Europa fecha com perdas de cerca de 5% após "segunda-feira negra" da China

PSI 20 acompanhou a tendência e teve a pior queda desde Outubro de 2008, desvalorizando 3,02 mil milhões de euros.

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A bolsa de Xangai sofreu a maior queda nos últimos oito anos AFP/JOHANNES EISELE

Habitualmente cautelosa com os termos, a expressão “segunda-feira negra” utilizada pela agência noticiosa governamental Xinhua deixa poucas dúvidas sobre a gravidade da queda das bolsas chinesas.

O principal índice da bolsa de Xangai caiu 8,46% e Shenzen, a segunda maior praça financeira do país, fechou a perder 7,83%. Em Hong Kong, o Hang Seng perdeu 5,17%.

O abalo com epicentro em Xangai registou réplicas um pouco por todo o globo, arrastando Japão, Europa e Estados Unidos para perdas generalizadas.

O PSI 20 fechou esta segunda-feira a perder 5,8%, descendo a barreira dos 5000 pontos (para 4.981,26 pontos), com a maior queda desde Outubro de 2008, data da derrocada do Lehman Brothers. Em valor, a perda das principais cotadas foi de 3,02 mil milhões de euros, com o valor global a descer para os 49,01 mil milhões de euros.

A derrocada do principal índice da bolsa de Lisboa foi acompanhada em termos europeus, com as principais praças financeiras em forte queda, num dia em que o índice pan-europeu FTSEurofirst 300 chegou a desvalorizar 6,4%, o que significa uma perda de 500 mil milhões de euros.   

A “segunda-feira negra” eclipsou os ganhos da bolsa de Xangai em 2015, registando agora uma perda de 0,8% em relação ao registado no início do ano. Quando comparado com o pico bolsista em Junho, Xangai perde 38%.

A sessão desta segunda-feira veio reforçar a volatilidade do mercado bolsista chinês, depois de, no final de Julho, a bolsa de Xangai ter registado a pior queda desde 2007, ao desvalorizar 8,48% em apenas um dia.

A recente desvalorização do yuan pelo banco central chinês levou à desconfiança de que Pequim estivesse a manipular a moeda para impulsionar as exportações e sustentar o crescimento previsto para 2015. A bolsa de Xangai tinha perdido 11,54% no acumulado da semana passada, reagindo mais uma vez a uma série de indicadores que apontam para a desaceleração da segunda maior economia do mundo. O último, o índice PMI de actividade industrial, foi publicado na sexta-feira e apontava para o valor mais baixo em 6 anos.

Para inverter a tendência de queda bolsista, as autoridades têm levado a cabo várias iniciativas. Durante o fim-de-semana, o governo chinês passou a permitir que os fundos de pensões públicos no país pudessem adquirir até 30% do seu portfólio em acções, uma medida vista como insuficiente pelos analistas.

Os investidores estariam à espera de medidas mais agressivas, e, na sua ausência, começou uma corrida à venda de activos. A demonstração de falta de confiança no mercado chinês provoca agora uma expectativa sobre quais serão os próximos passos de Pequim.

O gestor do Banco de Investimento Global (BiG), Steven Santos avalia que não há uma causa isolada que tenha motivado a queda do início desta semana. “Deve-se a um acumular de factores pessimistas”, considera explicando que a situação na Grécia ajuda a empurrar os mercados europeus para baixo.

No mesmo sentido, o gestor de activos do Banco Carregosa, Rui Bárbara, entende que “os dados sobre o abrandamento do ritmo de crescimento da produção industrial na China para níveis de há seis anos foi apenas um sinal de alerta para começarem a chover ordens de venda”. O gestor lembra que “o facto de estarmos em Agosto, e haver menos liquidez a ser transaccionada, também amplifica as quedas”.

Para os dois especialistas, a volatilidade das bolsas chinesas torna difícil de prever o que vai acontecer a seguir, considerando no entanto que ainda há margem para que existam novas quedas.

Europa no vermelho
Em Frankfurt, o Dax encerrou a perder 4,7%, em Paris o CAC derrapou 5,35% e em Londres o FTSE caiu 4,67%. Nestes índices, todas as cotadas fecharam a sessão em terreno negativo. Em Espanha, o Ibex perdeu 5,01% e apenas uma empresa terminou o dia com ganhos.

