Cheias: Isaltino Morais anuncia reforço do fundo de emergência em Oeiras

O presidente da Câmara de Oeiras anunciou um reforço da verba para ajudar comerciantes e habitantes de Oeiras atingidos pelas inundações da semana passada e desta manhã. Há mais cinco desalojados.

Algés, em Oeiras, volta a inundar. As imagens dos estragos provocados pelas cheias Sérgio B. Gomes e Joana Bourgard

O fundo de emergência de 1,5 milhões de euros criado pela Câmara de Oeiras para ajudar as vítimas das cheias da semana passada vai “aumentar, de certeza absoluta”, em função da nova vaga de inundações no concelho, sobretudo na freguesia Algés, Linda-a-Velha e Cruz Quebrada/Dafundo​, disse ao PÚBLICO o presidente daquela autarquia, Isaltino Morais, que esta manhã acompanhava os trabalhos de escoamento de água e limpeza no início da rua Major Afonso Pala, novamente uma das mais atingidas pelas cheias desta madrugada.

O fundo inicial foi dotado de uma verba proporcional aos prejuízos que a Câmara de Oeiras já tinha apurado, e que eram de 3,6 milhões de euros. Mas os estragos desta madrugada vão obrigar a autarquia a fazer outras contas. “Acho que hoje houve mais estragos do que na quinta-feira. A água subiu mais. A câmara vai ter de aumentar este fundo. Houve situações novas, como por exemplo o clube Sport Algés e Dafundo. Segundo o que percebi, toda a parte das máquinas ficou avariada. Obviamente que se o clube não tiver dinheiro, a câmara vai ajudar.”

Depois da reunião de sexta-feira entre os autarcas dos concelhos afectados pelas cheias e o Governo, Isaltino Morais afirma que não viu no Executivo “grande disponibilidade para contribuir”. “Parece-me que esta réplica vai fazer o Governo pensar”, disse ao PÚBLICO o autarca de Oeiras, referindo ainda que o seu concelho nem é dos que mais sofreram.

Mesmo que o Governo decida contribuir para os fundos de emergência criados pelas câmaras municipais, Isaltino alerta para a morosidade do processo: “Nós sabemos como é que são estas operações, são muito burocratizadas, demoram muito tempo. O fundo que a Câmara criou é para pagar logo, imediatamente. A partir de 15 de Janeiro a Câmara estará a fazer pagamentos. Com o Governo, as coisas são muito mais lentas – dá impressão que fazem as coisas para as pessoas não recorrerem a esses fundos”.

De acordo com o autarca, as cheias fizeram pelo menos quatro desalojados, que já foram realojados pela Câmara. Na ronda que o PÚBLICO fez por algumas das ruas mais afectadas (Mercado de Algés, Avenida dos Bombeiros Voluntários de Algés, Rua Major Afonso Pala, Rua Damião do Góis, Rua Luís de Camões...), e pelos testemunhos que foi recolhendo, a água subiu mais do que no final da semana passada e os estragos foram mais avultados. Isaltino Morais afirma ter acompanhado o desenrolar dos acontecimentos madrugada fora, até que, por volta das 5h00, aconteceu o pior: o transbordamento da Ribeira de Algés, junto ao largo Comandante Augusto Madureira.

As inundações das ruas a jusante foi uma questão de minutos, com o a Avenida dos Bombeiros Voluntários e as ruas circundantes do mercado a serem das mais atingidas com a força da água, que foi arrastando esplanadas, caixotes do lixo e alguns carros.

“Esta segunda vaga foi mais complicada. (…) Era um rio que vinha por aí abaixo em direcção à Baixa de Algés. Era uma coisa assustadora, uma massa de água brutal”, disse Isaltino Morais, que afirma ter ficado surpreendido pelo facto de, depois desse transbordamento, a rua Major Afonso Pala, tradicionalmente uma das mais castigadas sempre que há cheias nesta zona, já ter uma altura de água considerável. “Fiquei muito preocupado, porque àquele ritmo [de água a sair da ribeira] Algés ia ficar completamente inundada. Mas é curioso, porque quando liguei para a equipa que já estava aqui [rua Major Afonso Pala] disseram-me que isto já estava cheio. Já ando aqui há algum tempo e nunca me tinha apercebido disto – a rua Major Afonso Pala não enche por causa da ribeira de Algés, mas por causa das águas que vêm do Restelo.”

Em Algés, o autarca encontra diferenças substanciais entre o que se passou na madrugada de quinta para sexta-feira e o que se passou esta manhã, com danos materiais e de infra-estruturas mais relevantes. Na rua Damião de Góis, há várias lojas e restaurantes sem montras ou com os vidros partidos – quando se trata de uma cave, o interior é um lago de água. Na rua Sacadura Cabral, na Cruz Quebrada, um muro com cerca de oito metros ruiu e há várias estradas do concelho com deslizamentos de terra e desabamento de muros. “Entre as 3h00 e as 6h45 fui assistindo a estas chuvadas e não me recordo de ver tanta água.”

O problema das caves

Muitos dos prédios da Baixa de Algés têm uma característica que parece contra-natura com a zona que ocupam (à volta de uma ribeira e abaixo da cota de um rio próximo) e com um trágico historial de cheias. Na semana passada, uma mulher de 75 anos morreu numa cave quando, segundo Isaltino Morais, tentava salvar o marido, que tinha dificuldades de locomoção.

O PÚBLICO confrontou o presidente da Câmara de Oeiras com o problema de haver muitas lojas e habitações com licenças para esses usos. Isaltino Morais lembrou que em 1986, na sequência das cheias de 1983, a câmara, da qual já era presidente, proibiu “o comércio nas caves”. Mas o certo é que basta andar hoje pelas ruas de Algés para se perceber que as lojas em caves não desapareceram, nem tão pouco as habitações. “Não podemos dizer que haja muito comércio nas caves; há aqui algumas lojas na rua Damião de Góis; na realidade, a maior parte deles transformaram as caves em armazéns. Já são muito menos do que havia. Em relação à habitação, há de facto quem more em caves — neste caso, é sempre o mesmo problema: as pessoas que moram em caves são as mais pobres. Vamos tentar encontrar soluções para o realojamento destas famílias e determinar a proibição de habitação deste tipo.”

O presidente da Câmara de Oeiras falou ainda na dificuldade de combater este problema e alertou que não basta proibir: “Há sempre pessoas a alugar [caves]. É como a proibição de barracas, tiram-se as famílias de lá e realojam-se, mas depois vão para lá morar outros. Nas caves é um pouco a mesma coisa — tira-se uma família e depois os senhorios alugam a outra, não resistem à tentação. É necessário um controlo extraordinário. Mas estou convencido que são muito poucas as famílias que vivem em cave”.

Depois destas duas vagas de cheias em Algés, o autarca promete agora “identificar todas as caves que eventualmente estejam ocupadas para habitação”.

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