Supremo diz que lei do aborto é “incompatível” com direitos humanos

Juízes consideraram que não poderiam obrigar a mudar a lei sem uma queixosa e passaram a bola aos políticos. Mas há já uma voluntária para fazer uma queixa em nome pessoal.

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Reuters/CATHAL MCNAUGHTON

Cresce a pressão para que seja mudada a legislação restritiva sobre o aborto na Irlanda do Norte, depois de o Supremo Tribunal britânico ter concluído que partes da lei em vigor são incompatíveis com a Convenção Europeia sobre os Direitos Humanos – a que proíbe a interrupção voluntária da gravidez em caso de violência sexual sobre a mãe ou anomalia do feto que seja fatal.

No entanto, numa votação de quatro para três, os juízes decidiram que não tinham jurisdição para apreciar a contestação à lei como um todo, apresentada pela Comissão dos Direitos Humanos da Irlanda do Norte. Faltava uma potencial vítima como queixosa – uma mulher grávida que quisesse abortar e não pudesse, por exemplo.

Conhecida a decisão dos juízes, há já uma voluntária para o fazer: Sarah Ewart, que é apoiada pela Amnistia Internacional. Esta moradora de Belfast teve de ir a Londres abortar depois de os médicos na Irlanda do Norte lhe dizerem que o seu bebé não iria sobreviver, explica o Irish Times.

O vice-presidente do Supremo Tribunal, lorde Mance, disse ao Belfast Telegraph que a lei actual “precisa claramente de uma consideração radical”.

À BBC, lorde Kerr, juiz do Supremo, disse que “o Tribunal expressou a visão clara de que a lei da Irlanda do Norte sobre o aborto é incompatível com o artigo 8.º da Convenção [Europeia sobre os Direitos Humanos] em relação a casos de anomalias fetais e, por maioria de quatro para três, que é também incompatível com esse artigo em caso de violação ou incesto”.

A Comissão para os Direitos Humanos da Irlanda do Norte defende que a actual lei criminaliza mulheres e jovens “excepcionalmente vulneráveis”, sujeitando-as a tratamentos “sub-humanos e degradantes”, que lhes causam sofrimento “físico e psicológico”.

 O recurso foi iniciado em Outubro do ano passado, num processo que se arrasta desde 2015 nas barras dos tribunais norte-irlandeses. Nesse ano, o Tribunal de Belfast determinou que a lei violava os direitos humanos, mas o Departamento de Estado e o procurador-geral desafiaram a decisão judicial. O caso foi então levado ao Supremo Tribunal.

As leis britânicas sobre o aborto, que datam de 1967, não se aplicam ao território da Irlanda do Norte – que proíbe o aborto a menos que a vida de uma mulher esteja em risco, ou se houver perigo sério e permanente à sua saúde mental e física. As mulheres que se submeterem a um aborto por outras razões que não essas podem enfrentar prisão perpétua. O tema da descriminalização do aborto tem sido alvo de discussão constante na sociedade da Irlanda do Norte, mas tem sido chumbada sucessivamente. A última vez foi em Fevereiro de 2016, pela Assembleia Legislativa. 

O Reino Unido tem resistido aos pedidos para legislar sobre o assunto, protegendo-se: defende que qualquer decisão sobre o aborto tem de vir dos políticos eleitos na Irlanda do Norte. A vizinha Irlanda votou a favor da despenalização do aborto em Maio deste ano, num "referendo histórico".

Karen Bradley, disse gostava que a lei fosse alterada, mas que depende da vontade da população.

A Irlanda do Norte está sem executivo desde que o partido nacionalista Sinn Féin se afastou de uma possível coligação com o seu rival, o Partido Democrático Unionista.

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