar do assunto. “Tudo o resto deriva deste problema”, sublinhou, em alusão à corrupção.

Em relação ao que Portugal pode fazer para que a situação em no país governado por José Eduardo dos Santos evolua, o activista pediu que “não aceite dinheiro de Angola. Se começar por aí, já muita coisa vai mudar”. E reclamou imparcialidade à justiça portuguesa nos casos que envolvam Angola.

Apesar das eleições gerais previstas para este ano, Luaty Beirão mostrou-se céptico. “Não tenho grandes expectativas. Nós não temos eleições, temos uma fachada que se legitima mais uma vez aos olhos da comunidade internacional”.

Por seu turno, Ana Gomes sublinhou que as próximas eleições só terão credibilidade com a presença de observadores internacionais, entre os quais da União Europeia. “O Governo angolano não fez o que devia fazer, que é um convite com garantias pelo respeito dessa observação internacional“, disse a eurodeputada socialista.

Nos encontros da sub-comissão dos Direitos Humanos ou na audição pública, em que participaram poucos deputados e assistência, Beirão traçou um quadro negro da situação no país governo por José Eduardo dos Santos, sem se esquivar a nenhum tema ou pergunta. Direitos humanos, detenções arbitrárias, violência das autoridades, corrupção, eleições, pobreza, MPLA, a situação nos hospitais, para citar apenas alguns.

O activista recebeu o apoio de deputados de várias famílias políticas representadas no Parlemento Europeu (PE). Na audição, marcaram ainda presença José Inácio Faria, do MPT-Partido da Terra, e o alemão Helmut Scholz, do partido Die Linke (esquerda radical alemã). O eurodeputado do Partido da Terra elogiou Beirão e garantiu que o combate do luso-angolano “é reconhecido no PE. Nós somos seus parceiros”.

Ana Gomes afirmou que vai continuar a dar voz no PE aos que se batem pela democracia, liberdade e direitos humanos em Angola, ressalvando que esse deve ser primeiro um combate dos angolanos. No mesmo sentido, Marisa Matias garantiu que vai continuar a acompanhar a situação em Angola. “Não é uma ingerência, é uma questão de direitos humanos”. Beirão também manifestou a expectativa de que os deputados continuem a manter a situação dos direitos humanos na agenda.

O luso-angolano disse também temer pela sua segurança e ironizou sobre a possibilidade de haver um próximo editorial do Jornal de Angola contra o evento no PE.

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