Albufeiras portuguesas com fartura de água asseguram consumo humano para 2024

A estação de Inverno termina com 70 das 81 barragens públicas nacionais em condições de assegurar ao longo de 2024 o consumo humano, a rega e a produção de energia. Distribuição é desigual no país.

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O Alqueva está próximo do seu nível de pleno armazenamento Nuno Ferreira Santos/ARQUIVO
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As tempestades Hipólito, Irene, Juan, Karlota, Bernard e Félix, que atravessaram a Península Ibérica entre meados de Janeiro e meados de Março, deixaram na sua passagem uma substancial margem de conforto hídrico em condições de assegurar, durante 2024, as necessidades do consumo humano, o regadio das culturas e a produção de energia eléctrica.

As 81 albufeiras nacionais receberam um volume de afluências acima dos 1700 hectómetros cúbicos (hm3). No entanto, a sua distribuição pelo território nacional persiste em diferenciar as reservas acumuladas a norte do rio Tejo, com algumas regiões do Sul do país (litoral alentejano, Barlavento e Sotavento Algarvio), onde os níveis de pluviosidade se têm mantido residuais.

O Boletim de Armazenamento nas Albufeiras de Portugal Continental, publicado a 18 de Março pelo Serviço Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH), refere que, das 81 barragens monitorizadas, 54 apresentam um nível de armazenamento entre os 80% e os 100%, 15 entre os 50% e os 80% e 12 encontram-se abaixo dos 50%. Destas últimas, três albufeiras continuam no vermelho: Monte da Rocha, na bacia do Sado (16%) e, na região algarvia, Arade (17%) e Bravura (16%).

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Nuno Ferreira Santos

A Barragem de Santa Clara, na bacia do Mira, constante dor de cabeça para os produtores de frutos vermelhos, registou um aumento de 27,3 hm3 na água armazenada, que, à partida, pode suprir as necessidades de rega, embora o seu nível de armazenamento se mantenha, neste momento, seis metros abaixo da cota do caudal morto.

Alqueva quase em pleno armazenamento

A boa nova chega do Alqueva. Com mais um período de chuva intensa, atingirá o seu nível de pleno armazenamento. No dia 16 de Março, esse nível encontrava-se a menos de 1,5 metros da sua cota máxima, 154 metros acima do nível do mar. A capacidade de encaixe estava preenchida com 3745 hm3 (91%).

Alqueva atingiu o seu enchimento pleno pela primeira vez em 2010 e a última em 2014. Desde então, as reservas de água estiveram longe do seu máximo, que se pode vir a verificar nos próximos dias. Entre 1 de Janeiro e 16 de Março entraram na maior albufeira portuguesa 770 hm3 de água, um débito superior ao volume que pode disponibilizar para o regadio (620 hm3).

Comparando com as reservas de água armazenadas nas 35 albufeiras instaladas na bacia do Guadiana em território espanhol, é inferior (3729 hm3) à que está retida em Alqueva, mantendo-se a situação de escassez que já se observa desde 2018. E pode vir a agravar-se nos próximos meses. O calor em Sevilha, transportado por uma massa de ar quente vinda de África, transformou os últimos dias de Inverno num momento de Verão com temperaturas a rondar os 30 graus, antecipando novamente ondas de calor em períodos cada vez mais curtos entre si.

As elevadas temperaturas acabarão por se reflectir nas reservas hídricas de superfície, acelerando os episódios de evapotranspiração que se irão traduzir em significativas perdas de água.

As ondas de calor também irão chegar mais cedo, com maior incidência, ao Sul de Portugal, Alentejo e Algarve, e de pouco servirá a água armazenada em Alqueva para suprir as necessidades em vastas regiões do Alentejo e Algarve, nos anos mais próximos, até que fiquem concluídas as condutas que transportarão a água para a Barragem de Monte da Rocha, previsto para 2026, ou para a região algarvia, ainda sem data marcada.

Uma auto-estrada da água?

No artigo A Água e o Desenvolvimento Mundo Rural, de Jorge Avelar Froes, Manuel Holstein Campilho e Miguel Holstein Campilho e publicado em Fevereiro pela Agrogés, é proposto o transvase de água do Norte para o Sul do país, para solucionar o problema da escassez no Alentejo e Algarve. “Não há falta [de água] no país. O que há é falta de gestão”, assinalam os proponentes da instalação de uma “auto-estrada da água”, assinalando que o problema está identificado: “A chuva está mal distribuída, sendo excedentária no Norte e escassa no Sul e acontecendo no Inverno, quando é necessária no Verão.”

Este contratempo resolve-se com a instalação de um “sistema de transferência de caudais [Douro-Tejo-Guadiana] constituído por estações de bombeamento e canais ao longo do interior do país”.

Portugal tem instalados cerca de 600.000 hectares de regadio uma área que deverá ser “duplicada a médio-longo prazo, principalmente em regiões com elevada capacidade produtiva, como seja o Ribatejo, o Alentejo e o Algarve”, antevêem os autores do artigo publicado pela Agrogés, suportando a sua análise na abundância que dizem existir de recursos hídricos em Portugal.

Recorrendo-se do Plano Nacional da Água publicado em 2015, salientam que o país dispõe, em média, de 48.000 hm3/ano de águas superficiais e deste total 16.000 hm3 vêm de Espanha através dos rios internacionais (Lima, Minho, Douro, Tejo e Guadiana) e 8000 hm3 de água subterrâneas. O total são 56.000 hm3/ano, mas a longo prazo, “fruto das alterações climáticas” o seu volume pode ficar reduzido a 39.000 hm3/ano.

Deste quantitativo em recursos hídricos, o país consome na agricultura, turismo, indústria e abastecimento urbano cerca de 4500 hm3, quantitativo que, a longo prazo, poderá atingir os 6000 hm3 “em resultado de diferentes factores, incluindo as alterações climáticas”, admitem os três defensores da auto-estrada da água. Com uma conclusão: “Portugal não tem, nem nunca terá, falta de água”, propondo ainda a “construção de barragens que aumentem a capacidade de armazenamento disponível”, que é actualmente de cerca de 13.000 hm3. E mesmo que Espanha venha a “fechar a torneira”, garantem que Portugal tem água suficiente para as suas necessidades.

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