Pobre Seguro

Ninguém acredita que Seguro seja capaz de mobilizar a sociedade portuguesa em torno de uma alternativa política credível que seja capaz de chegar a uma maioria absoluta (ou perto disso) nas próximas eleições legislativas.

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António José Seguro/Flickr

Nos sistemas democráticos do ocidente, modernos e mediáticos, o carisma dos políticos é crucial. Não estou aqui a dizer que o carisma seja sinónimo de competência ou de honestidade. Nem sequer estou a regozijar-me com tal facto. Estou apenas a constatar uma realidade: os políticos que têm menos carisma do que os seus opositores não conseguem vencer eleições.

Basta olharmos para a história da nossa democracia, e para os políticos que têm sido eleitos, para que a afirmação que faço seja facilmente corroborada. E mais, a força do carisma é tal que vemos que os políticos mais carismáticos são aqueles que conseguiram maiores vitórias eleitorais. E note-se, o conceito de carisma é subjectivo. Por isso, se pensarmos em Portugal, estamos a falar de carisma “à lusitana”, que pode ser bem diferente do carisma noutras paragens (Cavaco Silva é um bom exemplo de um político que conseguiu ser carismático em Portugal, porque muitos se identificaram com ele, mas que teria muitas dificuldades em ser carismático noutras culturas).

Assim, não é de espantar que António José Seguro esteja a ser contestado na sua liderança, por alguém que tem muito mais carisma do que ele, António Costa.

Os membros da direcção do PS, os “aparelhistas” ou até os “irmãos sem carisma” de Seguro (Francisco Assis e Eurico Brilhante Dias) bem podem invocar os estatutos, alegar conceitos de democracia formal, acenar com as vitórias eleitorais nas autárquicas e nas europeias ou arguir com a injustiça de não deixar Seguro chegar ao fim da meta (as legislativas), ele que assumiu a liderança do PS no momento mais difícil, pós queda de José Sócrates. Nada disso muda a realidade: António Costa tem muito mais poder carismático do que Seguro e, por isso, muito mais peso político.

Ninguém acredita que Seguro seja capaz de mobilizar a sociedade portuguesa em torno de uma alternativa política credível que seja capaz de chegar a uma maioria absoluta (ou perto disso) nas próximas eleições legislativas. E aí entra em jogo a inexorável força da democracia: porque os partidos mais representativos precisam do exercício do poder para sobreviver, as mudanças acontecem sempre na direcção que conduzir a esse fim.

Não sei quanto tempo irá durar o braço-de-ferro entre Costa e Seguro. Nem quanto tempo o aparelho do PS (conivente com Seguro) irá tentar travar a investida de Costa. Mas de uma coisa estou convicto: mais cedo (em congresso extraordinário) ou mais tarde (depois de ter um resultado decepcionante nas legislativas), Seguro cairá.

Os partidos políticos com vocação governativa têm que ceder aos interesses do povo e não aos interesses do partido. Aliás, essa é uma das grandes virtudes da democracia. Por mais defeitos que lhe encontremos, o facto de haver eleições força os partidos a mudarem na direcção da vontade popular maioritária (algo que não acontece nas ditaduras).

António Costa já deu provas, em Lisboa, que tem carisma e poder eleitoral. As esmagadoras vitórias que obteve na câmara lisboeta são uma prova de que consegue aglomerar atrás de si vontades alargadas, inclusivamente de pessoas que não estão directamente ligadas à esfera socialista.

Se o aparelho do PS não fosse capaz de perceber esta evidência, correria o risco de ver formar-se uma onda cívica capaz, quiçá, de criar um novo partido só para que alguém como António Costa pudesse surgir para liderar um projecto mobilizador de governação de Portugal.

Mas como acredito, por evidência empírica, na inteligência das democracias, tenho poucas dúvidas de que a mudança acontecerá.

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