O serviço público das PPP na saúde

A questão que se coloca é a seguinte: se os hospitais PPP eram bons para as pessoas e eram favoráveis para o Estado, em nome de quê se promoveu esta guerra intensa que levou ao fim das PPP?

O Tribunal de Contas acaba de publicar um relatório sobre as Parcerias Público-Privadas hospitalares no SNS e as suas conclusões são cristalinas, para não dizer demolidoras. Alguns exemplos:

  • “As PPP hospitalares geraram poupanças para o Estado”;
  • “As PPP hospitalares foram genericamente mais eficientes do que a média dos hospitais de gestão pública comparáveis e estiveram alinhadas com o desempenho médio do seu grupo de referência quanto aos indicadores de qualidade, eficácia e acesso”;
  • “Os utentes dos hospitais geridos em PPP estão protegidos por padrões de qualidade mais exigentes do que os aplicados na monitorização dos hospitais de gestão pública”;
  • A poupança estimada pela UTAP, nos períodos de execução analisados, foi de € 203,3M, face ao cenário de internalização da produção em unidades hospitalares de gestão pública comparáveis. A consideração do período total de execução dos contratos tenderá a produzir valores superiores para a poupança estimada do Estado”;
  • “Tendo em conta o Value for Money apurado pela UTAP, os estudos foram favoráveis à continuidade de todas as PPP na vertente da gestão clínica.”

Face a este desempenho e os termos em que os hospitais PPP foram geridos, não há dúvida que os bons exemplos devem ser replicados e por isso o Tribunal de Contas recomenda:

  • A aplicação e a monitorização dos indicadores de desempenho de resultados previstos nos contratos de PPP a todos os hospitais do SNS;
  • A generalização da aplicação e monitorização dos inquéritos de satisfação dos utentes e dos profissionais e dos sistemas de gestão da qualidade, previstos nos contratos de PPP, a todos os hospitais do SNS.

Pelos vistos, não deveriam ser os hospitais em PPP a mudar. Tal como tinha já identificado o Conselho de Finanças Públicas, a contratualização dentro do SNS é essencialmente administrativa e não tem em conta os resultados nem os custos. O Tribunal de Contas também alerta que a “sustentação das decisões em análises custo-benefício garante a melhor aplicação dos dinheiros públicos para a satisfação de necessidades coletivas”.

Perdoem-me por tantas citações mas, de facto, quase não é necessário acrescentar nenhum comentário ao que está no relatório final.

A questão que se coloca é a seguinte: se os hospitais PPP eram bons para as pessoas (confirmado pelos inquéritos, pelo Tribunal de Contas e pelos autarcas) e eram favoráveis para o Estado (poupando dezenas de milhões de euros por ano), em nome de quê se promoveu esta guerra intensa que levou ao fim das PPP?

Nunca me atrevi a afirmar que a gestão privada dos hospitais era superior à dos gestores públicos, até porque conheço excelentes exemplos de vários hospitais do SNS, mas este relatório do Tribunal de Contas confirma que a gestão privada pode dar um excelente contributo para o SNS, seja pelas poupanças diretas que consegue, seja pelo patamar de referência que pode representar. Os privados podem desempenhar um papel relevante na sustentabilidade do SNS.

Perdeu-se demasiado tempo com suspeições sobre os privados que em nada contribuíram para o reforço da capacidade do nosso sistema de saúde. Não espanta, por isso, que alguns operadores privados tenham vindo humildemente a reconhecer que com as novas condições apresentadas é impossível continuar a contratualizar com o Estado, como aconteceu recentemente com Cascais.

Entretanto, temos cada vez mais portugueses a recorrer à componente especificamente privada do sistema e este torna-se cada vez mais dual.

Face a este relatório do Tribunal de Contas, terá chegado o momento de reconhecer os erros e todos defendermos soluções que constituam poupança para o Estado e garantia de qualidade para o utente? 

Nota final: os ministérios das Finanças e da Saúde não exerceram o direito ao contraditório, pelo que se assume que a análise e as conclusões do Tribunal de Contas são incontestáveis. Tirem-se então as devidas consequências

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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