Futuro da PT Portugal decide-se entre Brasil e Angola

OPA à PT SGPS “compra” tempo para forçar Oi a negociar e pode abrir nova geografia para os negócios de Isabel dos Santos.

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Isabel dos Santos tem 19% do BPI Nuno Ferreira Santos

Em seis dias e com três comunicados Isabel dos Santos deixou claro que o futuro da PT Portugal já não se decide apenas no Brasil, no meio de um verdadeiro jogo de xadrez empresarial. Com o anúncio preliminar de lançamento de uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) à PT SGPS, a investidora angolana, que também é accionista da NOS, enviou aos brasileiros da Oi a mensagem de que quer estar no mercado brasileiro e ter também uma palavra a dizer sobre o que acontece à PT Portugal e à Unitel.

Se há dias ficava a ideia de uma posição conjunta e articulada com a Sonaecom (que divide com Isabel dos Santos o controlo accionista da NOS) em torno de “uma solução” para a PT, agora trata-se da empresária angolana a assumir individualmente uma posição de força, ainda que os seus objectivos estejam, como garante, “em harmonia” com os dos parceiros portugueses.

Isabel dos Santos quer ter pelo menos 50,01% do capital da PT SGPS, para assim alcançar uma “participação relevante, mas minoritária e não de controlo, no capital da Oi”, tudo isto através de uma OPA que considera voluntária e não hostil, mas da qual as partes envolvidas (ao contrário dos parceiros portugueses da Sonaecom) não terão sido previamente informadas. A oferta foi feita através da Terra Peregrin, uma Sociedade Gestora de Participações Sociais criada há poucos dias para este efeito, com escritório na Avenida da Liberdade, e através do qual o seu braço-direito em Portugal, Mário Silva, gere os negócios da empresária angolana.

Num comunicado divulgado esta segunda-feira, a Oi, que controla a PT Portugal e onde a PT SGPS tem aproximadamente 38% do capital, reagiu à oferta dizendo considerar “inoportuna qualquer alteração dos termos previamente acordados nos contratos” celebrados com a PT SGPS para ultrapassar a crise provocada pelo incumprimento da Rioforte. Nomeadamente aqueles que se relacionam com a opção de compra que será atribuída à holding portuguesa para recomprar as acções da Oi e refazer a posição com que se previa inicialmente que viesse a ficar na futura CorpCo, se não tivesse havido o investimento na Rioforte. Actualmente a PT SGPS não tem qualquer activo operacional e tem apenas a participação na Oi. Mas esta irá diminuir para 25,6% quando se obtiverem as autorizações necessárias dos reguladores brasileiro e norte-americano para criar a nova empresa, a CorpCo.

Nessa data, a PT SGPS (que por enquanto tem poder de veto sobre a venda da PT Portugal) receberá da Oi a dívida da Rioforte, e devolverá à Oi cerca de 11% do seu capital que poderá recomprar através de opções de compra se vier a recuperar os 900 milhões de euros à Rioforte. Este será o único mecanismo através do qual a PT SGPS ou os seus accionistas poderão reforçar a posição na Oi.

No entanto, no anúncio preliminar de OPA, Isabel dos Santos condiciona o lançamento da oferta a que esta obrigação caia (ou seja, quer poder comprar acções sem ser apenas através da opção). E também quer que a PT SGPS, ou seus accionistas, deixem de ficar sujeitos a limites de voto de 7,5% do capital da Oi, que é o que prevê o acordo entre portugueses e brasileiros.

Outras condições da OPA anunciada este domingo passam pela alteração dos estatutos da PT SGPS para que uma empresa concorrente (Isabel dos Santos já tem negócios de telecomunicações) possa ter mais de 10% do capital e votos. Mas também aqui é preciso que a Oi dê o seu OK, visto que está prevista a extinção da opção de compra se houver desblindagem dos estatutos. Segundo a Lusa, a administração da PT SGPS deverá reunir-se na segunda ou na sexta-feira para discutir a operação.

Apesar de Isabel dos Santos assumir que poderá renunciar a algumas destas condições para lançar a oferta (e tem 20 dias corridos a partir da data do anúncio para o registo dar entrada na CMVM), a verdade é que, para já, aquelas que estão em cima da mesa parecem de difícil concretização. E é por isso que alguns intervenientes no negócio consideram que esta é uma oferta “desenhada para fracassar”. Por isso e pelo valor da contrapartida. É o caso de Octávio Viana, presidente da ATM, associação de pequenos investidores. “Qualquer investidor que actue de forma racional e no sentido de maximizar lucros nunca aceitará a venda a 1,35 euros”, quando a média da acção nos últimos seis meses ronda os 1,94 euros, argumentou. Na sessão desta segunda-feira, as acções da PT fecharam a subir cerca de 11% para os 1,36 euros, acima do valor por acção previsto na OPA. Agora, ainda não é certo se esta avança ou não.

Várias fontes contactadas pelo PÚBLICO referem que, além do efeito surpresa, a empresária conseguiu com a jogada pôr um travão à venda acelerada da PT Portugal. E embora notem que a leitura do exacto alcance da operação só se fará nos próximos dias, o que parece consensual é que a Oi vai ter mesmo de se sentar à mesa com Isabel dos Santos. A oferta deverá ser lida mais como uma forma da empresária se posicionar e fazer pressão sobre os brasileiros, espoletando uma operação que consome tempo, algo de que a Oi poderá não dispor quando precisa urgentemente de reduzir a dívida e de ter liquidez para investir nas redes e entrar em operações de consolidação no mercado brasileiro.

Se a Oi já tinha uma oferta firme da Altice pela PT Portugal, que avalia a empresa em 7025 milhões de euros, e estava na iminência de receber outras de fundos norte-americanos (nomeadamente a Apax Partners), agora vê-se obrigada a incluir outra variável na operação. E não é uma variável qualquer: é uma accionista que controla a Unitel, da qual a Oi agora tem 25% do capital numa holding chamada Africatel (onde estão ainda posições em negócios de telecomunicações em Cabo Verde, São Tomé e Moçambique, entre outros). E que por acaso até reteve 245 milhões de euros em dividendos à PT por considerar que a empresa incumpriu os acordos accionistas.

Por outro lado ainda, a Oi já disse que quer vender os activos africanos, dos quais a posição na Unitel é a jóia da coroa. Isabel dos Santos afigura-se como a compradora óbvia, uma vez que os angolanos reclamam direito de preferência (porque a PT quebrou os acordos accionistas) e a comprar a posição por não mais que o seu valor patrimonial, inferior a 500 milhões de euros, quando a Oi a tem registada no balanço por mais de mil milhões. São mais que muitas as razões para que angolanos e brasileiros tentem um entendimento. E tanto para a Altice, como para outros potenciais interessados, o tempo agora será de esperar para ver. Com Luís Villalobos

Infografia: O cruzamento das ligações empresariais de Isabel dos Santos

 

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