O novo coronavírus também infecta células tumorais?

Equipa de investigadores do Porto vai estudar se os tecidos tumorais têm na sua superfície o receptor que permite ao vírus entrar nessas células.

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O novo coronavírus NIAID

Investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) vão estudar tecidos tumorais de doentes com covid-19 que foram operados durante o surto pandémico, para perceber se o novo coronavírus infecta as células tumorais e muda o seu comportamento.

Em declarações à agência Lusa, Fernando Schmitt, investigador do i3S, no Porto, afirmou esta terça-feira que o projecto visa estudar a presença, em tecidos tumorais, do vírus e do receptor ACE, existente na membrana celular e através do qual o SARS-CoV-2 infecta as células humanas.

“O ACE já foi descrito no passado como positivo em diferentes tipos de cancro. Portanto, a nossa curiosidade é: se alguns tipos de cancro têm o receptor, será que o vírus pode entrar na célula tumoral ou ligar-se a uma célula tumoral como se liga à célula normal?”, explicou o investigador.

O projecto, desenvolvido no âmbito de uma linha de financiamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), a Research 4 Covid-19, vai também estudar algumas glicoproteínas como a furina, que “interferem na capacidade de ligação entre o vírus e o receptor”.

Com o objectivo de saber se há vírus ou não há vírus nas células tumorais, os dez investigadores que integram o projecto vão estudar os tecidos tumorais de doentes com covid-19 que, durante o surto pandémico, tiveram de ser sujeitos a intervenções de emergência no Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto.

Posteriormente, vão comparar os dados recolhidos com os tecidos tumorais de doentes de controlo do estudo, ou seja, que não foram infectados pelo novo coronavírus e que durante o surto pandémico da covid-19 em Portugal não tiveram de sofrer uma intervenção de emergência.

Além de quererem saber se o vírus entra nas células tumorais, os investigadores pretendem também perceber se provoca modificações, ou seja, se as células “invadem mais, proliferam mais ou até morrem mais”.

“Sabemos que alguns vírus têm sido utilizados até como tratamento, uma vez que podem entrar, infectar e matar a célula. Por exemplo, já foi descrito que o vírus Zika, em células em cultura de tumores do sistema nervoso central, é capaz de infectar essas células e modificar o seu comportamento”, exemplificou Fernando Schmitt.

O investigador adiantou que nos próximos seis meses este projecto (denominado “Impact of covid-19 on the treatment of cancer patients”) pode levantar uma “série de questões” e dar resposta a “tantas outras” na área da oncologia.

“Hoje há uma grande questão na oncologia que é: será que estes doentes podem ser tratados ou não? Devem ser tratados ou não? Podem fazer quimioterapia ou não? Tudo isto pode dar algumas respostas a essas questões”, referiu, adiantando que os resultados podem mesmo levar a um projecto de maior. “Se tivermos algumas pistas, temos substrato para fazer um projecto de maior dimensão”, assegurou.

Financiado em 38.600 euros, este é um dos 55 projectos apoiado pela 2.ª edição da linha Reserach 4 Covid-19, que visa responder às necessidades do Serviço Nacional de Saúde e que na sua 1.ª edição apoiou 66 projectos. Além do i3S, o projecto integra também investigadores do Centro Hospitalar Universitário de São João, da Universidade de São Paulo (no Brasil) e da Universidade de Trakya (na Turquia).

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