Mais de 500 milhões de euros separam PS e coligação nos salários e na sobretaxa

Descongelamento da fórmula de actualização das pensões, proposta pelo PS, também contribui para esta diferença.

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Mário Centeno (à esquerda) liderou relatório que serviu de base ao programa eleitoral do PS. Nuno Ferreira Santos

Tanto os partidos da coligação como o PS querem garantir que um conjunto de medidas orçamentais serão aprovadas nas próximas semanas, para entrarem em vigor logo no início de 2016, tentando minimizar a ausência de um Orçamento do Estado. Embora a preocupação seja a mesma, a grande diferença é a forma como essas medidas devem ser concretizadas e mais de 500 milhões de euros separam as soluções assumidas pelo PSD/CDS-PP das medidas que o PS vai apresentar.

Na origem desta diferença está a forma como, durante o próximo ano, serão aplicados os cortes salariais na função pública, a sobretaxa de IRS e a actualização das pensões. Estas medidas são, entre aquelas que precisam de uma nova iniciativa legislativa para continuarem em vigor em 2016, as que representam um maior impacto orçamental.

Se nada fosse feito no Parlamento, a 1 de Janeiro, os funcionários públicos deixariam de ter cortes nos salários, os contribuintes deixariam de pagar a sobretaxa do IRS e alguns pensionistas veriam as suas reformas actualizadas. O impacto orçamental directo deste cenário face ao que aconteceu em 2015 seria, para a totalidade do ano, de cerca de 1670 milhões de euros, de acordo com as contas feitas no cenário macroeconómico do PS.

Os deputados do PSD e do CDS-PP - assumindo as propostas de lei que foram aprovadas no Conselho de Ministros da semana passada e que caducaram nesta quarta-feira por decisão tomada pela maioria de esquerda e pelo Presidente da Assembleia da República – querem minimizar esse impacto, garantindo que três quartos do corte salarial e da sobretaxa continuam a aplicar-se em 2016, assim como o congelamento das pensões (com excepção de algumas pensões mínimas). Nesse caso, o impacto orçamental nestas três medidas reduzir-se-ia para 400 milhões de euros.

Do lado do PS, a ideia é eliminar a aplicação destas medidas bastante mais depressa do que pretende a coligação. No programa que levou às eleições de 4 de Outubro, António Costa previa reverter metade dos cortes salariais e metade da sobretaxa no próximo ano, mantendo o congelamento das pensões (excepto as mínimas). Isto conduziria a um impacto orçamental directo da ordem dos 800 milhões de euros.

Mas com os acordos feitos com os partidos de esquerda, a proposta de programa de governo agora apresentada pelo PS vai mais longe, retirando os cortes salariais ao longo dos quatro trimestres deste ano e descongelando a actualização das pensões. Neste caso, o impacto orçamental directo sobe para cerca de 915 milhões de euros, mais 115 milhões do que previa no programa eleitoral.

No debate entre a coligação de direita e a maioria de esquerda – que será concretizado a 26 de Novembro quando as propostas legislativas da esquerda e da coligação relacionadas com salários e sobretaxa forem discutidas no Parlamento - há assim uma diferença de 515 milhões de euros no impacto para 2016.

Mas se do ponto de vista orçamental, as propostas do PS implicam um aumento da despesa, na perspectiva dos trabalhadores e dos pensionistas, o ano de 2016 trará melhorias no seu rendimento em comparação com o corrente ano. Para já, o PS propõe legislação sobre salários e sobretaxa, mas o programa é mais vasto e abrange também o salário mínimo e a redução da TSU dos trabalhadores com salários até 600 euros. No caso das pensões, poderá não ser necessária legislação, pelo menos para já, uma vez que o diploma com a fórmula de actualização estava suspenso pelo Orçamento do Estado e, não existindo tal documento, a lei voltaria a vigorar a 1 de Janeiro de 2016.

Salários do Estado livres de cortes no final de 2016
Actualmente, as remunerações superiores a 1500 euros (valor ilíquido) pagas aos funcionários do Estado estão a sofrer uma redução que vai de 2,8% a 8%.O PS quer que este corte seja eliminado ao longo do próximo ano — a um ritmo de 25% por trimestre — até desaparecer por completo na recta final de 2016. A eliminação dos cortes é mais veloz do que prevê a direita (propõe a eliminação total dos cortes em 2019) e do que propunham os socialistas no seu programa eleitoral (eliminação total em 2017). De acordo com as contas apresentadas pelos socialistas nesta quarta-feira, a medida custará mais 450 milhões de euros, face ao que previa o Orçamento do Estado para 2015.

