ONU revê missão no Afeganistão após funcionárias afegãs serem proibidas de trabalhar

Taliban tentam “forçar as Nações Unidas a terem de fazer uma escolha terrível entre ficarem e darem apoio ao povo afegão ou manterem a fidelidade às normas e aos princípios” que têm de garantir.

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Fatima é a única parteira de todo o distrito de Panjawai em Kandahar, mesmo nos serviços de saúde há poucas mulheres para tratar quem precisa EPA

A missão das Nações Unidas no Afeganistão começou uma revisão das suas operações no país depois de o regime taliban ter proibido as funcionárias afegãs da organização de trabalharem. Até agora, a ONU era a excepção para uma proibição de as afegãs trabalharem para todas as organizações não governamentais (excluindo nos serviços de saúde).

Os taliban comunicaram às Nações Unidas que a sua excepção, que significava, na prática, o último reduto de liberdade profissional para as mulheres do Afeganistão, acabava agora, comunicou a ONU na semana passada. Os taliban não comentaram.

Os taliban regressaram ao poder no Afeganistão em 2021, e passado um ano tinham já cortado grande parte das liberdades das mulheres, com as raparigas a não poderem estudar a partir dos 12 anos, as mulheres proibidas de trabalhar ou estudar, com limitações ao uso de espaços públicos como parques, jardins ou piscinas, sendo obrigadas ainda a cobrir-se sempre que estão na rua, e obrigadas a um “guardião” masculino se viajarem mais de 70km.

Continuam ainda a ser detidas jornalistas e activistas dos direitos das mulheres.

“Através desta proibição, a autoridade taliban tenta forçar as Nações Unidas a terem de fazer uma escolha terrível entre ficarem e darem apoio ao povo afegão ou manterem a fidelidade às normas e aos princípios que temos o dever de garantir”, declarou a missão da ONU no Afeganistão (Unama).

A ONU pediu ao seu staff – cerca de 3000 pessoas, homens e mulheres – para se manter em casa até 5 de Maio, enquanto leva a cabo as “consultas necessárias”, faz ajustes, e acelera planos de contingência.

Uma concretização da ordem, disse já a organização, iria pôr a ONU em incumprimento da sua carta.

O anúncio levou a fortes críticas internacionais. Houve ainda quem expressasse preocupações de dadores deixarem de canalizar verbas para o programa de ajuda ao Afeganistão, o maior do mundo, por um lado, e que, por outro, sem mulheres a trabalhar fosse impossível manter um programa de ajuda que funcione no país, já que por causa da segregação de género é preciso funcionárias afegãs para identificar mulheres que precisem de ajuda, e distribuí-la.

A ONU tem feito chegar assistência humanitária aos mais de 23 milhões de afegãos, num país que atravessa uma profunda crise económica e humanitária, e onde a fome não tem parado de aumentar desde que os taliban voltaram ao poder.

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