Esquerda aprova novas regras para os transportes do Porto sob protestos da direita

Alteração ao diploma vetado pelo Presidente estipula que os municípios dêem parecer prévio nos processos de subconcessões, mas que não é vinculativo. Só PSD e CDS votaram contra.

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Marco Duarte

Como era de esperar, a esquerda em peso aprovou a alteração cirúrgica ao diploma vetado pelo Presidente da República em Julho e que alterava os estatutos da STCP e as bases de concessão da Metro do Porto para impedir a passagem da sua gestão para privados. O PS propôs que o decreto-lei passe a incluir um artigo que estipula que os processos de decisão sobre subconcessões ou transmissões de participações sociais nas empresas de transportes públicos na área urbana do Grande Porto tenham um parecer prévio das autarquias daquela área territorial.

No debate da reapreciação do decreto, sucederam-se as acusações. O deputado João Paulo Correia afirmou que o “ajuste directo de 820 milhões de euros” para a concessão dos transportes do Porto, “pouco ou nada transparente”, lançado a “dois meses das eleições” foi um “contrato lesivo para o Estado”, e “marcado por uma série de trapalhadas e pouco ou nada transparente”. A sua reversão foi uma “vitória” do actual Governo, dos seis municípios afectados (Gaia, Porto, Matosinhos, Valongo, Maia e Gondomar), insistiu.

O ajuste directo “levaria ao aumento dos tarifários, da degradação da qualidade do serviço, menos carreiras e menos frequência, e à redução do nível de segurança das circulações”, deixando os utentes” altamente prejudicados”, argumentou ainda o deputado, que é também presidente de uma junta de freguesia de Vila Nova de Gaia. Uma estratégia que levou à privatização da ANA, da TAP e da CP Carga, e que previa também os transportes públicos urbanos de Lisboa e do Porto, exemplificou.

Respondendo às críticas do Presidente de que a solução do Governo para os transportes do Porto não estava no seu programa, João Paulo Correia afirmou que “o programa do Governo está a ser cumprido”, o capital social da STCP e da Metro do Porto “vão continuar nas mãos do Estado, a operação da STCP está a ser descentralizada para os municípios conforme o programa de Governo”. O deputado insistiu: com esta alteração “nada poderá ser feito contra a vontade maioritária dos seis municípios. Não se podem fazer mais privatizações a martelo.”

O resto da esquerda veio defender a solução do PS. De António Filipe (PCP) chegou o maior ataque ao Presidente da República, a quem acusou, indirectamente, de se intrometer nos poderes do Parlamento e do Governo. O deputado pegou num dos argumentos de Marcelo Rebelo de Sousa – que o Parlamento estaria a imiscuir-se em competências que pertencem à Administração Pública e aos municípios – para dizer que o veto presidencial foi “exercido em nome das dores do Governo que este não tem e de que não se queixa, se alguém aqui falta à devida separação de poderes não é com certeza a Assembleia da República”.

“Insulto ao poder local”, diz PSD

À direita, o social-democrata Paulo Rios criticou a fórmula “hipócrita” encontrada por socialistas e comunistas para a alteração do diploma, “que dá espaço zero às autarquias” ao contrário do prometido por António Costa. Considerou-a mesmo “um insulto à inteligência do Parlamento e do Presidente da República por ser uma meia-solução que não é coisa nenhuma”. “É um insulto ao poder local”, vincou o deputado do PSD sobre o facto de os pareceres serem prévios mas não vinculativos. “Acham que algum autarca se sente valorizado com estas três linhas?”

Paulo Rios lembrou as questões levantadas por Marcelo Rebelo de Sousa na mensagem do veto político para dizer que não foram respondidas pelo PS nesta alteração e que agora “a coisa está muito menos transparente e com muitos mais amigos do que no concurso público aberto” pelo anterior Governo.

A centrista Cecília Meireles vincou a diferença “fundamental que separa” a direita e a esquerda. “Para nós, o fundamental é ter um serviço bom e eficiente ao mínimo custo possível; para os senhores é que seja público e se é pior e se os contribuintes pagam mais, é completamente indiferente. Desde que a nova trilogia sagrada das esquerdas governantes seja cumprida, não há problema; desde que os sindicatos estejam satisfeitos, não há problema que os utentes sejam mal servidos e que a factura vá para os contribuintes. Desde que os senhores continuem no Governo não há problemas que o serviço seja pior e mais caro.”

A deputada afirmou que se trata da “reversão de um privado para um privado”, argumentando: “O que querem fazer é consagrar na lei que a subconcessão do Metro do Porto não pode ser de nenhum privado a não ser que seja do grupo Barraqueiro. Sobre isto é incompreensível que PCP e BE e PEV [estejam] caladinhos.”

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