O subsídio de Natal dos trabalhadores do Estado, confirmou o PÚBLICO, vai continuar a ser pago em duodécimos, pelo menos ao longo do próximo ano.

Sobretaxa de IRS cai para metade
O PS prevê baixar a sobretaxa de IRS para metade em 2016 (passando-a dos actuais 3,5% para 1,75%) e o fim da medida em 2017. O ritmo de redução é feito em metade do tempo previsto pela coligação PSD/CDS-PP, que prometia baixá-la ao longo de quatro anos (a um ritmo de 0,875 pontos a cada ano, eliminando-a apenas em 2019), embora admitisse acelerar a descida em função da margem orçamental. No estudo sobre o impacto financeiro das medidas do programa eleitoral do PS, a equipa liderada por Mário Centeno estimava uma perda de receita de 400 milhões de euros com a diminuição da sobretaxa para metade no próximo ano. Já o Programa de Estabilidade elaborado pelo primeiro executivo de Passos previa uma perda de 190 milhões de euros em 2016, porque a redução da taxa extraordinária seria menor, para 2,625% nesse primeiro ano.

Pensões até 628,8 euros actualizadas
PS, PCP e Bloco de Esquerda decidiram retomar o diploma que foi suspenso em 2010 e que faz depender a actualização das pensões da evolução dos preços (média anual em Novembro sem contar com a habitação) e do crescimento da economia. Como este ano se prevê um crescimento do PIB inferior a 2%, só as pensões mais baixas serão actualizadas, mantendo-se as restantes congeladas. Assim, as pensões até 628,8 euros terão um aumento de apenas 0,3%, em linha com a inflação esperada para Novembro, o que custará 66 milhões de euros no próximo ano aos cofres do Estado, segundo o PS. No seu programa eleitoral, os socialistas apenas previam aumentar as pensões mínimas, mantendo em vigor a estratégia do actual Governo (que apenas actualizou, a uma média de 1% ao ano, o primeiro escalão das pensões mínimas cujo valor ronda os 262 euros mensais, as pensões do regime agrícola e as pensões sociais) . Depois do acordo com o PCP e com o Bloco de Esquerda, a actualização foi alargada a mais pensões. O aumento, que no caso de uma pensão de 628,8 euros será de menos de dois euros, deverá chegar a 46% dos pensionistas do regime geral da Segurança Social e a 7% das pensões da Caixa Geral de Aposentações. Em 2017, aplicando a mesma fórmula, o PS estima o impacto nas contas do Estado na ordem dos 360 milhões de euros, sobretudo devido ao aumento da inflação.

TSU reduzida para quem ganha até 600 euros
A intenção do PS é reduzir as contribuições para a Segurança Social (a TSU) a partir de 2016, beneficiando 1,1 milhões de trabalhadores com salário base até 600 euros. De acordo com as contas apresentadas na quarta-feira por Mário Centeno, no primeiro ano de vigência da medida, cada trabalhador deverá levar para casa mais 20 euros e, no segundo, mais 40 euros. A intenção é que, até 2018, haja uma redução de quatro pontos percentuais da TSU , de 11% para 7%. De 2019 em diante, a TSU volta a aumentar, mas a um ritmo mais lento. Esta redução da TSU terá impactos negativos na receita da Segurança Social, que serão compensados por verbas do Orçamento do Estado. Tendo como referência os salários de 2013, o PS estima que a medida custe 109 milhões de euros no próximo ano e 218 milhões no ano seguinte.

Pequena redução no emprego por causa do SMN
No que respeita ao salário mínimo nacional (SMN), o PS prevê um aumento até aos 600 euros nos próximos quatro anos. Este aumento, antecipam os socialistas, poderá conduzir a uma redução do emprego mas de pequena dimensão, embora não tenha apresentado uma quantificação. A intenção é que o SMN aumente dos actuais 505 euros para 530 euros em 2016 e para os 557 euros no ano seguinte. Para 2018 não é apresentado um valor. com Cristina Ferreira e Pedro Crisóstomo

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