“Quando a poluição está alta, vamos todos de máscara”

Consultor português em Pequim diz que a China está empenhada em descarbonizar a sua economia.

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REUTERS/Benoit Tessier

Nos sete anos de vida na China, o consultor português Renato Roldão tem visto o país mudar. A nação que se agarrara ao carvão para crescer a um ritmo galopante está agora empenhada a fazer uma transição para uma economia mais sustentável.

Roldão chegou a Pequim em 2008, pela mão da empresa portuguesa Ecoprogresso. Já tinha estado na China antes, em 2002, enquanto fazia a sua tese de mestrado sobre as energias renováveis naquele país. Hoje trabalha para a consultora ICF International, auxiliando a China a desenvolver um sistema nacional de comércio de emissões de CO2, tal como o que existe na União Europeia.

Ao longo desse tempo, tem sentido na pele – ou melhor, nos pulmões – um dos problemas que está a empurrar a China para soluções mais amigas do ambiente: a poluição do ar. No seu apartamento em Pequim, há um purificador de ar em cada divisão. Em cerca de metade dos dias do ano, ele, a mulher e o filho – este a contragosto – têm de sair de casa protegidos. “Quando a poluição está alta, vamos todos de máscara”, conta ao PÚBLICO, nos corredores do centro de exposições de Le Bourget, onde ministros de 195 países estão negociar um novo acordo contra o aquecimento global.

O Governo chinês está a ser pressionado pela opinião pública e pelas próprias implicações sociais do problema. Mas resolver a poluição é também um passo para algo que a China deliberadamente pretende fazer, que é refrear o seu apetite por fontes sujas de energia e modernizar a sua indústria. “A economia chinesa tem imensas ineficiências”, confirma Roldão.

O consultor dá o exemplo da ineficiência energética dos edifícios. Em Pequim, o aquecimento é fornecido pela cidade, gratuitamente. É ligado dia 15 de Novembro e desligado no final de Março. Dentro das casas, porém, praticamente não há forma de controlar o calor que chega. “Às vezes estão temperaturas negativas lá fora, e cá dentro 30 graus. É preciso abrir as janelas”, diz Renato Roldão.

Pequim está a aproveitar o empurrão da poluição para encerrar muitas indústrias poluentes que povoam as zonas industriais ao redor da metrópole. A China quer ir mais adiante e vai lançar, em 2017, um sistema nacional de comércio de emissões, na qual haverá um limite para as emissões de CO2 e as empresas terão quotas de transaccionáveis de poluição. Com um sistema como este, as indústrias ou investem no controlo da poluição ou compram quotas, o que for mais barato. Muitas acabarão por fechar.

Renato Roldão diz que a política climática chinesa está a ser conduzida directamente pela Comissão Nacional para o Desenvolvimento e Reforma – o ministério que tem a tutela do planeamento. “É isto o que me dá confiança na posição chinesa. Estão a pensar de uma forma sistémica”, afirma.

No ano passado, a China anunciou os seus compromissos para a luta climática conjuntamente com os Estados Unidos, num encontro entre os presidentes Barack Obama e o Xi Jinping, em Pequim. A sua meta é reduzir as emissões de CO2 em 60 a 65% até 2030, mas em termos relativos, por unidade do PIB. Renato Roldão diz, no entanto, que internamente estão a ser avaliados todo o tipo de cenários, inclusive como chegar a reduções absolutas de emissões. “Estão a estudar tudo, eles fazem muito trabalho de casa”, diz.

A delegação chinesa chegou preparada à cimeira do clima em Paris. “Os chineses são bons negociadores”, avalia Roldão. O chefe da delegação é o experiente Xie Zhenhua, apesar de ter atingido a idade da reforma compulsória e já não figurar na lista dos líderes oficiais da Comissão Nacional de Desenvolvimento, da qual era vice-presidente. Será a sua última cimeira climática. 

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