Juiz Carlos Alexandre ilibado de abuso de poder na Operação Marquês

Queixa tinha sido apresentada por José Sócrates, que acusava também magistrado de denegação de justiça e de conluio com uma funcionária judicial para ficar com processos mais mediáticos. Advogado do ex-primeiro-ministro equaciona recorrer da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa.

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Juiz Carlos Alexandre foi ilibado Sergio Azenha

O juiz Carlos Alexandre foi ilibado das suspeitas de abuso de poder que recaíam sobre ele no caso da distribuição manual do inquérito da Operação Marquês. Na sequência da abertura de instrução neste processo, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu esta sexta-feira que nem Carlos Alexandre nem a funcionária judicial com quem trabalhava vão a julgamento.

Em causa estava a forma como o “superjuiz”, que teve o processo em mãos na fase de investigação, continuou com ele em Setembro de 2014, altura em que entrou em vigor a nova organização dos tribunais. Embora isso não fosse de todo impossível suceder, segundo uma queixa do ex-primeiro-ministro José Sócrates, principal arguido da Operação Marquês, Carlos Alexandre ter-se-ia conluiado com a funcionária judicial para que o caso não lhe saísse das mãos nem fosse entregue a um colega seu. Além de abuso de poder, estavam ainda em causa os crimes de denegação de justiça e falsificação praticada por funcionário. Perante a decisão de ilibar o magistrado, o advogado do ex-primeiro-ministro já anunciou que equaciona recorrer dela, por a considerar “corporativa”.

Para o desembargador que ilibou esta sexta-feira Carlos Alexandre, Jorge Antunes, não há quaisquer indícios de que Carlos Alexandre se tenha conluiado com a funcionária que trabalhava com ele no Tribunal Central de Instrução Criminal para continuar a dar ordens na fase de inquérito da Operação Marquês. Não existem nem provas directas nem indirectas de qualquer tipo de actuação criminosa do magistrado e da escrivã. “Pelo contrário”, assinalou, numa referência aos esforços feitos pela oficial de justiça pra que os serviços informáticos resolvessem o problema que fazia com que, desde 1 de Setembro de 2014, o sistema entregasse todos os processos que ali chegavam a Carlos Alexandre, por não ter assumido a entrada ao serviço de um segundo juiz de instrução, João Bártolo.

A distribuição manual do processo a Carlos Alexandre, sem sorteio, pode também ser explicada pelo chamado “apagão” do Citius, a plataforma informática através da qual são tramitados os processos judiciais de primeira instância - e que crashou em Setembro de 2014, para só voltar a funcionar em pleno no final desse ano. Como os serviços informáticos do Ministério da Justiça só resolveram o problema do Tribunal Central de Instrução Criminal na primeira semana de Novembro, neste interregno de cerca de dois meses a solução passou fazer manualmente a distribuição, para que os processos sem juiz atribuído não se acumulassem. E, segundo os vários testemunhos prestados em tribunal, foi sendo feita de forma alternada entre os dois magistrados, conforme iam chegando.

O Ministério Público também tinha defendido que o juiz não havia cometido crime nenhum. Mas o advogado de José Sócrates, Pedro Delille, acusou Carlos Alexandre de fazer batota no sorteio não só deste mas também de outros processos mediáticos. “Foi por causa deles que passou a ter existência na justiça portuguesa”, justificou. Nesta versão dos factos, o “superjuiz” teria tido como motivações não apenas o “gosto em exibir poder” como também a “devassa da vida privada e profissional” do ex-primeiro-ministro, que mandou deter pouco tempo depois, a 22 de Novembro de 2014.

Durante a leitura da decisão de não pronúncia dos arguidos, o desembargador Jorge Antunes qualificou estas imputações como sendo “de extrema gravidade”, uma vez que implicam a violação do chamado princípio do juiz natural, que garante que a entrega dos casos aos magistrados é feita de forma aleatória. E acrescentou que as acusações em causa são desmentidas pelos documentos que constam do processo relativamente à distribuição deste e de outros processos no Tribunal Central de Instrução Criminal naquela altura. Já na versão dos factos apresentada pelos arguidos, “pelo contrário, o tribunal não detectou contradições e incoerências”, tendo-a considerado verídica.

Para a representante legal de Carlos Alexandre, Fátima Esteves, a queixa do ex-primeiro-ministro contra o magistrado só se justifica pelo seu “ódio de estimação a um juiz que teve a ousadia de o mandar prender”.

A distribuição da Operação Marquês já antes tinha sido investigada pelo Conselho Superior da Magistratura duas vezes, uma das quais a pedido de outro colega de Carlos Alexandre, o juiz de instrução Ivo Rosa, sem que tivesse sido encontrado algum indício de responsabilidade disciplinar do “superjuiz”.

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