Pela mão da maioria, Governo força nova reviravolta nas deduções do IRS

PSD e CDS/PP recuperam tecto global às deduções e incluem os encargos com juros de habitação e rendas. Cláusula de salvaguarda não avança.

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Na proposta inicial, o Governo acabava com as deduções dos encargos com imóveis Miguel Manso

Em pouco mais de um mês, há uma nova reviravolta na reforma do IRS. Quando o diploma for hoje votado na especialidade no Parlamento, há várias mudanças a ter em conta em relação ao projecto inicial, apresentado pelo Governo em Outubro.

As propostas de alteração divulgadas nesta terça-feira por PSD e CDS/PP, em articulação com o Executivo, não tocam nas medidas de simplificação do imposto e a grande bandeira da reforma – um quociente familiar, em que os filhos são considerados na divisão do rendimento. Mas no que toca às deduções à colecta, as alterações são significativas, ao ponto de os partidos da maioria deixarem cair a cláusula de salvaguarda, criada pelo Governo para impedir que os contribuintes fossem penalizados no IRS por causa das novas regras. Isto porque, garantiu o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, a “solução alternativa” assegura que nenhuma família fica prejudicada.

As mudanças previstas pelo PSD e CDS/PP nas deduções aproximam-se do modelo actualmente em vigor e distanciam-se da reforma apresentada em Outubro e, ainda mais, das recomendações feitas pelo grupo de dez peritos fiscais (que apontavam para deduções fixas iguais para todos). Afinal, as despesas de educação, de saúde, os encargos com imóveis (rendas e juros do crédito à habitação) e as despesas com lares contam para as deduções no IRS de forma autónoma, sendo estabelecido um tecto global que varia em função do nível de rendimento.

Com a inversão concertada com os partidos da maioria, o Governo garante que há agora mais progressividade do que na proposta que apresentou à Assembleia da República a 23 de Outubro. Mas isso não deverá ser suficiente para mudar a posição do PS, que se absteve na votação da reforma na generalidade e que contesta uma medida concreta de que o Governo não abdica: o quociente familiar – sistema em que o rendimento é dividido pelo número de membros do agregado familiar (cada sujeito passivo vale um ponto, sendo dado aos filhos um “peso” de 0,3 nessa divisão).

Os socialistas dizem que esta medida é regressiva e apresentam um modelo alternativo: em vez de os filhos serem considerados na divisão do rendimento, o PS propõe manter o actual quociente conjugal (em que o rendimento é dividido apenas pelo número de sujeitos passivos), considerando os dependentes de forma mais generosa na dedução à colecta, passando-a para os 500 euros.

Já o PSD e o CDS-PP centraram as propostas nas deduções. No caso dos encargos com imóveis, a maioria volta atrás e quer afinal que sejam deduzidos 15% dos juros dos empréstimos à habitação celebrados até 31 de Dezembro de 2011, com um limite de 296 euros – idêntico ao actual. Se se tratar de uma renda, a dedução é também de 15%, até um valor máximo de 502 euros, que vai variando em função do nível de rendimento.

Outra alteração relevante passa por manter deduções autónomas para os gastos de educação, que na proposta inicial do executivo figuravam como abatimento ao rendimento líquido.

No diploma, encargos como os pagamentos de creches, jardins-de-infância, lactários, escolas, estabelecimentos de ensino e as despesas com manuais permitiam um abatimento de 1100 no rendimento (por sujeito passivo ou por filho), com um limite de global de 2250 euros por cada declaração de rendimentos. Agora,  PSD e CDS/PP propõem que haja uma dedução à colecta de 30% das despesas, até 800 euros de dedução – um modelo que se aproxima do actual (30% de dedução, até 760 euros).

Para além da educação, também as despesas de saúde são consideradas de forma autónoma, o que o Governo já previa na proposta de Outubro. No entanto, ao contrário do projecto inicial, há agora um tecto global às deduções, que diminui à medida que o rendimento aumenta.

A maioria propõe que as deduções de encargos de saúde, seguros de saúde, educação, imóveis, pensões de alimentos, lares e benefícios fiscais não tenham limite para quem está no primeiro escalão de rendimento colectável (até 7000 euros); para os rendimentos entre 7000 e 80 mil euros, há um tecto intermédio variável; e nos rendimentos mais altos, acima deste último patamar, o limite das deduções é de mil euros.

Menos dedução em factura
Ao mesmo tempo em que alarga o leque de deduções à colecta, PSD e CDS/PP diminuem o benefício fiscal previsto pelo Governo no novo grupo de deduções das despesas gerais familiares – em que são consideradas para dedução todas as facturas emitidas com Número de Identificação Fiscal (NIF), seja as facturas da luz, gás, televisão ou de compras do dia-a-dia. Em vez de uma dedução de 40% das despesas até um limite de 300 euros por sujeito passivo de um agregado familiar, a maioria reduz a dedução para 35%, com um tecto de 250 euros de benefício no IRS.

Nas deduções das despesas gerais familiares, há outra novidade. Se se tratar de uma família monoparental, a dedução dos gastos das facturas emitidas com NIF é de 45%, com um limite de 335 euros.

O PS e os partidos da maioria sentaram-se à mesa para discutir o diploma em meados de Novembro, mas os socialistas acabariam por mostrar-se indisponíveis para entendimentos. E na votação do diploma na generalidade decidiram-se pela abstenção. O documento acabaria por ser aprovado com os votos da maioria, a abstenção do PS e os votos contra do Bloco de Esquerda, PCP e Os Verdes. Nesta quarta-feira, um dia depois da apresentação das propostas de alteração, o documento é votado na especialidade na comissão de orçamento e finanças.

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