Holocausto, nacionalismo e negação da História

A pretexto de punir a menção de “campos polacos”, esta lei é apenas mais um tijolo no muro antieuropeu que na Polónia se vai erguendo.

A batalha é antiga e a Polónia tem, até aqui, participado nela com as armas da argumentação e da diplomacia. A menção de “campos de concentração polacos”, “campos de extermínio polacos” e “campos da morte polacos” para descrever os campos de concentração instalados pelos nazis na Polónia foi, ao longo de anos, contrariada com campanhas, chamadas de atenção e até abaixo-assinados, que deram frutos: a UNESCO fez uma recomendação sobre o tema e vários jornais passaram a adoptar designações bem mais claras ao falar neles.  

Não há dúvida de que tais expressões, inexactas e dúbias, mesmo quando se escudam em argumentos geográficos (que os campos eram nazis todos o sabem, “polacos” seria apenas para descrever a sua localização), podem induzir em erro e devem ser evitadas. Porém, o passo agora dado pela Polónia no sentido de criminalizar tal expressão, tornando-a punível com multa ou prisão até três anos não pode ser justificado com uma eventual “perda de paciência” colectiva perante tais frases mas sim com o nacionalismo crescente que tem vindo a sufocar a sociedade polaca. Porque não proíbe apenas o uso de tais expressões, mas também qualquer acusação contra “o Estado polaco, ou a nação polaca, de responsabilidade ou cumplicidade nos crimes cometidos pelo Terceiro Reich alemão.” A lei, aprovada pelo Senado e vista com simpatia pelo Presidente da Polónia, que já disse apoiá-la, exceptua, para já, trabalhos académicos ou artísticos. Mas, dado tal passo, tudo é possível no futuro.

É inegável que a Polónia, invadida em 1939 a mando de Hitler, foi das maiores vítimas do terror nazi. Mas isso não deve inibir que investigadores apontem, se tal for provado, focos colaboracionistas (que os houve, em múltiplos países) ou mesmo actos criminosos anti-semitas à margem do nazismo. Os países devem saber conviver com a sua história, mesmo quando esta lhes é desagradável. E a Polónia não é mais nem menos do que os demais.

O problema é outro. Esta lei não surge só como alegada “prevenção” contra difamações ou provável tentativa de negação da História, mas como fruto de uma alma nacionalista inflada por uma crescente demagogia política. Em Novembro passado, muitos milhares de polacos exigiram nas ruas, no seu Dia da Independência, uma “Europa branca” de “sangue limpo”, gritando palavras de ordem contra refugiados, muçulmanos, judeus, e homossexuais. O ministro do Interior disse-se “orgulhoso”, e não se demarcou do que o mundo viu ou ouviu.

A actual lei é apenas mais um tijolo no muro antieuropeu que na Polónia se vai erguendo.

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