ONU retoma distribuição de ajuda após noite de chamas em Alepo

Cidade foi alvo dos ataques aéreos mais intensos dos últimos meses. Depois de Mouadamiya, ONU pede a Assad que "faça a sua parte" e deixe ajuda entrar no Leste de Alepo.

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O Observatório diz ter recebido a confirmação de pelo menos 13 mortos nos bombardeamentos em Alepo Ameer Alhalbi/AFP

Durante a noite pareceu chover fogo sobre os bairros controlados pela oposição no Leste de Alepo, tamanha foi a violência dos ataques aéreos que estilhaçaram um pouco mais qualquer esperança de ressuscitar a trégua da semana passada na Síria. Mas as Nações Unidas, que ainda esperam que as potências internacionais travem a nova escalada de violência, retomaram nesta quinta-feira a distribuição de ajuda, conseguindo entrar num subúrbio de Damasco há muito cercado.

“Parecia que os aviões estavam a tentar compensar pelos dias em que não largaram bombas”, disse à Reuters o responsável em Alepo pelos “Capacetes Brancos”, como é conhecida a organização de voluntários que assumiu a tarefa de socorrer as vítimas dos ataques nas zonas controladas pela oposição. Um jornalista da AFP que mora no Leste daquela que já foi a capital económica da Síria contou que os ataques provocaram vários incêndios no seu bairro – imagens divulgadas por activistas da oposição sugerem o uso de bombas incendiárias, uma denúncia feita já várias vezes por organizações de defesa dos direitos humanos.

O director de um dos hospitais que ainda funciona naquela zona disse à Reuters que as bombas fizeram 45 mortos, enquanto o Observatório Sírio dos Direitos Humanos disse ter recebido confirmação de 13 vítimas mortais, incluindo três crianças. Rami Abdel Rahman, o director do Observatório, diz, no entanto, não ter dúvidas de que estes foram “os ataques mais intensos dos últimos meses” contra os bairros da oposição. Acrescentou que na mesma altura em que isto acontecia Exército e rebeldes combatiam ferozmente no Sul da cidade, por onde a oposição tenta voltar a furar o cerco montado pelos militares.

Os ataques aéreos surgiram horas depois de o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, ter dito no Conselho de Segurança da ONU que a trégua só podia ser salva com um acordo para manter todos os aviões em terra durante alguns dias, permitindo à ONU enviar ajuda de emergência para as zonas cercadas – foi precisamente o ataque a uma coluna de camiões do Crescente Vermelho, na noite de segunda para terça-feira, nos arredores de Alepo, que pôs um fim definitivo à trégua, já depois de no sábado um outro ataque, desta vez da coligação liderada pelos EUA, ter atingido posições do Exército sírio na cidade de Deir Ezzor.

Russos e americanos, de quem partiu a iniciativa do cessar-fogo, trocam desde então recriminações e culpas, mas a ONU decidiu não esperar por um entendimento e nesta quinta-feira conseguiu que camiões carregados com ajuda entrassem em Mouadamiya, localidade a sudoeste da capital, nas mãos dos rebeldes e cercada pelo Exército.

A organização disse ter também tudo preparado para enviar comida e medicamentos a quatro outras localidades no noroeste do país – duas cercadas pelo Exército e outras duas pela rebelião – e lançou um último apelo para que os camiões que há mais de duas semanas estão estacionados na fronteira com a Turquia sejam autorizados a entrar em Alepo. “Por favor, Presidente [Bashar] Assad faça a sua parte e deixe-nos chegar ao Leste de Alepo”, pediu Jan Egeland, responsável pela assistência humanitária na Síria, exigindo também garantias aos rebeldes que controlam os bairros.

Apesar do veneno destilado nos últimos dias, Kerry e o homólogo russo, Sergei Lavrov, vão presidir nesta quinta-feira à noite, em Nova Iorque, a uma nova reunião do Grupo Internacional de Apoio à Síria. As expectativas de uma saída para o impasse são baixas, mas o adjunto de Staffan de Mistura, o enviado especial da ONU para a Síria, disse ainda acreditar que, com o apoio dos outros 21 participantes no grupo, Moscovo e Washington encontrem uma forma de “revitalizar a cessação de hostilidades”. Se isso não acontecer, avisou o próprio Mistura na quarta-feira, cai por terra a última esperança de uma solução diplomática antes das próximas eleições presidenciais americanas, em Novembro, o que condenará os sírios a “mais meses ou mesmo mais anos de guerra”.  

 

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