Bruxelas duvida do ajustamento orçamental de Espanha e Itália

Para a Comissão Europeia, Alemanha não fez “progressos” nos últimos meses, França tem pouca margem orçamental, Itália está longe das metas para a dívida e Espanha corre o risco de não cumprir o défice em 2014.

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Bruxelas espera que Merkel apresente a versão final do orçamento após a formação do Governo de coligação THOMAS SAMSON/AFP

A Espanha e a Itália receberam esta sexta-feira um severo aviso da Comissão Europeia sobre o risco de derrapagem das suas contas públicas em 2014, mas conseguiram escapar a uma recomendação formal para alterarem os respectivos orçamentos de Estado.

O aviso foi feito por Bruxelas no quadro das suas novas competências, inauguradas este ano, de exame dos projectos de orçamento de Estado dos países do euro antes da aprovação pelos respectivos parlamentos nacionais para avaliar a sua conformidade com as regras europeias de disciplina orçamental (o pacto de estabilidade e crescimento do euro – PEC).

Dos 17 países do euro, só Portugal, Grécia, Irlanda e Chipre estão fora deste exercício devido ao acompanhamento especial de que são objecto no quadro dos seus programas de assistência financeira externa.

A Espanha recebeu um dos avisos mais sérios para acelerar o ajustamento de modo a respeitar a trajectória de consolidação acordada com os parceiros. Madrid recebeu há seis meses mais dois anos, até 2016, para colocar o défice em valores inferiores a 3% do PIB, comprometendo-se como contrapartida a reduzir este ano o défice para 6,8% do PIB (6,5% depois de descontados os custos da recapitalização da banca) contra 10,6% no ano passado, e de novo para 5,8% em 2014, 4,2% em 2015 e 2,8% em 2016. Para Bruxelas, no entanto, "há riscos significativos" de que a meta de 2014 não seja cumprida. Estes riscos resultam da previsão algo "optimista" para o crescimento do PIB por parte do Governo espanhol – 0,7% contra uma previsão de 0,5% da Comissão – a par de um esforço de consolidação orçamental em termos estruturais previsto no orçamento do próximo ano inferior às exigências europeias (0,5 pontos percentuais por ano, no mínimo) e de insuficientes reformas estruturais. A Comissão considera igualmente que nas suas previsões de redução do défice Madrid aposta num aumento das receitas fiscais excessivamente baseada numa melhoria da cobrança fiscal.

Bruxelas considera que a Itália também não procedeu ao ajustamento estrutural imposto pelas regras europeias, limitando-se a uns meros 0,2% o que põe em risco o cumprimento do critério de redução da dívida pública (5% de descida anual da parte da dívida que supera o limiar de 60% do PIB), cujo valor atingirá 134% do PIB em 2014.

Enrico Letta, primeiro ministro italiano, reagiu em Roma à recomendação da Comissão para intensificar o esforço de consolidação ao afirmar que "um excesso de rigor pode asfixiar a retoma da economia". "Luto por uma Europa que perceba que se pode morrer de austeridade", afirmou Letta, insistindo que um insistência excessiva na austeridade só vai reforçar os extremistas de direta e os eurocépticos.

Bruxelas apontou igualmente o dedo à França embora de forma mais branda. O Governo francês reagiu particularmente mal há seis meses quando a Comissão lhe recomendou um aumento da idade da reforma, afirmando que lhe cabe a si e não a Bruxelas decidir o tipo de reformas a realizar.

Desta vez, a Comissão não entrou em detalhes, limitando-se a afirmar que a reforma do sistema de pensões é insuficiente e que várias profissões protegidas continuam fechadas à concorrência. Segundo Bruxelas, mesmo se o défice francês será este ano de 4,1% do PIB em vez dos 3,9% fixados, "o esforço estrutural está próximo dos objectivos fixados", afirmou Olli Rehn, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e financeiros.

Apesar desta boa-vontade, a Comissão considera que o orçamento francês não contém qualquer margem de manobra para acomodar eventuais derrapagens.

Se a Comissão se coibiu de críticas, Anders Borg, ministro sueco das finanças, não se fez rogado ao considerar a situação francesa "verdadeiramente preocupante". "A França continua a perder competitividade, tem um desemprego muito elevado e tem problemas significativos de viabilidade a longo prazo", diagnosticou Borg à entrada de uma reunião dos seus pares da UE.

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