As barbaridades contra os militares continuam

O que mais dói é que não há um único general ou chefe militar no activo que venha a terreiro colocar as coisas como elas são

“As únicas nações que têm futuro, as únicas que se podem chamar históricas, são aquelas que sentem a importância e o valor das suas instituições e que, por conseguinte, lhes dão apreço” (Tolstoi)

O Ministro da Defesa, sobre quem qualquer adjectivo de urbanidade passou a ser estultícia, veio anunciar, no dia em que Vasco da Gama chegou ao Tejo, vindo da Índia, que iria desbloquear a promoção de 6088 militares e que tal implica a despesa de 6,8 milhões de euros.

Diversos órgãos de comunicação social fizeram eco das declarações, pondo ênfase e “entoação”, na ideia de que se trata de um tratamento preferencial, que o custo é pesado, deixando subentendidas várias críticas veladas.

Todos se comportam como se estivessem a fazer algum favor à Instituição Militar (à “tropa” como, eufemisticamente, usam apelidar) ou aos seus profissionais, que são, desde Afonso Henriques, os primeiros servidores da causa pública.

E o que mais dói é que não há um único general ou chefe militar no activo, que venha a terreiro colocar as coisas como elas são.

Desde há 40 anos que raros foram aqueles que deram o peito às balas e tenham reposto a verdade dos factos e das intenções, e com o seu silêncio permitiram que basbaques da classe política e jornalística desconsiderassem, distorcessem, mentissem, prejudicassem e até humilhassem, não só a eles próprios, como a Instituição que integram e, supostamente comandam.

E já nem falo das ocasiões em que a soberania do País foi beliscada (e tem sido muito) e os mesmos aos costumes disseram nada, fazendo tábua rasa dos juramentos que fizeram.

Este melífluo ministro da defesa (e sua equipa), de falinhas mansas e untuosas, teve o despautério de apresentar uma medida, que deveria ser normal e automática, como sendo uma grande coisa, sem referir que o ora anúncio, que devia ter vergonha de fazer, apenas decorre da escabrosa e injustificada medida que o governo de que faz parte tomou, em 2011, de congelar as promoções nos três Ramos das Forças Armadas e que ia do simples soldado aos generais de três estrelas (e que vinha a ser preparado do governo anterior).

Os únicos que não foram “congelados” foram os de quatro estrelas, os quais poderiam ter entrado para a História se algum deles tivesse tido a coragem e a sageza de afirmar não querer receber a promoção enquanto a normalidade não fosse restabelecida!

Uma medida, aliás, muito mais gravosa do que o malfadado Decreto-Lei 353/73 (que regulava a passagem dos oficiais milicianos ao quadro permanente), que está na origem do golpe de estado ocorrido em 25/4/74!

E não se esqueceram de referir o custo quando, do anterior (e o actual despacho nº 5505-B/2015 reitera, e onde aberrantemente o MDN assina na companhia do Secretário de Estado da Administração Pública), se estabeleceu que todas as promoções a haver não aumentavam a despesa global orçamentada para o pessoal!

É evidente que não devemos culpar apenas o inefável ministro, hífen Branco, por mais esta aberração demagógica – a juntar às mais recentes extinção do Fundo de Pensões dos Militares; idem para o Complemento de Pensão de Reforma; a borrada em que continua a Saúde Militar; a destruição e apropriação do IASFA e a promulgação do novo Estatuto dos Militares das FA, pelo PR, facada que culmina (por enquanto) o início da desmontagem da Instituição Militar iniciada no primeiro governo de Cavaco Silva.

As responsabilidades repartem-se pelo Governo (os anteriores também não foram melhores, neste âmbito, mas nunca se chegou tão longe), onde se destacou o Ministério das Finanças que, na sequência do que se fez no consulado do Ministro Santos Silva – conhecido na gíria por “hiena trotskista” (Governo Sócrates), numa incrível inspecção que fizeram aos Ramos – e que também não mereceu, na altura, qualquer oposição da hierarquia militar – tem continuado na mesma senda.

Aquilo representou um completo atestado de incompetência (até ao próprio ministro) e uma espécie de usurpação de funções!

E, claro, o Primeiro-ministro que é o responsável máximo por toda a Política de Defesa Nacional – se é que tais termos se podem aplicar, actualmente, em Portugal.

Na sua arenga aos “Filhos da Escola” – termo pelo qual os nossos marinheiros gostam de se tratar – no tal dia em que a Armada comemora o seu aniversário, na data maior da sua vetusta História – que levou Toynbee a considera-lo divisória na época pré e pós-gâmica – o personagem que o estrago-maior laranja arranjou para tutelar a Defesa, elogiou a Marinha afirmando que “todas ou grande parte das suas missões são missões de serviço público”.

Mas então era suposto serem o quê? E aquelas que ficaram de fora (“todas ou grande parte”), são o quê?

E saiu-se também com esta tirada: “está a generalizar-se em Portugal a ideia da importância do Mar para Portugal”.

Deve ser por isso que não se descobre um canal televisivo que tenha dado sequer uma notícia ou imagem do Dia da Marinha…

É incrível como a memória é tão curta, a desfaçatez tão comprida e a cobardia tão extensa – até a costumam confundir com “prudência”, “bom-senso” e, até “sentido de estado”…

De facto a natureza humana não muda mesmo.

Oficial Piloto Aviador

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