As nossas escolhas alimentares: as acções são o nosso futuro

Cada ida ao supermercado, cada item que retiramos da prateleira e cada garfada podem ser momentos de reflexão. Porque aquilo que comemos não apenas nos define, como também define o futuro do planeta e daqueles que nos rodeiam.

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Natalie Rhea Riggs/Unsplash

Esta terça-feira, 16 de Outubro, celebrámos o Dia Mundial da Alimentação com o mote “As nossas acções são o nosso futuro”. O dia passou, tão rápido quanto os anteriores ou os que se lhe seguirão, e talvez não lhe tenhamos feito muito caso, pois a alimentação é para a maioria de nós uma mera rotina incorporada nas nossas vidas, que não incita muita reflexão.

Podemos, no entanto, tornamo-nos mais conscientes da nossa alimentação, não só da forma como nos afecta, mas também como afecta os outros. Podemos não só ser críticos de comida, mas também da forma como nos alimentamos. Podemos ser filósofos do garfo.

Cada ida ao supermercado, cada item que retiramos da prateleira e cada garfada podem ser momentos de reflexão. Porque aquilo que comemos não apenas nos define, como também define o futuro do planeta e daqueles que nos rodeiam.

E o que significa fazer uma alimentação pensada? Fomos habituados a pensar que a única forma de combater a escassez de alimentos no mundo é doando comida aos outros, seja a instituições ou bancos alimentares, que depois a distribuem por quem dela necessita. Sem dúvida que estas iniciativa são importantes e indispensáveis, mas podemos ir além disso e pensar também nas nossas próprias escolhas de alimentação.

Estas escolhas estão directamente ligadas ao problema da distribuição de alimentos no mundo. Se optarmos por determinado alimento, como é o caso de uma embalagem de carne de vaca ou de galinha, estamos a influenciar a procura por estes produtos, e esta procura ciclicamente perpetua o problema da escassez de alimentos em vários países do mundo. Estas pequenas decisões produzem efeitos de larga escala, influenciando não só os preços da comida e a sua disponibilidade, mas também as políticas de produção e distribuição dos alimentos, inclusive em países subdesenvolvidos.

Consideremos o facto da produção de animais para consumo humano ocupar cerca de um terço de toda a terra arável no planeta e muita desta terra se situar em países subdesenvolvidos, onde cerca de 65% do terreno arável é usado para produzir cereais para alimentar gado, que em muitos casos é exportado para países desenvolvidos, para ser consumido pelos europeus. E consideremos que a produção de animais para consumo humano utiliza actualmente 40% de toda a produção de cereais no mundo, alimento esse que poderia ser usado directamente na alimentação humana, pondo fim à miséria e fome. E vejamos o caso da Etiópia, um dos maiores produtores e exportadores de gado para consumo humano no continente de África, onde cerca de oito milhões de pessoas enfrentam escassez de alimento actualmente.

Durante o período da Segunda Guerra Mundial, as pessoas na Europa, inclusive em Portugal, tinham frequentemente que racionar a comida para terem alimento disponível. Logo após este período de crise mundial foi feito um investimento massivo e irreflectido na produção agroindustrial de animais para alimento, com elevados incentivos governamentais, levando a que se estabelecesse um sistema de produção alimentar insustentável, em que uma grande percentagem dos nossos recursos alimentares produzidos pelas plantas são utilizados para alimentar gado, num processo de conversão energética altamente ineficiente; basta reflectirmos sobre o facto dos animais que alimentamos excretarem uma parte considerável da energia que consomem, ou a utilizarem na sua locomoção e outra actividade biológica.

Se, portanto, as nossas acções definem o nosso futuro e o das gerações seguintes, temos que começar já por pensar naquilo que colocamos também no nosso prato. É fundamental desconstruirmos a ideia de que as nossas escolhas alimentares são feitas num vácuo e nos afectam apenas a nós.

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