Uma lei certa para um sector incerto

A reação dos taxistas à iniciativa do Governo e o extremar das posições tem impedido que se veja com clareza o que está em causa. No entanto, a realidade não é a preto e branco nem redutível a uma luta maniqueísta entre o bem e o mal, como tantas vezes surge aos cidadãos menos informados. Poucos deles terão, aliás, reparado que esta proposta legislativa do Governo se baseia no pressuposto de que são as plataformas de mobilidade que vêm organizar um mercado diferente do do táxi e, como tal, não são concorrentes com este.

Na verdade, o que parece preocupar os legisladores é apenas o enquadramento desta inovadora forma de comércio electrónico, inserindo-a na matriz da designada economia de partilha.

Eventualmente bem-intencionado, esse pressuposto dos legisladores pode acrescer novos problemas àqueles já existentes e que não são poucos. Desde logo, porque pretende organizar artificialmente o mercado, colocando o enfoque na função das plataformas electrónicas e não no serviço de transporte em si.

Mais ainda, o novo enquadramento arrisca-se a liberalizar de tal forma o mercado que pode gerar nele efeitos perversos, a curto e a médio prazo. Por exemplo: a) Pode conduzir rapidamente a uma situação de abuso de posição dominante por parte de um dos operadores (é preciso ter em atenção que apenas uma das forças em presença está avaliada em metade do PIB português); b). Pode - na ausência dos adequados instrumentos - provocar a manipulação dos preços por via da exploração dos desequilíbrios económico-financeiros em evidência na cadeia de valor do serviço, num mercado que será composto essencialmente por empresários em nome individual e por micro e pequenas empresas. O que deve, então, o Governo fazer?

No nosso entender, deve preocupar-se em criar regras claras para os TVDE, que passem pela demonstração de capacidade destes operadores para a prestação de um serviço diferenciado em termos qualitativos, bem como no que respeita a níveis de fiabilidade, experiência e segurança oferecidos, que permitam gerar um maior grau de confiança junto dos consumidores. Ou seja, seguir um caminho idêntico ao que prossegue no mercado do arrendamento, para o qual prepara uma lei que visa não “encaixar” as plataformas como a Airbnb, mas sim regular o mercado do arrendamento propriamente dito, enquadrando-o de uma forma legal e fiscal que possibilite concorrer de forma equilibrada com outras modalidades de oferta, como é o caso dos hotéis.

Na Cabify entendemos as diferentes variáveis em causa numa equação complexa. E por isso acreditamos que podemos contribuir para que o Governo solucione de forma adequada o problema, indo ao encontro dos diferentes intervenientes no mercado - incluindo os próprios taxistas - e sempre com o cidadão em mente, melhorando a mobilidade de todos no presente e antecipando o futuro.

Desejamos a Lei certa para um mercado incerto. Assim haja vontade e capacidade de decisão. 

Director-geral da Cabify em Portugal

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