Rui Moreira quer mudar a lei eleitoral, mas esbarra na resistência dos partidos

Bloco de Esquerda acusa o autarca independente de “estar a pôr em causa um direito de cidadania” ao defender que apenas deve ser apresentado o cabeça de lista.

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Nelson Garrido

A um ano das eleições autárquicas, Rui Moreira desafia os partidos com assento parlamentar para alterarem a lei eleitoral, corrigindo “um erro” que, na sua opinião, representa um “factor de imponderabilidade inultrapassável” que prejudica as candidaturas independentes.

Dos partidos que o PÚBLICO consegiu ouvir, apenas o CDS se mostra receptivo. O Bloco de Esquerda admite apresentar um projecto de lei que, no entanto, não irá ao encontro da pretensão do autarca do Porto e o PCP diz que “não há razões que justifiquem a abertura de um processo de alteração da lei eleitoral”. Quanto ao PS e ao PSD, alegam não ter tido ainda acesso à carta que foi enviada por Rui Moreira aos partidos políticos.

O presidente da Câmara do Porto considera que a lei coloca as candidaturas independentes em “profunda desigualdade” e que “não é aceitável que as assinaturas recolhidas tenham de subscrever uma lista completa de candidatos e não apenas o 'número um' da lista”. Argumenta que, no caso das listas independentes, basta que surja um imponderável de última hora com alguém da lista (doença, inelegibilidade ou desistência, por exemplo) para que o processo possa ser anulado. Se isso acontecer a escassos dias das eleições autárquicas, a candidatura não conseguirá ir a votos.

Foi a pensar neste factor de “imponderabilidade inultrapassável” que Rui Moreira escreveu uma carta aos líderes das bancadas parlamentares. “É tempo de nós aprofundarmos a democracia. Nas últimas eleições houve resultados que foram sabidos à última hora, houve coisas na secretaria e, se nós queremos aprofundar a democracia, devemos tratar de resolver o assunto antes que seja em cima da hora, num tempo de grandes perturbações”, declarou o autarca esta segunda-feira aos jornalistas.

Esta não é, contudo, a primeira vez que o autarca toca no assunto, mas os apelos não têm encontrado grande receptividade juntos dos partidos que, para Rui Moreira, “devem ser coerentes com aquilo que dizem e corrigirem o que está mal”. “Se há um erro na lei, deve ser corrigido. Não estou a sugerir nada de extraordinário”, enfatiza.

O independente que em 2013 conquistou a Câmara do Porto ao PSD quer ir a votos sem sobressaltos e refere que, em relação às últimas eleições autárquicas, não teve nenhum problema, mas houve quem tivesse, como aconteceu com a candidatura independente de Fernando Paulo, em Gondomar.

“Não tive razão de queixa [nas eleições autárquicas de 2013], mas houve quem tivesse e, portanto, acho que a questão da imponderabilidade é uma questão má para a democracia, as democracias vivem mal com as imponderabilidades. É bom que os eleitores e os eleitos saibam com que regras do jogo partem para uma nova luta autárquica e, como eu já anunciei que serei candidato e serei candidato independente, não serei candidato por nenhum partido, é normal que eu queira saber com que regras parto”, sustentou.

O CDS está disponível para mexer na lei, porque entende que ela contém “uma lacuna, não intencional, que cria situações de desigualdade entre os partidos e as candidaturas independentes e que, em última análise, pode impedi-las de irem a votos”.

Nuno Magalhães, líder da bancada parlamentar dos democratas-cristãos, adiantou ao PÚBLICO que já comunicou a posição do partido a Rui Moreira, que contará com o apoio do CDS nas próximas eleições. No entanto, o CDS não parece disponível para ir mais além na alteração da lei.

Posição diferente tem o PCP que entende que “não há razões que justifiquem a abertura de um processo de alteração da lei eleitoral”. Para o PCP, “as listas de cidadãos eleitores – e não de ‘independentes’ como erradamente são denominados dada a sua utilização para ‘coligações’ eleitorais não são assumidas formalmente, como, aliás, a candidatura de Rui Moreira mostra à evidência – têm reunidas na lei as condições essenciais para a sua apresentação”.

Por seu lado, o BE admite mexer na lei, mas refuta o argumento de Rui Moreira que entende que a lei não deve exigir que “as assinaturas recolhidas [para viabilizar as candidaturas independentes] subscrevam uma lista completa de candidatos aos diversos órgãos e não apenas o cabeça de lista respectivo”. “As pessoas que subscrevem as listas têm o direito de saber quem faz parte delas. Nós não nos compaginamos que seja apresentado apenas o cabeça de lista”, declarou esta segunda-feira ao PÚBLICO o deputado do Bloco Pedro Soares, que preside à Comissão Parlamentar do Poder Local. “É lamentável que Rui Moreira esteja a levantar esta questão, porque uma coisa é haver um imponderável, outra coisa é, à boleia desse falso argumento, dar a volta a um direito de cidadania”,  acrescenta o deputado bloquista.

A única questão em que o BE concorda com o autarca do Porto é que, no caso de acontecer um “imponderável inultrapassável” com alguém da lista, o “Tribunal Constitucional aceite que a pessoa em causa seja subsituída por um suplente, como acontece nas candidaturas dos partidos”.

O Bloco de Esquerda admite apresentar um projecto de lei até ao final deste ano.

 

 

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