Autoridades venezuelanas excluem referendo contra Maduro em 2016

Depois de 10 de Janeiro, não será possível realizar novas eleições presidenciais. Oposição terá de recolher quase quatro milhões de assinaturas em três dias para conseguir consulta.

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Quarta-feira, os motoristas dos autocarros paralisaram durante oito horas o centro de Caracas em protesto contra a crise económica no país Juan Barreto/AFP

As autoridades venezuelanas desferiram um novo golpe sobre a cruzada da oposição para destituir o Presidente Nicolás Maduro, ao anunciar que o referendo à sua permanência no poder “não poderá realizar-se antes de meados do primeiro trimestre de 2017”, o que, mesmo em caso de vitória, anularia a possibilidade de realizar eleições antecipadas.

“Não temos qualquer dúvida. Milhões de venezuelanos vão mobilizar-se e infligir uma derrota eleitoral, mas também política e moral, sem apelo”, reagiu Jesus Torrealba, porta-voz da Mesa de Unidade Democrática (MUD), logo depois de a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) ter anunciado a sua decisão.

Há meses que a coligação que agrupa os partidos da oposição ao chavismo, há 17 anos no poder na Venezuela, percorre as várias etapas para conseguir que o referendo seja convocado. Na Primavera conseguiu reunir mais de 1,8 milhões de assinaturas (das quais 1,3 milhões foram validadas) quando lhe bastavam 200 mil para desencadear o processo. O próximo passo será conseguir a assinatura de 20% dos eleitores (cerca de quatro milhões de venezuelanos) para que a consulta avance finalmente.

Mas a janela de oportunidade estreita-se a cada semana, já que a Constituição determina que, no caso de substituição do Presidente, só haverá eleições antecipadas se lhe restarem mais de dois anos de mandato, período que no caso de Maduro se esgota a 10 de Janeiro de 2017. Depois disso, mesmo que os venezuelanos decidam em referendo afastar Maduro o poder transita para o seu vice-presidente, Aristóbulo Istúriz, que assumirá a chefia do Governo até 2019.

Manifestações, protestos, ultimatos de nada têm servido para pressionar as autoridades a dar “luz verde” à etapa seguinte, com Maduro e os seus aliados a acusarem sistematicamente a oposição de “tentativa de golpe”, mobilizando os seus apoiantes para anular os protestos do MUD. E quarta-feira à noite, depois de uma semana de espera, a oposição ficou a saber que terá de recolher as assinaturas em apenas três dias, entre 26 e 28 de Outubro, tendo depois a CNE um mês para as validar e mais três para convocar o referendo, adiado assim, para “meados do primeiro trimestre” de 2017.

Mas os entraves não se ficam por aqui. A CNE autorizou apenas o uso de 5392 máquinas para recolher as assinaturas (contra as mais de 19 mil pedidas pela MUD) e decidiu que a oposição tem de conseguir o apoio de 20% dos eleitores em todos os estados do país, não sendo suficiente obter essa fasquia a nível nacional – bastará assim falhar o objectivo numa região para que toda a recolha fracasse.

Obstáculos que não fazem desistir a MUD, incentivada pelo descontentamento de um número crescente de venezuelanos com a crise económica sem precedentes, a violência e a carestia de bens essenciais que os obrigam a passar horas nas filas do supermercado. Ainda na quarta-feira os motoristas de autocarro paralisaram durante oito horas o centro da capital, Caracas, para protestar contra a crise económica, a insegurança e a escassez de peças de substituição para os envelhecidos autocarros.

A última sondagem do instituto Datanalisis indica que 80% dos venezuelanos são favoráveis a uma mudança de governo, números que levam a oposição a acreditar que conseguirá mais do que os quatro milhões de assinaturas – o número ambicionado são os 7,5 milhões que Maduro conseguiu nas últimas presidenciais e que são agora a fasquia mínima para que seja destituído em referendo. “Se oito milhões de pessoas assinarem [a última petição] isso seria uma forma de referendo revogatório”, disse à AFP o analista Hector Briceño, antecipando que a iniciativa teria um forte impacto sobre o Governo, mesmo que a consulta seja adiada para 2017.

Mas o chavismo permanece impassível. “Não haverá referendo em 2016. Eles são uns aldrabões”, garantiu Diosdado Cabello, número dois do Partido Socialista venezuelano, voltando a acusar a MUD de ter forjado milhares de assinaturas na primeira petição.

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