Neste dia de fortes perdas e alguma volatilidade, o PSI-20 chegou a perder mais de 6% mas, pouco depois das 15h, verificava-se uma queda de 4,63%, mas acabou por acentuar a perda na recta final. 

De manhã Lisboa liderava as perdas na Europa mas foi entretanto ultrapassada pelas principais praças europeias. Às 15h, Madrid perdia 5,10%, seguida de perto pelo índice alemão DAX, acelerou a perda para 4,91%. À mesma hora em Paris o CAC recuava 4,49% e o principal índice de Londres perdia 4,82%. 

O principal índice de Atenas fechou com um mergulho de 10,54%, numa conjuntura em que, a somar à “segunda-feira negra” chinesa, os mercados têm ainda que lidar com a situação política na Grécia, na sequência  do anúncio da demissão do primeiro-ministro grego Alexis Tsipras

Também o índice composto por empresas da zona euro, o Euro Stoxx 50, encerrou o dia a desvalorizar 5,35%, sendo que todas as cotadas registaram perdas.

Quem perdeu mais em Portugal 
O desempenho das melhores cotadas dá uma ideia do cenário no dia em que o PSI-20 fechou a perder 5,8%. A Semapa foi quem teve melhor comportamento de entre as cotadas, encerrando a sessão a perder 3,06%, sendo que apenas esta, a REN (-3,53%) e CTT (-3,87%) registaram perdas abaixo dos 4%.

Desde a banca às telecomunicações, todos os sectores foram fustigados pelo abalo da segunda maior economia do mundo. Com uma queda de 10,34%, o Banif foi quem mais perdeu, seguido pela Pharol (-8,75%). Das restantes empresas, Galp Energia, Altri, Sonae e Portucel perderam todas mais de 7%.

Ao início da tarde a Teixeira Duarte chegou a registar perdas na ordem dos 10%, mas recuperou e acabou o dia a cair 4,02%. 

Wall Street chegou a recuperar, mas acabou por cair
Nos Estados Unidos, Wall Street abriu em forte queda e recuperou a meio da sessão, apenas para mergulhar outra vez na parte final da negociação. Os três principais índices registaram perdas significativas, depois de um período em que pareciam resistir à tendência global. O índice S&P 500 perdeu 3,93%, o Dow Jones fechou a desvalorizar 3,57% e o Nasdaq encerrou a derrapar 3,78%.

A Apple foi a empresa que maior volume de acções movimentou. A cotação da companhia protagonizou um dos ressaltos do dia, numa segunda-feira em que os mercados financeiros mundiais deslizaram para terreno negativo. As acções da empresa chegaram a estar a cair cerca de 13% no Nasdaq. Chegaram a recuperar para terreno positivo, mas acabaram por cair novamente, fechando o dia a perder 2,64%, em linha com a tendência das bolsas norte-americanas.

Quando o mundo se está a ressentir do abrandamento da economia chinesa, o presidente executivo da Apple, Tim Cook, resolveu jogar uma cartada invulgar: ainda antes de as bolsas abrirem nos EUA, enviou um email a Jim Cramer, um popular apresentador de um programa televisivo sobre mercados financeiros, a assegurar que o negócio na China está a correr bem.

“Recebo actualizações sobre o nosso desempenho na China todos os dias, incluindo esta manhã, e posso dizer-lhe que continuamos a ter um crescimento forte do negócio na China ao longo de Julho e Agosto”, escreveu Cook. “Na verdade, a subida das activações de iPhones acelerou nas últimas semanas, e tivemos o melhor desempenho do ano na loja de aplicações na China ao longo das duas últimas semanas”.

A Apple – que, como empresa cotada, tem de respeitar regras sobre divulgação de informação – não costuma divulgar informação relevante fora das apresentações de resultados trimestrais. A cotação da empresa tem estado numa trajectória de descida no último mês.

“Obviamente, não consigo prever o futuro, mas o nosso desempenho neste trimestre, até agora, é reconfortante”, escreveu o executivo. Com João Pedro Pereira e Rosa Soares

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