A importância de ter rotinas

Ter uma rotina é aceitar restringir as nossas escolhas em determinadas áreas para podermos aplicar o nosso poder decisório noutras

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Felix_Hu/Pixabay

- Olá, é o habitual.

São as palavras que me saem da boca, quase involuntariamente, quando vou ao café. O pedido e o sítio onde ele é feito tornaram-se uma constante na minha vida, uma rotina, e tenho noção disso. Mas é uma rotina que me ajuda a encontrar um ponto de referência, cardeal, ao final de mais um dia de trabalho.

A rotina é normalmente associada à estagnação, à resignação e ao cinzentismo dos dias vividos em modo "copy-paste". E, como tal, ganhou má fama. Ficamos apreensivos só de ouvir a palavra: rotina. Mas não tem de ser necessariamente assim. Na verdade, a rotina pode desempenhar um papel importante e positivo nas nossas vidas.

No fundo, ter uma rotina é aceitar restringir as nossas escolhas em determinadas áreas para podermos aplicar o nosso poder decisório noutras. A nossa capacidade de fazer escolhas é um manancial diário limitado (é cansativo estar constantemente a escolher entre tudo e mais alguma coisa) e, como tal, mais vale aplicá-lo em decisões que realmente importam.

É, talvez, a necessidade de erguer uma estrutura para depois a subverter, criando associações antes consideradas impossíveis. Vidas de outro modo implausíveis que agora se encontram livres de se materializar. Como uma torre que fura as nuvens por breves instantes, até ruir sobre o peso de si mesma. Só podemos inovar sobre a cinza do passado.

Aí reside o valor da rotina, na criação de uma ordem no caos, na escolha de uma acção a realizar entre a miríade de todas as acções possíveis, de afastar o nevoeiro da entropia quotidiana o tempo suficiente para vislumbrarmos o Sol e saber em que direcção estamos afinal a caminhar.

Por outro lado, demasiada rotina impede-nos de explorar o novo, o potencial criativo do desconhecido e inibe o crescimento pessoal. Por isso é bom ter uma rotina à qual podemos fugir, sair e respirar ar fresco outra vez.

A novidade não pode existir sem a rotina e vice-versa. E talvez o propósito da rotina seja a sua própria extinção, para dar lugar ao novo e àquilo que Francesco Alberoni chama de “estado nascente”, um estado de espírito onde se juntam todas as possibilidades e todos os futuros possíveis. Só podemos dizer não à rotina se tivermos uma.

- Olá, é o habitual.

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