O mantra das “soft skills”
Grosso modo, o estudante português gosta cada vez menos de pensar. Ensinam-no a meter-se em tudo e mais alguma coisa, ensinam-no a fazer um currículo bonito no Word, e até lhe dão conferências de "Responsabilidade Social da Empresa", mas esquecem de lhe ensinar Lógica
Engraçado que quando olho para grande parte dos estudantes portugueses do ensino superior, tenho aquela sensação de sucessivo “copy-paste” de que foi tudo doutrinado com os mesmos “faits divers”, com as mesmas cláusulas “ultra-obrigatórias” para se ser um “trabalhador arco-íris”. Nada contra. Sou Liberal e não gosto de tentar proibir (quase) nada, mas isto é caricato — políticas à parte.
As faculdades, vítimas do “mainstream thinking”, são produtoras de engenheiros/doutores com poucos ou nenhuns traços de diferenciação. Algo que lembra uma linha de produção mecanizada: a pessoa entra, é aconselhada a fazer voluntariado — não que goste de ajudar o próximo, mas porque "fica bem aos olhos do empregador" (quando se calhar nem a louça ajuda a levantar no final das refeições em casa). É encorajada a entrar em "startup projects" (que formam excelentes gestores que serão óptimos a gerir empresas com os fundos da União Europeia), é empurrada, sem critério, para uma das várias três mil e quinhentas organizações de competências transversais — ou "soft skills" — que florescem por estas faculdades fora. É-lhe incutido que o "ex libris" do percurso do estudante é ganhar o concurso X para trabalhar em Agosto ao balcão no BES, sem remuneração ou subsídio de alimentação — porque não esteve sequer para se incomodar a procurar melhor (que ainda existe). Isto, quando nem talvez o nome do Ministro da Economia, ou do líder da oposição, sabe.
Calma: há sempre quem extraia o melhor dessas organizações, e reconheço que existem “Júnior Empresas” (e afins) a ensinar qualquer coisa. Mas, grosso modo, o estudante português gosta cada vez menos de pensar! Ensinam-no a meter-se em tudo e mais alguma coisa, ensinam-no a fazer um currículo bonito no Word, e até lhe dão conferências de "Responsabilidade Social da Empresa", mas esquecem de lhe ensinar Lógica...
Não há mentalidade para melhorar a pessoa. Já ninguém quer fazer profissionais únicos e vencedores, pela diferença das suas características pessoais. Está instaurada a ideia de que, acabando um curso de três anos com média de 13 valores, e andando nuns grupos de “soft skills”, seremos os grandes “chefões” das nossas aldeias, auferindo salários chorudos. Má notícia: o mundo dos "adultos" não funciona assim. Infelizmente, aquele que segue a visão instaurada, nunca pensou "ok, deixa-me lá tentar ganhar uns euros com o pouco que já sei, e começar a ver como funciona isto do mercado".
Salvam-se os professores universitários (e os funcionários ligados à empregabilidade) que ainda reconhecem e recomendam o verdadeiro caminho para o sucesso: estudar e estudar (algo associado, inevitavelmente, à luta pela média), busca de conhecimento extralectivo sobre os temas leccionados e correlacionados, “networking”, e, sobretudo, boas relações com os profissionais que um dia nos poderão empregar. Tenho a felicidade de ainda poder trabalhar com várias pessoas assim, lúcidas e resistentes, num Portugal de plástico e de engodo.