Médicos preocupados com proposta do Governo. “Dão com uma mão para tirar com a outra”

A reunião entre os sindicatos e o Governo está marcada para as 16h deste domingo. Sindicatos vão apresentar uma contraproposta conjunta ao documento enviado pelo ministério.

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Médicos têm realizado várias manifestações frente ao Ministério da Saúde, contestando melhores condições salariais e de trabalho Matilde Fieschi

O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) manifestou-se neste domingo preocupado com a proposta apresentada pelo Governo antes de regressarem à mesa das negociações e para as quais está a ser preparada uma contraproposta. Do lado da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), a preocupação é idêntica. E deixa um alerta, horas antes da reunião, relativamente à situação dos serviços de saúde: "A situação é muito grave, o SNS parece que está a ruir."

Em declarações à agência Lusa, o secretário-geral do SIM assumiu que estão "seriamente preocupados com essa proposta" apresentada neste sábado pelo Ministério da Saúde. Desde logo, diz, porque "vai ao arrepio daquilo que foi dito na última reunião negocial" e "há um sentimento de decepção, porque, como é evidente, se a situação se mantiver como tem estado (...), vai agravar-se".

"Parece-me que o Governo está totalmente insensível em relação ao que está a ocorrer em todo o país, na dificuldade nas escalas de urgência, das consultas externas e das cirurgias que são adiadas e no número de utentes sem médico de família", disse.

O sindicalista acusou o Governo de não aproveitar a disponibilidade apresentada pelo SIM e pela Fnam de uma "cedência importantíssima, que era a calendarização de três aspectos que ocorreram no período da troika". "Na transição, de uma forma faseada, para 35 horas de trabalho, tal como todos os funcionários públicos; diminuição da carga de urgência na carga de trabalho, permitindo, dessa forma, criar condições para que as cirurgias programadas e as consultas façam, claramente, uma menor pressão junto da urgência e, ao mesmo tempo, fazer uma reposição salarial, também faseada no tempo", enumerou.

Permitir-se-ia desta forma, referiu, "criar estas três condições para que os médicos deixem de sair do Serviço Nacional de Saúde", como aconteceu em 2022, quando "cerca de 1100 rescindiram" e, este ano, "espera-se a reforma de 1200". "Esta preocupação é fundada, é uma preocupação muito responsável, porque abdicamos de exigir a imediata reposição e, pelos vistos, o Governo não tem essa percepção", alertou.

E acrescentou: "Quando se coloca a questão de diminuir a carga de trabalho, nomeadamente em relação à exigência no horário de trabalho de serviço de urgência, nós, ao mesmo tempo, garantimos que os médicos continuam a fazer as 24 horas de urgência por semana até ser necessário."

Pontos “​totalmente inaceitáveis”​

É com igual preocupação que a presidente da Fnam olha para a contraproposta que receberam do Ministério da Saúde. "Não é verdade, ao contrário do que tem sido propagandeado, que se estão a aproximar das propostas feitas pelos médicos", afirmou ao PÚBLICO Joana Bordalo e Sá, lamentando que o documento do ministério só lhes tenha chegado depois da meia-noite.

Quanto ao conteúdo, para a responsável, a contraproposta do Ministério da Saúde "tem pontos totalmente inaceitáveis". "Dão com uma mão para tirar com a outra", disse, considerando que em cima da mesa continua a perda de direitos e a exigência de acréscimo de mais trabalho aos médicos.

A reunião entre os sindicatos e o Governo está marcada para as 16h deste domingo, em que os dois sindicatos vão apresentar uma contraproposta conjunta ao documento enviado pelo ministério, segundo adiantou Jorge Roque da Cunha à Lusa.

Salientando que a situação que se vive no SNS "é muito grave", Joana Bordalo e Sá considerou que "já não falta muito" para o serviço público ruir. "Ainda não estamos em Novembro e já estamos a assistir ao encerramento de tantas urgências de norte a sul do país. Isto pode ter consequências muito graves para a população e é responsabilidade do Governo tentar resolver a situação de forma séria", afirmou.

No documento enviado aos sindicatos, e a que o PÚBLICO teve acesso, o ministério admitiu a possibilidade de redução faseada das horas realizadas no serviço de urgência de 18 para 12 horas semanais, mas esta alteração fica indexada à redução da realização de horas extraordinárias e do recurso a empresas de prestação de serviço médico.

Quanto ao regime das 35 horas semanais, deixou o aviso que o mesmo não pode implicar a redução de acesso aos cuidados de saúde. E, por isso, o ministério defendeu que a aplicação deste regime não pode contemplar um descanso compensatório com prejuízo do horário de trabalho semanal. Ou seja, não pode reduzir o número de horas de trabalho a fazer por semana, como acontece actualmente com as 40 horas semanais. A redução do horário semanal seria aplicada no imediato aos médicos que fazem urgência — proposta que o Ministério da Saúde já tinha apresentado aos sindicatos —, sendo alargada de forma faseada e perante algumas condições aos restantes médicos.

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