Argentina-Croácia: as equipas que abusam dos génios

Messi contra Modric nas meias-finais do Mundial. O 10 argentino ou o 10 croata, um deles vai ter a oportunidade de ser campeão do mundo, o outro vai jogar pelo terceiro lugar.

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Luka Modric é a grande figura da Croácia EPA/Friedemann Vogel

Como se lida com um génio? Há uns dias, Jorge Valdano contou numa entrevista ao Guardian uma história de César Menotti e de como ele lidava com a presença de Diego Maradona na seleccção da Argentina. Certo dia, contou Valdano, Menotti convocou os jogadores para uma reunião, todos menos Maradona, e fez-lhes uma perguntar retórica. “Quantas vezes é que vocês acham que têm de lhe passar a bola durante o jogo?”, perguntou “El Flaco”, dando a resposta logo a seguir. “Todas! Agora, podem deixar o Maradona entrar.” Pela boca de Valdano, “é bom abusar do génio”. “Ele ganha os jogos por ti.”

Nesta terça-feira (19h, RTP1), o Mundial vai ter uma meia-final entre duas selecções que abusam dos seus génios, a Argentina de Lionel Messi contra a Croácia de Luka Modric. Depois de quase uma década a jogarem um contra o outro na liga espanhola, este duelo de “10” será a despedida de um deles dos Mundiais de futebol (não será bem assim, porque ainda há o jogo do terceiro lugar) e que dará a oportunidade ao outro de ser campeão do mundo. Um título que ficaria muito bem no currículo de Messi ou de Modric, dois dos melhores e mais titulados jogadores das últimas duas décadas e que ainda estão na plena posse dos seus poderes, como se tem visto ao longo das últimas semanas.

A Argentina abusa de Messi (170 internacionalizações/95 golos) e a Croácia abusa de Modric (160/23), eles sabem disso e não se importam. Não são jogadores comparáveis, mas a sua influência é. A importância de Messi é mais visível nos golos e nas assistências – já marcou quatro e já deu dois a marcar, e tem sido ele a arrastar, mais uma vez, a Argentina no Mundial. O médio do Real Madrid ainda não marcou (a não ser no desempate por penáltis com o Brasil e foi logo o primeiro a marcar) e não assistiu, mas, vendo os jogos da Croácia, a sua importância é clara: passa tudo por ele.

“A forma como ele joga é inacreditável. Não se cansa e não desaparece quando o jogo vai a prolongamento”, diz Zlatko Dalic, seleccionador croata, sobre o seu capitão de 37 anos, que, nos cinco jogos já disputados, fez 201 passes certeiros para o último terço (quinto), 28 cruzamentos (quinto) e 39 recuperações de bola (terceiro). E Dalic vai dizendo que ainda vai precisar de Modric depois do Mundial, aconteça o que acontecer. “Este não vai ser o último torneio do Luka. Ele vai continuar a jogar pela Croácia, tenho a certeza absoluta.”

Claro que o meio-campo da Croácia não é só Modric. É Modric e os seus velhos companheiros de jornada, Brozovic e Kovacic, e é aqui que está a chave do jogo de resistência da selecção balcânica, que já jogou dois prolongamentos neste Mundial – fez o mesmo no Mundial 2018, em que foi finalista. Quando há problemas, os croatas olham para o meio, como diz Josip Juranovic, lateral-direito. “Eles são os melhores médios da história da Croácia. Quando lhes passamos a bola, é mais seguro do que meter o dinheiro no banco.”

Do lado argentino, Messi parece mais determinado que nunca em ser para esta “albiceleste” o que foi Maradona para a equipa campeão de 1986. Aos 35 anos, esta será a sua despedida de Mundiais pela sua própria admissão e, mesmo que ainda jogue mais um par de anos pelo PSG, ganhar outra vez a Ligue 1 ou uma Liga dos Campeões pelos milionários parisienses, o seu legado será definido pelo que fizer neste seu quinto Mundial. Ele já levou a Argentina a uma final, em 2014, e ficou com a consolação de ser eleito o melhor jogador do torneio, enquanto a Alemanha ficou com o título. Já se percebeu que Leo quer mais.

“Sempre foi assim, um ganhador. O mérito não é desta equipa técnica. Tem um orgulho e uma vontade enorme de jogar futebol que dá inveja”, considera Lionel Scaloni, seleccionador argentino e colega de equipa de Messi quando este se estreou em Mundiais, com 18 anos, no torneio de 2008. E Scaloni, tal como Dalic disse de Modric, também quer continuar a “abusar” do seu génio: “Vamos ver se continua, ou não. Vamos aproveitar. É o melhor para nós e para o futebol.”

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