Sonae expande negócio alimentar para Moçambique à boleia das lojas Extra

Onze anos depois do Brasil, grupo português junta-se à Satya Capital. Passagem de mãos foi festejada numa das duas lojas adquiridas ao grupo moçambicano ADC.

Lojas Extra na Avenida de Angola, uma das duas adquiridas pela Sonae em parceria com a Satya
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Lojas Extra na Avenida de Angola, uma das duas adquiridas pela Sonae em parceria com a Satya Manuel Roberto
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Manuel Roberto

Ainda havia marcas, logo à entrada da loja, de um gigantesco bolo que deu o mote para a entrada da Sonae em Moçambique. "É do nosso novo patrão. É nosso primo, é português", disse um dos funcionários, a tempo da última garfada e envergando uma t-shirt branca com o nome da S2 Africa Moçambique, a empresa criada pelo grupo nacional e pela Satya Capital para entrar neste mercado.

Eram vários, aliás, os trabalhadores que passeavam ontem pelas dezenas de corredores já sob a chancela da S2. Mas por fora ninguém diria que o espaço situado na Avenida de Angola, que liga a cidade ao aeroporto e que fica num dos bairros mais movimentados de Maputo, mudou de mãos. No exterior o que ainda existe são os letreiros dos supermercados Extra, do grupo moçambicano ADC. A outra loja que a Sonae comprou, ao mesmo vendedor, fica no bairro do Zimpeto, nos arredores da capital.

O espaço da Avenida de Angola, pelo menos, é suficientemente grande para comportar todo o tipo de produtos, com uma variedade considerável e indo dos frescos a cadeiras de plástico coloridas. Como é normal em Moçambique, dada a dependência de que o país tem das importações, há já várias marcas portuguesas nas prateleiras, como a Regina, a Delta ou a Renova. À saída, os clientes tinham de mostrar a factura das compras que tinham acabado de fazer e os recibos já ostentavam o nome da S2 Africa Moçambique.

A empresa, que se descreve na página do Linkedin como um “investidor e operador” no retalho em África, tem como missão fazer investimentos estratégicos neste continente, com foco em lojas alimentares, de brinquedos, produtos de papelaria, óptica e farmácia. É através deste veículo que a Sonae (dona do PÚBLICO) se estreia no negócio dos supermercados em África, investindo mais de seis milhões de dólares (5,3 milhões de euros) na compra de duas lojas Extra, montante partilhado entre o grupo português e a Satya Capital com um rácio de 30/70.

Contactada pelo PÚBLICO, a Sonae não esclareceu se em cima da mesa está a aquisição de toda a rede de supermercados Extra ou se vai alterar o nome das lojas para Continente, a insígnia com que opera em Portugal. No site da ADC (a sigla para Africom Delta Corporation), proprietária da cadeia, contam-se 24 lojas em Moçambique, incluindo cash and carry. A empresa moçambicana resulta da fusão entre a Africom e a Delta Trading & Companhia e, além de lojas e armazéns logísticos, também distribui produtos alimentares de grandes multinacionais como a Coca-Cola ou Unilever. Comprou a cadeia Extra em 2013 à sul-africana Pick n Pay, em dificuldades financeiras.

Um relatório elaborado em Maio do ano passado pela embaixada francesa em Moçambique adianta que o retalho alimentar é dominado por cadeias estrangeiras, sobretudo, de origem sul-africana. A Shoprite foi a primeira a implantar-se no país, em 1997, e partilha a liderança de mercado com a Spar (que também está em Portugal) e a Extra. “Os restantes distribuidores são de dimensão muito mais reduzida”, lê-se no documento. Na lista está a portuguesa Visabeira, que fornece vinho e bebidas espirituosas aos retalhistas locais através da Mercury.

Com uma classe média a emergir e uma presença significativa de expatriados, o país é encarado pelos investidores estrangeiros como um mercado com potencial, ainda que o comércio informal seja uma realidade incontornável. “As vendas de produtos frescos são limitadas porque são, com frequência, produzidos em casa ou adquiridos no mercado informal. O mesmo se passa nos produtos transformados”, lê-se no documento.

A ruptura angolana

Para a Sonae, Moçambique não é um território totalmente estranho. Em Dezembro de 2014, abriu a primeira loja de vestuário Mo e, um ano depois, anunciou a abertura da Zippy na capital, no âmbito de um acordo de franchising.

Ainda assim, se tudo tivesse corrido como planeado, o grupo liderado por Paulo Azevedo teria concretizado a abertura do primeiro supermercado fora de Portugal (depois da saída, em 2005, do Brasil) não em Moçambique, mas em Angola.

Depois de vários anos a trabalhar numa parceria com Isabel dos Santos, a Sonae e a empresária assumiram a ruptura neste projecto em finais de 2015, altura em que a filha do presidente José Eduardo dos Santos anunciou o lançamento da Candado (que significa abraço), uma rede de hipermercados que não tem qualquer participação do grupo português. A Sonae não adiantou pormenores sobre o fim da joint-venture com a Condis, a empresa de Isabel dos Santos e do marido Sindika Dokolo, onde detinha 47% de participação, e com quem assinou um acordo em 2011. Isabel dos Santos continua a ser parceira da empresa portuguesa na NOS.

Frustrada a expansão para Angola, a Sonae acabou por, pouco depois, anunciar a internacionalização dos hipermercados Continente no Médio Oriente, em concreto, nos Emirados Árabes Unidos. Em parceria com o grupo retalhista Fathima e em regime de franchising, prepara-se para abrir o primeiro de quatro hipermercados piloto neste país em 2017.

A expansão de lojas alimentares é uma estreia, mas a cadeia de Paulo Azevedo já vende produtos das marcas Continente, Continente Gourmet, É Continente, Área Viva, Contemporal, Kasa e note!. em 30 países.

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