Não perca tempo com os cognacs VSOP: poupe dinheiro e ganhe sabor com os VS ou esbanje-o com os XO

As coisas muito velhas - não são só as aguardentes - são caras por serem raras mas são raras porque foram concebidas para escassear, isto é, para ficarem caras. Ah pois.

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Reuters

Em 2018 o cognac XO passou a ter de ser envelhecido dez anos. Antes de 2018, o sistema era muito fácil: o cognac VS tinha de ter dois anos, o VSOP tinha de ter quatro e o XO seis anos. Se dantes era dois, quatro, seis anos, agora é dois, quatro, dez. É uma mudança muito grande mas precisa de ser esmiuçada.

Os envelhecimentos mínimos não são observados pelas maiores casas: Martell, Hennessy, Remy Martin e Courvoisier. Usam aguardentes mais velhas misturadas com mais jovens para chegar ao estilo a que estamos habituados.

A mudança histórica dos seis para os dez anos para os cognacs XO ajudou a criar uma situação caricata: actualmente, os cognacs jovens VS (custando cerca de 25 euros) são preferíveis aos mais velhos VSOP (cerca de 50 euros) porque as melhores aguardentes estão a ser guardadas para os XO (mais de 100 euros).

Repare-se que só uma pessoa que não percebe nada de aguardentes precisa de pedir automaticamente XO para não fazer má figura. Paga pela ignorância. Acontece o mesmo com os fumadores de charutos que escolhem aguardentes feitas para quem os fuma: serão mais agressivos precisamente para fazer frente aos gostos do tabaco.

Nos cognacs, como nos whiskies ou nos runs, a velhice tem a ver com a madeira. Em Cognac as aguardentes mais velhas, para não continuarem a ser influenciadas pela madeira, são transpostas para garrafões de vidro. Este facto é importantíssimo. Mostra que a madeira e o oxigénio - mesmo tratando-se de madeiras muito gastas e quase inertes - exercem uma influência indesejável a partir de certos limites.

É de propósito que não estou a falar de anos precisos. Tudo tem de ser provado e acompanhado - a élevage é uma arte sem a qual não existiriam as melhores qualidades do cognac.

Não foi fácil comprar uma garrafa do Rémy Martin VS Petite Champagne (chama-se Grand Cru e era produzido em pequenas quantidades) mas, apesar de a rolha se desfazer (um problema com as garrafas menos jovens de cognac), pude fazer uma prova comparativa.

Os VS da Hennessy, da Martell, da Courvoisier e da Rémy Martin são todos deliciosos. Os dois primeiros são mais frutados e leves, os dois últimos mais amadeirados e profundos. São todos muito diferentes uns dos outros, inconfundíveis e obedientes ao estilo.

O meu cognac preferido é o da Martell, que tem um estilo seco e vinhateiro. O actual VS que é o "Single Distillery" (por ser todo proveniente da mesma destilaria) é muito diferente do antigo VS, que agora é quase impossível de encontrar.

Quando se passa para os VSOP começa a desilusão. São aguardentes muito bem mescladas mas afinadas segundo um critério de suavidade e de ausência de calor alcóolico. Têm um sabor excessivo a madeira, faltando-lhes vivacidade, fruta e distinção.

O Martell VSOP é monótono, amadeirado e esquecível: mais vale comprar duas garrafas do VS. É o que aconselho com a Hennessy, a Rémy Martin e a Courvoisier. Com duas ressalvas: o VSOP da Courvoisier, sendo de longe o VSOP mais barato, é o mais saboroso e a Hennessey Fine, feita para beber com água e gelo (custa 50 euros) é melhor ainda do que a VS (que custa 30).

Há dois cognacs VSOP que valem mesmo a pena: o Camus VSOP e o VSOP de Claude Thorin. Hei-de escrever noutra altura sobre as casas pequenas de Cognac mas, para já, o que importa reter é que os VS, apesar de puros, tendem a ser jovens de mais e logo muito ardentes. Falando grosso modo, os VSOP das casas independentes correspondem aos VS das casas grandes.

Parece-me que os actuais VSOP foram sacrificados para beneficiar os XO, que agora têm de ter um mínimo de 10 anos. As margens de lucro são maiores com a maior idade mas o consumidor tem de se precaver: o preço nunca foi um bom critério de escolha.

As coisas muito velhas - não são só as aguardentes - são caras por serem raras mas são raras porque foram concebidas para escassear, isto é, para ficarem caras. Ah pois.

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