Ao fim de dois anos e meio, CP paga dívida de 170 milhões à Refer

Transportadora devia taxa de utilização da rede ferroviária desde Março de 2012, mas acertou contas com a Refer em Dezembro depois de obter luz verde do Ministério das Finanças e já está a pagar mensalmente.

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Dívida fez com que prazos de pagamentos da CP disparassem para 345 dias Nelson Garrido

A CP já pagou os 170 milhões de euros que devia à Refer desde 2012 pela taxa de utilização da infra-estrutura ferroviária gerida por esta última empresa. O pagamento esteve pendente durante largos meses a aguardar por autorização do Ministério das Finanças e estava a ter impactos muito negativos nos prazos médios de pagamento da transportadora, que já tinham disparado para 345 dias em Setembro, conferindo-lhe o primeiro lugar na lista de maus pagadores do Estado a fornecedores.

A confirmação de que a empresa saldou a dívida à Refer consta no relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) relativo à execução orçamental do último mês de 2014. O documento faz referência “ao pagamento da taxa de utilização da infra-estrutura ferroviária por parte da CP, no valor de 170 milhões de euros, relativa ao ano de 2013 mas efectuada apenas em Dezembro de 2014, na sequência da celebração de um acordo de regularização de dívida”.

Contactada pelo PÚBLICO, a transportadora ferroviária confirmou o valor pago à Refer, mas explicou que diz respeito não apenas ao ano de 2013, mas a todo o período “entre Março de 2012 e o que estava vencido em 2014” (ou seja, até Outubro do ano passado). Desde este mês que a CP já está a pagar a um ritmo mensal a taxa de utilização da infra-estrutura ferroviária, uma espécie de portagem que é cobrada por usar a rede da Refer.

A dívida estava, portanto, por saldar há 32 meses e só foi paga depois de chegar a autorização do Ministério das Finanças. Em meados de Dezembro, a transportadora já tinha adiantado ao PÚBLICO que estava “a desenvolver todos os esforços no sentido de assegurar o pagamento da sua dívida até ao final de 2014”, o que acabou por acontecer mais perto do fim do ano.

Mas o atraso teve impactos muito negativos nos prazos de pagamento da empresa, fazendo com que chegasse a Setembro com um atraso de 345 dias para acertar contas com fornecedores. Tratou-se de um agravamento de 84%, face aos 187 dias que registava em igual período do ano anterior. Face a 2012, a derrapagem ainda é mais expressiva, já que em Setembro desse ano a CP estava a pagar com um atraso de 110 dias.

A dívida à Refer, que em Setembro de 2014 representava 94% dos montantes totais que a transportadora ferroviária tinha por pagar aos fornecedores, fez inclusivamente com que a CP passasse a liderar a lista das empresas públicas que mais tempo demoram a saldar contas. Passou a ocupar esse lugar do ranking logo em Março de 2013, superando pela primeira vez a Parque Expo. A empresa fez sempre questão de frisar que, excluindo as contas por acertar com a gestora da rede ferroviária, o prazo médio de pagamentos rondava os 60 dias.

O relatório da UTAO refere ainda que a transferência dos terminais ferroviários de mercadorias da CP Carga para a Refer também foi concluída em Dezembro. Esta operação, que sempre foi considerada urgente pela Comissão Europeia para permitir o acesso de operadores concorrentes a estas infra-estruturas, é vista como um primeiro passo para a privatização da CP Carga, que está agora pendente de negociações com Bruxelas sobre o destino a dar à empresa participada da CP.

Empréstimos de 4,6 mil milhões às empresas públicas
Ao longo de 2014, o Estado fez uma série de empréstimos a empresas públicas reclassificadas (ou seja, que estão incluídas no perímetro das contas do Estado) num valor global de 4,6 mil milhões de euros. Tal como refere a UTAO, estas operações “visaram, sobretudo, a reestruturação financeira do sector dos transportes”, através de um “processo de substituição de dívida bancária por financiamento do Estado”. Daí que, dos créditos concedidos pelo Tesouro, se destaque a CP, com quase 2,3 mil milhões de euros, bem como a Metro do Porto (500 milhões) e a Carris (458 milhões).

Esta estratégia de reestruturação financeira, que o Governo tinha acordado com a troika desde 2011 mas que só foi operacionalizada a partir do segundo trimestre do ano passado, também abrangeu, além dos empréstimos, dotações de capital a outras quatro empresas públicas do sector dos transportes e infra-estruturas: à Estradas de Portugal (no valor de 793 milhões), à Refer (240), à Metro de Lisboa (211) e ainda à Transtejo (2).

No relatório, a UTAO sublinha ainda o facto de o défice das empresas reclassificadas ter piorado em 2014, ao atingir 1069 milhões de euros, o que significou um agravamento de 90 milhões face ao ano anterior. Este resultado deveu-se à redução do saldo de capital em 692 milhões, já que em termos operacionais se registou uma melhoria de 601 milhões.  É também destacada a diminuição das despesas com juros e com encargos financeiras, em 280 milhões, fruto da reestruturação financeira e da liquidação antecipada de swaps da Refer, da Metro de Lisboa, da Metro do Porto e da Estradas de Portugal.

Por outro lado, as despesas de investimento cresceram 55% para 1605 milhões de euros, muito devido ao início dos pagamentos de quatro subconcessões rodoviárias (as PPP Transmontana, Douro Interior, Baixo Tejo e Litoral Oeste), o que obrigou a um acréscimo de 558 milhões nos encargos da Estradas de Portugal.

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