Politécnicos dizem que nada fica em causa se também tiverem doutoramentos

Mudança está a ser debatida no Parlamento. CES alertou para risco de diluição do actual sistema binário.

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No ensino superior português coabitam dois subsistemas: o universitário e o politécnico Nelson Garrido

Contrariando os alertas deixados, nesta semana, pelo Conselho Económico e Social (CES), o órgão coordenador dos institutos politécnicos mostra-se convicto de que a outorga de doutoramentos por estas instituições e a sua mudança de nome para universidades politécnicas “contribuirá para aprofundar a natureza binária do ensino superior português e para aumentar a sua diversidade”.

Estas alterações estão a ser debatidas na especialidade na comissão parlamentar da Educação, na sequência de uma Iniciativa Legislativa dos Cidadãos que as propôs e que deu também origem a dois projectos de lei apresentados pelo BE e pelo PCP, que se ficam apenas pelos doutoramentos.

No âmbito deste debate na especialidade, a comissão parlamentar questionou uma série de entidades, entre elas o Conselho Económico e Social que, nesta semana, emitiu um parecer crítico às mudanças propostas, alertando que esta poderiam pôr em causa o sistema binário (universidades e politécnicos) e conduzir a um ensino “mais estratificado”, como sucedeu noutros países que enveredaram pelo mesmo caminho.

O relator deste parecer foi o ex-presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Fontainhas Fernandes. O CRUP tem-se oposto às mudanças agora em debate no parlamento. O parecer foi aprovado pelo plenário do CES sem votos contra e com seis abstenções. Este é um órgão onde têm assento vários membros designados pelo Governo, pelos sindicatos, organizações empresariais, autarquias e associações da sociedade civil, entre outros. Ao contrário do CRUP, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) não está representado,

Nas respostas que fez chegar ao Parlamento, nesta terça-feira, o CCISP faz notar que, sendo as mudanças propostas “tão concretas e que não afloram sequer alterações no campo da missão ou da orgânica das instituições, não se compreende o debate suscitado em torno da binariedade do sistema, da eventual diluição da matriz politécnica ou dos efeitos nefastos provocados pelas alterações propostas”.

Exemplos de fora

Lembra, a propósito, que “a outorga de programas doutorais por instituições de matriz politécnica não seria uma inovação portuguesa, podendo ver-se em países europeus que apostaram no sistema binário, como é o caso da Irlanda ou da Alemanha”. Para o CCISP, a outorga de doutoramentos vai “repor um sentido de justiça aos politécnicos na medida em que a limitação imposta é meramente subjectiva”. E sendo estes doutoramentos de cariz profissional, reafirma que esta mudança “contribuirá para potenciar uma tipologia formativa de matriz inegavelmente politécnica”, contribuindo deste modo para preservar o sistema binário existente.

O CCISP considera que as alterações, a serem aprovadas pelos deputados, responderão ao que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) recomendou em 2019, no sentido de se “rever o enquadramento legal dos politécnicos de modo a permitir-lhes a outorga criteriosa de programas doutorais nas áreas em que as instituições claramente demonstram ter capacidade para tal.”

Quanto à alteração da designação para universidades politécnicas, volta a frisar que não será “uma inovação portuguesa, mas acompanha a tendência europeia e poderá ajudar os politécnicos a obter mais estudantes, mais financiamento e mais projectos”.

No seu parecer, o CES percorre o caminho oposto, lembrando que “as instituições do subsistema considerado de nível inferior quer na Austrália, quer no Reino Unido, conseguiram obter um estatuto formal idêntico ao das Universidades apenas para, ao fim de pouco tempo, se encontrarem numa situação de menor prestígio do que anteriormente, com a desvantagem de terem perdido muitas das características que faziam a diferença dentro do sistema, sem vantagem global em termos de aumento de qualidade.”

Em declarações ao PÚBLICO no final de Outubro, o secretário de Estado do Ensino Superior, Pedro Teixeira, também alertou que as mudanças em discussão no parlamento podem pôr em causa o sistema binário actualmente existente e abrir a porta a uma reorganização do sector que passe por fusões entre instituições.

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