“O investimento não pode ser feito a 100% em Lisboa”

O presidente do CDUP considera que o râguebi tem que crescer fora da capital “para conseguir dar o salto”

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Antigo internacional júnior português, José Paulo Seruca lamenta que a Federação Portuguesa de Rugby veja “a modalidade sempre a partir da selecção” e é da opinião que “é preciso haver academias regionais fortes no Centro e no Norte”. O presidente do CDUP, diz ainda que o “desporto estatal é visto muito centralmente”.

O CDUP continua a ter como ponto forte a formação. É uma aposta que se vai manter?

Nós não temos um campo de recrutamento como as equipas de Lisboa têm, por isso temos que apostar na formação. Este ano temos uma equipa de Sub-23 talentosa que, espero, venha a ser no futuro a base dos seniores. Mas é preciso dar tempo ao tempo. Esta época, por exemplo, fomos jogar à Tapada, contra a Agronomia, com uma média de idades inferior a 21 anos. Excepto um, todos podiam jogar nos Sub-23. Mesmo assim, a equipa não foi esmagada.

Quais são os objectivos desportivos a médio prazo?

Gostávamos que o CDUP fosse uma equipa que estivesse constantemente no top-5. Mas a questão da distância torna isso difícil. As primeiras seis equipas são da região de Lisboa e as outras estão fora. Isto quer dizer alguma coisa.

Que consequências tem para o CDUP a centralização da modalidade em Lisboa?

Metade do nosso orçamento é gasto em deslocações. Esta época temos previstas 50 deslocações. Isso não se reflecte apenas na questão orçamental. Na parte desportiva também há consequências. Uma coisa é ir fazer um jogo de Monsanto a Belém ou da Tapada às Olaias. Isso é uma janela de quatro horas de competição. Com os nossos jogadores, normalmente, são 14 horas, porque também jogam os Sub-23. São sete deslocações longas, todas com mais de 300km. Num campeonato faz mossa. Mas é uma realidade que dificilmente será ultrapassar.

Isso tem reflexos negativos na formação da equipa sénior?

Alguns jogadores, quando acabam a faculdade, têm falta de oferta profissional na nossa região e alguns vão para o estrangeiro ou para Lisboa. É difícil mantê-los quando estão na maturidade máxima, entre os 25 e os 28 anos.

Qual é o modelo competitivo que defendem para o campeonato?

Com o que existe actualmente, o sucesso desportivo é penalizado no ano seguinte. É o que nos está a acontecer. Defendo uma fase inicial com 10 equipas. Depois, talvez dois grupos de cinco, mas sem “play-offs”. Fomos contra o modelo que a federação tentou impor, que foi rejeitada por todos os clubes, e que apenas foi pensado para beneficiar a selecção. Concentrar tudo em meia dúzia não é bom. A federação vê a modalidade sempre a partir da selecção e não vê o contrário. Os clubes vêm por arrasto… Um jogador do CDUP para estar a 100% na selecção tem que prejudicar muito a sua vida académica e do ponto de vista profissional é praticamente impossível.

Como se contorna isso?

É preciso descentralizar. Não acredito que só haja jogadores rápidos, ou pesados, ou explosivos em Lisboa. A modalidade tem que crescer noutras áreas para conseguir dar o salto. É preciso haver academias regionais fortes no Centro e no Norte, num patamar intermédio, para depois dar mais jogadores à selecção. Como está é muito difícil...

Quem é o principal responsável por não existirem essas instalações?

Não coloco as responsabilidades na federação. É um problema de miopia do Governo que está a criar os Centros de Alto Rendimento todos nos Jamor. Tem disponibilidade para investir lá, mas fora não tem nenhuma. O desporto estatal é visto muito centralmente. Excluindo uma ou outra modalidade específica, está tudo no Jamor. Nesse aspecto, não posso culpar a federação. O investimento não pode ser feito a 100% em Lisboa. Assim a modalidade não pode ter sucesso.

A participação dos Lusitanos XV na Amlin Cup é positiva para o râguebi português?

Tudo é útil se não for feito à custa dos clubes e é isso que tem acontecido. Entra-se nas competições e o campeonato nacional é secundarizado. Isso não é bom. Não aparecem jogadores de selecção espontaneamente. São os clubes que os formam e que os mantém quando têm problemas. A FPR não pode pensar que vai lá pescar jogadores e se esquece dos clubes. Estas iniciativas podem ser boas, mas têm que ser articuladas.

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