Decisão sobre venda da PT Portugal à Altice adiada por dez dias

A venda da PT Portugal aos franceses levou às Picoas apenas 50% do capital da PT SGPS. A assembleia foi adiada até 22 de Janeiro, por proposta dos accionistas de referência.

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Nuno Ferreira Santos

Depois do braço-de-ferro travado nos últimos dias entre a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) e a administração da PT SGPS, poucos esperavam que a venda da PT Portugal à Altice fosse discutida na assembleia geral (AG) que ontem se realizou. A decisão ficou adiada por dez dias, numa AG morna, em que ninguém, com excepção do presidente da mesa da AG, António Menezes Cordeiro, se pronunciou. O próximo encontro está marcado para o próximo dia 22 de Janeiro.

Já passavam cerca de 20 minutos das 15h quando ontem os administradores da PT SGPS Paulo Varela (representante da Visabeira), Rafael Mora (Ongoing) e João Mello Franco (presidente da administração da PT SGPS, que durante vários anos foi presidente da comissão de auditoria) desceram para a reunião de accionistas, com intervalos de poucos minutos.

Os trabalhos começaram pouco antes das 16 horas, não sem um ponto prévio. Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, o presidente da mesa da AG (que entende que os accionistas devem poder votar a possibilidade de anulação do negócio com a Oi e que nos últimos dias se bateu junto da administração da PT para adiar a reunião, chegando a ameaçar demitir-se) sublinhou que a CMVM era tão taxativa nas suas queixas contra a qualidade da informação que a PT SGPS tem prestado aos seus accionistas sobre o negócio com a Oi que não havia sequer condições para que a venda da PT Portugal fosse colocada à votação.

E foi assim que o encontro, que começou quase com uma hora de atraso, logo foi interrompido por cinco minutos para que fossem apreciados quatro requerimentos apresentados à mesa. Dois foram ignorados (um que pedia que não houvesse adiamento e outro que pedia adiamento pelo tempo que o presidente da mesa entendesse) e outros dois foram postos a votação, o do sindicato dos trabalhadores da PT, que pedia o adiamento por 21 dias, e outros dos grandes accionistas: Novo Banco, Nivalis (Ongoing), Telemar (Oi), Controlinveste e Visabeira, que propunham um adiamento por dez dias.

Por decisão de Menezes Cordeiro, esta proposta foi votada por maioria qualificada (dois terços do capital presente) e até obteve cerca de 90% dos votos. Pouco ou nada interferiu na votação o facto de a Oi ter sido inibida por Menezes Cordeiro de votar o adiamento, mas o advogado dos brasileiros, Luís Corte Martins, não deixou ainda assim de marcar o protesto.

Sem surpresa, a decisão sobre a venda da PT Portugal à Altice foi “chutada” para a frente. E a CMVM levantou a suspensão das acções da PT, que vigorava desde a passada sexta-feira, depois de ter subido o tom num comunicado em que acusou a PT de recusar sistematicamente o envio de informação. "O objectivo [do adiamento] é ter mais tempo para publicar informação. Nós achámos que tínhamos sido esclarecedores, mas se a CMVM entende que não, nós cumprimos", disse aos jornalistas Rafael Mora, enquanto os requerimentos eram analisados por Menezes Cordeiro.

A motivar as queixas da CMVM está documentação, como os pareceres jurídicos sobre a viabilidade e as consequências da anulação do negócio com a Oi, confirmou Mora. "Incluindo pareceres negativos. Só se fala nos positivos, mas também há negativos", frisou. O gestor reiterou que, do seu ponto de vista, não há melhor alternativa do que a venda da PT Portugal à Altice e sublinhou que a PT SGPS tem pareceres que dizem que “é impossível desfazer um aumento de capital de uma empresa brasileira” (o aumento de capital da Oi realizou-se através da transferência dos activos da PT para a Oi – como a PT Portugal e os negócios em África – mas também através de dinheiro).

Também Mello Franco sublinhou que "o problema é [perceber] se neste momento é possível reverter um aumento de capital que foi concretizado em Maio". "Não foi só a PT SGPS [que participou], mas também muitos acionistas estrangeiros. As coisas são como são e eu apanhei a empresa nesta situação", disse o presidente da holding, citado pela Lusa. Mello Franco explicou ainda que o pedido de adiamento por dez dias visa evitar que o processo PT/Altice interfira com a assembleia de obrigacionistas que a Oi irá realizar no dia 26 de Janeiro, numa tentativa para que os credores flexibilizem as condições de pagamento este ano, para aliviar uma situação financeira cada vez mais complicada. A participação accionista na empresa brasileira, que tem uma dívida de pelo menos 15 mil milhões de euros, é neste momento o único activo da PT SGPS.

À saída da AG, o presidente da PT SGPS garantiu ainda que daqui a dez dias o tema em votação será exactamente o mesmo, ou seja, a administração da holding não irá propor qualquer novo ponto a discussão além da venda à Altice. Mello Franco disse que a inclusão de mais um ponto na agenda (como por exemplo a continuidade do negócio com a Oi) só poderá surgir por iniciativa de um accionista com mais de 2% do capital. À saída da AG, Menezes Cordeiro disse apenas que esta possibilidade é uma “matéria jurídica complexa”.

Para a Altice, que tem dito que quer fechar a compra da PT Portugal até Junho, tudo continua a ser simples: “A Altice reitera que a venda da PT Portugal é a melhor solução para a operadora, para os seus trabalhadores e para a manutenção do programa de investimento da empresa”, disse fonte oficial da empresa francesa.

A possibilidade de venda da PT Portugal levou apenas 50% do capital da PT SGPS à AG de ontem. Não é que a PT tenha tido ao longo dos anos afluências historicamente elevadas nas suas AG (nos últimos anos alguns dos pontos altos terão sido a AG que votou contra a OPA da Sonaecom, que teve uma representação de 66%, e aquela em que se votou o fim da golden share detida pelo Estado, com 68% de votos representados), mas o interesse demonstrado pelos accionistas ficou claramente abaixo da controvérsia que o tema tem gerado. 

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