Quénia vai esvaziar maior campo de refugiados a partir de Novembro

Dadaab, onde actualmente vivem 344 mil, tornou-se um ninho de terroristas da Al-Shabab, diz o Governo queniano, que as organizações humanitárias acusam de estar a fazer campanha eleitoral.

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Refugiados no campo de Dadaab Thomas Mukoya/REUTERS

O Governo do Quénia anunciou ter desbloqueado dez milhões de dólares (8,7 milhões de euros) para encerrar o campo de refugiados de Dadaab, o maior do mundo, que suspeita sirva de abrigo para radicais islâmicos da Somália, as milícias Al-Shabab, que já fizeram vários ataques sangrentos no Quénia.

Perto da fronteira com a Somália, o campo de Dadaab já teve 600 mil pessoas, mas agora, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), estão lá 344 mil, das quais 328 mil somalis. Não é a primeira vez que as autoridades quenianas manifestam a intenção de o encerrar, mas este novo anúncio, feito na semana passada, parece mais determinado.

“Por motivos de segurança nacional que põem em causa os quenianos num contexto de actividades terroristas e criminosas, o Governo começou a operação de encerramento do campo de refugiados de Dadaab”, declarou o ministro do Interior, Joseph Nkaissery, esta quarta-feira. “Os refugiados serão repatriados para o seu país de origem ou países terceiros para aí se instalarem”, assegurou o ministro numa conferência de imprensa, ladeado pelos membros de um novo grupo criado de propósito para esvaziar o campo.

A expectativa do Governo é que os primeiros refugiados deixem Dadaab em Novembro, e que o campo possa ser encerrado até Maio de 2017.

“Seria imperdoável se o Governo não cumprisse a sua responsabilidade constitucional básica de proteger os cidadãos e a propriedade”, afirmou o ministro Nkaissery. “O campo tornou-se um centro de acolhimento para a Al-Shabaab e um posto de contrabando e proliferação de armas ilícitas.”

Esta decisão foi denunciada pelo ACNUR e as muitas organizações humanitárias que trabalham com os refugiados, que sublinham que o repatriamento forçado viola as convenções internacionais.

Mas o ministro do Interior queniano diz que a situação da Somália é agora diferente. "É importante notar que a Somália é agora um país seguro, e que está disposto a receber os seus cidadãos de volta", cita-o o jornal The Star.

Este anúncio surgiu na semana a seguir ao Presidente Uhuru Kenyatta ter começado a fazer campanha para a sua própria reeleição, nas presidenciais do próximo ano, escreve o jornal The Guardian. A imigração é um dos seus temas preferidos, tal como a guerra na vizinha Somália, de onde vem a maioria dos refugiados – e também os ataques terroristas, como o atentado no centro comercial Westgate, em Nairobi, em 2013, que fez 67 mortos, ou o ataque à Universidade de Garissa, em Abril de 2015, em que morreram 148 pessoas, dos quais 142 estudantes.

No entanto, um dos autores do atentado contra a Universidade de Garissa não era propriamente um refugiado: era filho de um representante administrativo do Governo na província de Mandera, no Nordeste do país, junto à fronteira com a Somália, e um óptimo estudante de direito - estava muito longe do retrato do refugiado, e mais próximo dos jovens que se aproximam das redes terroristas noutros países.

“O encerramento [do campo Dadaab] porá em risco 330 mil vidas somalis e terá consequências humanitárias sérias, ao forçar o regresso das pessoas a um país devastado pela guerra, com um acesso mínimo a assistência médica e humanitária”, diz um comunicado dos Médicos Sem Fronteiras, que apela ao Governo do Quénia “a reconsiderar a sua decisão.”

O Quénia já bombardeou bases da Al-Shabaab na Somália, e a Al-Shabaab já atacou bases da União Africana perto da fronteira com o Quénia, num conflito cada vez mais aberto e violento, e que está a alimentar as fracturas étnicas, muito vivas no país. A população da região costeira de Mombaça é maioritariamente muçulmana e de etnia somali, num país de múltiplas tribos, onde 80% das pessoas se identificam como cristãs. As Al-Shabaab afirmam-se como defensoras da minoria somali e os seus ataques visam essencialmente aldeias ou locais cristãos, o que leva as forças de segurança a acusar vários responsáveis locais de conivência com os radicais.

 

 

 

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