Marcelo diz que declarações feitas em Outubro acabaram por incentivar denúncias de abusos

Presidente justifica declarações polémicas e concorda com a criação de uma nova comissão que investigue casos de abusos semelhantes noutras áreas, como desporto.

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LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Em Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa tornou-se o epicentro de uma polémica ao afirmar: “Haver 400 casos não me parece que seja particularmente elevado porque noutros países com horizontes mais pequenos houve milhares de casos.” Agora, o Presidente acredita que essa sua declaração que tanta crítica levantou acabou por se tornar um incentivo à denúncia de abusos sexuais na Igreja católica.

O chefe de Estado apontou que um dos problemas que a comissão enfrentou – e que a sociedade enfrenta com uma cultura dominante de segredo, de medo, de não-denúncia, é a dificuldade de levar as próprias e os próprios a denunciar.

Marcelo espera que o facto de ter havido denúncias e de se fazer um relatório seja um estímulo para o futuro, para haver mais [denúncias], e para tornar natural uma intervenção cívica de controlo, de censura e de denúncia. Isso é um passo cultural muito importante numa sociedade muito fechada, com muito temor, com muitas limitações e com muito medo”.

O Presidente da República foi questionado sobre conclusões do relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica, que indica que uma quantidade significativa de vítimas decidiu testemunhar por considerar revoltantes notícias como as das declarações do Presidente da República em Outubro de 2022.

Face à pergunta do inquérito realizado pela comissão sobre o porquê de dar o seu testemunho, o relatório divulgado na segunda-feira refere que houve uma quantidade significativa de pessoas abusadas que decidiram fazer o seu testemunho perante notícias que, em certos momentos, incluíram declarações de diversas figuras públicas que as deixaram incrédulas, considerando-as insultuosas, revoltantes e inadmissíveis.

Em Outubro, o Presidente da República afirmou, a propósito do número de testemunhos de abusos sexuais recolhidos até à altura, que haver 400 casos não lhe parecia particularmente elevado, porque noutros países e com horizontes mais pequenos houve milhares de casos.

Estas palavras foram condenadas de imediato nas redes sociais por dirigentes e deputados da esquerda à direita, mas Marcelo Rebelo de Sousa foi defendido pelo primeiro-ministro, António Costa, que lhe manifestou solidariedade e rejeitou que tivesse de pedir desculpa.

O Presidente da República acabou, no entanto, a desculpar-se perante as vítimas se porventura [0] entenderam, uma que seja das vítimas que está ofendidae em várias ocasiões disse que a sua intenção era salientar que o número de queixas está abaixo do que estima ser a realidade de casos em Portugal.

Hoje, Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado também sobre a proposta de aumentar o prazo de prescrição dos crimes de abuso sexual e afirmou que esse é um debate que, depois do balanço feito agora por todos, a Assembleia da República ou o próprio Governo poderão desencadear.

Sobre a constituição de uma nova comissão para estudar o tema, com membros internos e externos à Igreja e que se debruce sobre outras áreas, como o desporto ou o meio escolar, Marcelo Rebelo de Sousa disse que a comissão independente alertou que na sociedade portuguesa existia, e porventura existe ainda, uma ideia de impunidade ou de não-denúncia em actividades muito variadas (desportivas, de lazer, ligadas a outras instituições), e que essa cultura cívica de facto é fundamental que seja ultrapassada. Uma comissão, como eles propõem, ligada ao Estado tem um espaço de manobra que não tem uma comissão ligada apenas a uma instituição religiosa, considerou.

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