Isabel dos Santos quer continuar a investir em Portugal e chama "mentiroso" ao presidente da Sonangol

Empresária angolana considera “completamente infundadas” as declarações de Carlos Saturnino, que veio a público afirmar que a administração cessante transferiu 38 milhõe de dólares depois de deixar funções.

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A filha de José Eduardo dos Santos Diz que se viu no meio de uma campanha política "muito forte" por parte da oposição angolana Reuters/TOBY MELVILLE

Isabel dos Santos falou, pela primeira vez, a um jornal português sobre a passagem pela petrolífera Sonangol, sobre a sua exoneração pelo Presidente angolano João Lourenço e sobre as afirmações “completamente infundadas” de Carlos Saturnino, actual presidente do Conselho de Administração da petrolífera e antigo presidente da Sonangol Pesquisa & Produção, destituído durante a gestão da empresária angolana. O Negócios publica a entrevista na edição desta segunda-feira.  

“É normal” que a procuradoria-geral da República angolana tenha aberto um inquérito na sequência das denúncias de João Lourenço, considera Isabel dos Santos. A notícia sobre a abertura do inquérito foi conhecida a 2 de Março e em causa estaria a denúncia de uma transferência irregular de 38 milhões de dólares numa altura em que já tinha sido exonerada da liderança da empresa. “Perante qualquer declaração que venha a público e que possa parecer irregular é normal que a Procuradoria tente averiguar e faça um inquérito”, avalia Isabel dos Santos. “Estou completamente confortável com o procedimento em si.”

Não se sente tão confortável com as declarações de Carlos Saturnino. “As palavras do presidente do conselho de administração actual, Carlos Saturnino, para mim, foram chocantes”, considera a empresária angolana, dizendo que não houve instruções de pagamento depois da cessação de funções como presidente da Sonangol. “Carlos Saturnino é um mentiroso”, afirma a empresária, garantindo que vai avançar com uma queixa-crime.

Enquanto esteve à frente da Sonangol, a empresária afastou Carlos Saturnino da presidência da Sonangol Pesquisa & Produção – principal empresa do grupo, que detém participações nos blocos e tem a possibilidade de operar e investir em blocos. Disse que foi demitido porque detectou, nesta empresa, “muitas debilidades na parte da gestão”, com perdas que ascenderam aos 869 milhões de dólares em 2015.

Em jeito de defesa face às últimas afirmações de Carlos Saturnino, a empresária afirma que só pode “responder com factos”. “A tomada de posse do novo conselho de administração foi a 16 de Novembro de 2017 e a partir dessa data nenhum de nós deu instruções de pagamento algum ou de qualquer operação na Sonangol”. Os 38 milhões de dólares de que Carlos Saturnino fala diziam respeito, nas palavras de Isabel dos Santos, a pagamentos em dívida aos consultores. “Este montante a que Carlos Saturnino se refere é um valor que está incluído no orçamento dos 90 milhões de dólares de pagamento a consultores em 2017. E são referentes ao pagamento de facturas de trabalhos executados e entregues”.

Diz que se viu no meio de uma campanha política "muito forte" por parte da oposição angolana e argumenta que, quando entrou para a empresa, em 2016, a Sonangol tinha tido quebras de receitas na ordem dos 40%, com dívidas altas devido à queda do preço do petróleo. “A empresa estava em incumprimento em relação à banca, não conseguia cumprir os convénios nem sequer honrar pagamentos”, afirma a filha do ex-chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos.

Para reestruturar o sector petrolífero, o Governo angolano contratou consultorias externas. No caso da Sonangol, de acordo com Isabel dos Santos, as tarefas delegadas à consultoria externa, para além das previstas pelo governo angolano, foram de recursos humanos e de software de gestão. “Uma das coisas que foi necessário fazer foi ter um consultor que nos pusesse o SAP a funcionar em pleno, para que o registo e pagamento das facturas passasse a ser automático para evitar a fraude. Porque havia fraude”, diz a empresária.

Ainda assim, salienta os resultados positivos: as despesas com a presidência de Francisco Lemos na Sonangol foram de 254 milhões em 2014 e 115 milhões em 2015. Sob a sua presidência, mesmo com contratos de consultoria, a despesa baixou para 79 milhões de dólares em 2016 e 90 milhões em 2017. E quando questionada se tinha ligações à Matter Business Solutions, empresa que coordenava a consultoria externa da Sonangol, a empresária responde com um peremptório “não”.

Sobre a relação entre a Sonangol e a Galp, Isabel dos Santos diz que a Sonangol recebeu os dividendos da Galp a que tinha direito e disponibilizou dois documentos ao Negócios que o comprovam: uma cópia do pagamento de dividendos feito à Sonangol e dos impostos pagos às autoridades holandesas referentes a esse dividendo. A decisão de participação comum na Galp foi responsabilidade da anterior administração, para optimizar a estrutura financeira, uma vez que há “uma questão de impostos que ainda é relevante e a estrutura da Sonangol que detém o seu investimento na Galp não optimiza o pagamento de impostos”, explica.

Diz que gosta de Portugal e que espera continuar a fazer negócios por cá. Não ficou triste por ter perdido a sua posição no BPI: “Nós empresários gostamos de montar um negócio, vê-lo bem-sucedido e depois pensamos em fazer mais outro”. Fechou este capítulo, afirma, e agora quer manter-se na banca, energia, grande distribuição e mobilidade eléctrica – um negócio que considera ter futuro em Portugal.

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