Trump, estás a causar mau ambiente

O novo “líder do mundo livre” acha que o aquecimento global é uma invenção chinesa para enfraquecer a economia americana. Este cepticismo é preocupante porque põe em causa a procura de soluções para um dos maiores problemas globais actuais

Foto
Siphiwe Sibeko1/Reuters

Nem todos os dias se faz história mas hoje, dia 9 de Novembro de 2016, acordámos com o estrondo da notícia da eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos da América. Numa economia global de vasos comunicantes começa-se agora a discutir que consequências terá esta eleição para todos os habitantes da aldeia global. Ao mesmo tempo, a maioria dos líderes mundiais está reunida na 22.ª Conferência das Partes das Nações Unidas, em Marrocos, à procura de soluções concertadas para o problema das alterações climáticas. Infelizmente, o novo “líder do mundo livre” acha que o aquecimento global é uma invenção chinesa com o objectivo de obrigar os americanos a usar menos combustíveis fósseis, enfraquecendo assim a sua economia. Este cepticismo é preocupante porque põe em causa irremediavelmente a procura de soluções para um dos maiores problemas globais actuais.

O aquecimento global provocado pela Humanidade é uma evidência suportada pela comunidade científica, não restando margem para teorias da conspiração e cepticismo. As consequências são terríveis, o nível do mar sobe, o clima torna-se mais imprevisível, há mais e mais fortes acontecimentos extremos (tempestades, cheias, secas), a água do mar torna-se mais ácida, entre muitos outros. As alterações climáticas são actualmente o único assunto preocupante o suficiente para sentar os povos do mundo na mesma mesa de negociações, independentemente de ideologias, credos e raças. O problema é global e a solução também terá de ser.

Os Estados Unidos têm sido uma peça central do puzzle das alterações climáticas. Em 1998, e apesar de Bill Clinton ter assinado o protocolo de Quioto, o senado americano chumbou a ratificação do tratado, não tendo o país ficado vinculado a uma redução de emissões de gases com efeito de estufa. Esta situação caricata foi finalmente revertida em Setembro deste ano, quando Obama se comprometeu formalmente com os objectivos globais de combate às alterações climáticas, ratificando o que ficou decidido no Acordo de Paris. Agora abre-se um novo capítulo, há um acordo internacional assinado mas o novo presidente nem sequer acredita nas evidências que lhe deram origem.

Ainda é cedo para prever o que vai acontecer e com a volatilidade característica de Trump as verdades absolutas da campanha podem ser facilmente esquecidas entretanto. A única constatação que é seguro fazer é que dificilmente o futuro será brilhante. Sejamos sinceros, a probabilidade de evitar acidentes com um cego ao volante não é grande coisa. O impacto mais lógico é o Acordo de Paris ser rasgado pelos EUA, o que pode também levar a um efeito de contágio a outros países. Fica ainda em risco, o que é muito grave, a investigação científica sobre alterações climáticas feita com fundos federais americanos, com consequências negativas para a ciência de todo o mundo que utiliza, por exemplo, dados gerados por satélites estadunidenses e informações cedidas por instituições como a NASA. Além de tudo isto, Trump vai ter sobre ele os olhos do mundo e todas as alarvidades ditas sobre alterações climáticas vão ter eco e ajudar a moldar opiniões.

Custa-me bastante ser pessimista mas este "plot twist" imediatamente após o compromisso assumido por Obama deixa-me triste. Resta aos americanos informados, aos demais povos, aos cidadãos do mundo, à comunidade científica e aos líderes mundiais sensatos verem este retrocesso como mais um desafio a superar e não como uma batalha perdida. A qualidade de vida dos nossos filhos e netos nunca dependeu tanto das nossas acções como agora.

Sugerir correcção
Comentar